Folha de S. Paulo


Opinião

Com Macri, Argentina mostra caminho viável para a região

Animai-vos, fãs de sanidade fiscal, do consenso democrático e da Lava Jato. As eleições da Argentina provam que existe demanda por esses três conceitos supostamente antiquados em 2017.

A vitória esmagadora da coalizão Mudemos , do presidente Mauricio Macri, tem grande significado para a Argentina, o restante da América Latina e talvez o mundo.

Juan Mabromata/AFP
O presidente da Argentina, Mauricio Macri, dá entrevista na Casa Rosada nesta segunda-feira (23)
O presidente da Argentina, Mauricio Macri, dá entrevista na Casa Rosada nesta segunda-feira (23)

Demonstra que um líder pragmático pode dizer verdades difíceis, começar a corrigir uma década de erros populistas, suportar uma recessão cruel... e ainda assim emergir vitorioso das urnas.

De fato, se considerarmos os presidentes dos sete países mais populosos da América Latina, só Macri tem índice de aprovação (50%) superior ao de Donald Trump (36%). Os demais —de Michel Temer (5%) ao colombiano Juan Manuel Santos (25%) e ao mexicano Enrique Peña Nieto (28%) – continuam presos em um ciclo de escândalos e decepções econômicas.

Por que Macri é diferente?

Da última vez que um presidente de direita governou a Argentina, Carlos Menem se gabou de realizar uma "cirurgia sem anestesia", para promover a reforma econômica.

Macri cuidou de não matar o paciente. Optou por uma abordagem gradual no corte do deficit orçamentário e pela eliminação dos subsídios da era Kirchner, que eram populares, mas estavam levando a economia à bancarrota.

Para parte do setor de negócios, a mudança não parecia rápida o suficiente. Mas agora está claro que Macri calibrou perfeitamente a dosagem do remédio à capacidade do paciente de absorvê-lo.

Mesmo assim, não foi fácil. A economia suportou recessão em 2016 e inflação de 36%. Agora volta a crescer , e deve fechar 2017 com 2,5% de avanço, o que impressiona mais dada a crise no Brasil, parceiro comercial chave.

Isso posto, a economia explica apenas parte do apoio a Macri. Muitos argentinos sentem que ele está reinserindo o país no planeta, e ao mesmo tempo deixando claro que não tolerará a corrupção do passado recente –o que inclui as repercussões argentinas da Lava Jato.

Editoria de Arte/Folhapress

Macri pode não ser o mensageiro perfeito quanto a isso (o nome dele constava dos Panama Papers , que expuseram contas escusas no exterior). Mas a maioria dos argentinos vê progresso, ainda assim.

Agora nos aproximamos de um ano no qual oito países que respondem por dois terços da população regional elegerão presidentes.

Pode ser a transformação política mais importante em uma geração. Em diversos países, inclusive Brasil e México, a tentação do nacionalismo populista, seja de esquerda ou de direita, cresce.

Macri mostra outro caminho possível. Ele falou de consenso e diálogo com a oposição para aprovar reformas, e de mudar a marcha da economia. A impressão era que nada disso continuava viável. Ao menos por um dia, tais ideias voltaram à moda.

BRIAN WINTER é editor-chefe da revista "Americas Quartely" e vice-presidente do centro de estudos Conselho das Américas.


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