Folha de S. Paulo


Boicote prejudica nova votação, mas líder do Quênia manter poder

Chen Cheng/Xinhua
O presidente do Quênia, Uhuru Kenyatta (direita), vota em Nairóbi
O presidente do Quênia, Uhuru Kenyatta (direita), vota em Nairóbi

Milhões de quenianos boicotaram uma repetição da eleição presidencial nesta quinta-feira (26), e a votação foi prejudicada por protestos da oposição que expuseram profundas divisões políticas.

A eleição deverá recolocar no poder o presidente Uhuru Kenyatta. Mas o baixo comparecimento e a recusa de Raila Odinga, o veterano líder de oposição, a disputar uma eleição que ele chamou de "engodo" minaram a credibilidade da votação.

"Quando você junta todas as peças, está claro que os quenianos têm sérias reservas sobre a capacidade da comissão eleitoral de produzir eleições livres, justas e com credibilidade", disse Dismas Mokua, um analista independente.

Pelo menos três pessoas foram mortas em protestos, e a comissão eleitoral foi obrigada a adiar a votação em quatro condados no oeste do país, cujos postos de votação virtualmente não abriram por causa de manifestações da oposição. A comissão não confirmou o comparecimento, mas observadores estimam que provavelmente não chegou a 40%, em comparação com 79,5% nas eleições gerais em agosto.

A nova eleição foi ordenada pela Suprema Corte depois que ela anulou os resultados da disputa presidencial de agosto, citando "irregularidades" e "ilegalidades" depois de uma apelação feita por Odinga. O julgamento foi aplaudido por muitos quenianos cansados da longa história de eleições fraudadas e contestadas no país.

Mas a maior economia do Leste da África mergulhou em sua pior crise política desde as eleições de 2007, que provocaram atos de violência nos quais morreram mais de 1.200 pessoas.

Odinga se recusou a participar da votação porque suas exigências de reforma da comissão eleitoral —que foi fortemente criticada na decisão da Suprema Corte— não foram cumpridas.

Uma tentativa na última hora por ativistas de atrasar a votação nesta semana falhou quando apenas dois dos sete juízes compareceram na Suprema Corte, fazendo a oposição acusar o governo de tentar subverter a Constituição.

Enquanto as tensões políticas cresciam no Quênia, o país enfrenta um período prolongado de incerteza, o risco de mais violência e mais batalhas jurídicas.

Cerca de 50 pessoas foram mortas desde que Kenyatta foi declarado vencedor na eleição de agosto. Em partes de Nairóbi, a capital do país, alguns postos de votação abriram com várias horas de atraso, depois que a polícia travou batalhas com manifestantes que tentavam perturbar os eleitores.

"Estamos lutando por nossos direitos, não queremos que esta eleição continue porque não é justa e livre", disse um manifestante na favela de Kibera, que deu como nome Nelson Mandela. Ele e uma dúzia de outros construíram uma barricada para bloquear o acesso ao posto eleitoral.

Regina Opondo, que preside o Grupo de Observação das Eleições, um consórcio de organizações civis quenianas, disse que o baixo comparecimento se deveu "provavelmente ao boicote [pela oposição] e porque alguns apoiadores [de Kenyatta] podem ter pensado que como era uma corrida de 'um só cavalo' eles realmente não precisavam ir votar".

Kenyatta estava disputando com cinco outros candidatos pouco conhecidos, que juntos conseguiram menos de 1% dos votos em agosto.

Depois de votar, o presidente rejeitou sugestões de que a democracia do Quênia está sendo solapada.

"O Quênia está provando que nossa democracia está amadurecendo", disse ele. "Estamos cansados de eleitoralismo no país. Está na hora de seguir adiante."

Os eleitores compareceram em números decentes nos enclaves de Kenyatta.

"Estamos aqui hoje por causa de Raila Odinga", disse James Ndegwa, um eletricista que votou na cidade de Kiambu. "Ele está transformando o país em uma não democracia, e quer tomar o poder fora da Constituição."

Odinga disse na quarta-feira (25) que ele transformará sua coalizão Superaliança Nacional em um "movimento de resistência" para fazer campanha contra a "ditadura eleitoral" de Kenyatta e pressionar por uma eleição livre dentro de 90 dias.

Tradução de LUIZ ROBERTO MENDES GONÇALVES


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