Folha de S. Paulo


Governo espanhol planeja antecipar as eleições catalãs para janeiro

O governo espanhol e a principal sigla de oposição, o PSOE (Partido Socialista Operário Espanhol), chegaram a um acordo para antecipar eleições na Catalunha, possivelmente em janeiro de 2018.

Caso de fato implementada, essa seria uma das medidas do Artigo 155 da Constituição, acionado para conter o projeto separatista catalão.

A ideia será discutida no sábado (21), ao lado de outras, em uma reunião extraordinária do conselho de ministros. Ela precisa ser aprovada pela maioria absoluta do Senado, em uma reunião prevista para o dia 27. O governista Partido Popular já tem os votos necessários para a aprovação da medida na Casa.

O anúncio da medida deve agravar ainda mais a crise territorial espanhola, a maior desde a redemocratização nos anos 1970. O governo regional catalão não aceitará antecipar as eleições.

O líder da Esquerda Republicana, Oriol Junqueras, um dos separatistas mais influentes, disse que "não é a melhor maneira de avançar".

Caso não sejam antecipadas, as eleições regionais catalãs serão realizadas apenas nos últimos meses de 2019.

Há negociação entre o governo e o PSOE para incluir entre as medidas, além das eleições antecipadas, intervenções pontuais na autonomia catalã. Por exemplo, assumir o comando temporário da polícia catalã.

Na avaliação de Madri, essa força policial —conhecida como Mossos d'Esquadra— não cumpriu as ordens do governo central de impedir a consulta separatista catalã. O partido de centro-direita Cidadãos apoia as decisões.

"Acertamos com o PSOE e o Cidadãos as medidas para o retorno da legalidade", afirmou o premiê conservador, Mariano Rajoy, durante uma cúpula em Bruxelas. Ele não detalhou as suas medidas.

CONTEXTO

A Catalunha realizou um plebiscito separatista em 1º de outubro, no qual 90% dos votos pediam a independência. Só participaram da consulta 43% do eleitorado.

O governo de Madri considera ilegais o plebiscito e seus resultados, com base em uma decisão do Tribunal Constitucional. Assim, não poderiam servir como base à proclamação de separação.

Mas, ignorando os avisos de Madri e da União Europeia, o presidente catalão Carles Puigdemont foi ao Parlamento regional em 10 de outubro e declarou a independência.

O premiê espanhol exigiu que o catalão voltasse atrás até a quinta-feira (19). Em vez disso, Puigdemont ameaçou com uma votação no Parlamento regional para declarar formalmente a separação do território.

Diante das negativas catalãs, o governo central deu continuidade aos planos de implementar o Artigo 155.

Mas esse artigo, inspirado por uma legislação semelhante na Alemanha, nunca foi utilizado na Espanha. Apertar o interruptor pode agravar ainda mais a crise política no curto prazo.

Forças separatistas já convocaram mobilizações populares para os próximos dias, com um protesto previsto em Barcelona neste sábado.

Na sexta-feira, grupos a favor da independência organizaram um protesto com a retirada de dinheiro nos bancos Sabadell e CaixaBank, que decidiram neste mês transferir suas sedes para fora da Catalunha diante da instabilidade jurídica da região.

"Lembrem-se de que este é o seu dinheiro", dizia uma mensagem convocando os moradores a participarem da manifestação pacífica.

O ritmo de transferência de sedes de empresas tem se acelerado, e quase mil companhias já deixaram a Catalunha. Mudar a sede tem apenas efeito legal e fiscal, e não significa mover seus funcionários ou instalações físicas.

*

O que é o Artigo 155?
É um trecho da Constituição espanhola que, diante da recusa de uma autoridade regional em cumprir as leis, permite a revogação temporária de sua autonomia

Quais são os efeitos?
O artigo permite suspender temporariamente a autonomia catalã e convocar eleições antecipadas

O governo catalão será dissolvido?
Não, o Artigo 155 só estipula uma intervenção pontual e temporária. A autonomia só pode ser suspensa por um período curto, para forçar o governo catalão a cumprir a lei

Quais são as condições?
É preciso ter o aval da maioria absoluta do Senado. Não é um problema para Madri, pois a sigla de Rajoy —o Partido Popular— tem maioria na Casa

Qual é o precedente?
Nenhum. O Artigo 155 nunca foi acionado na Espanha. Houve uma ameaça nesse sentido em 1989, quando o então premiê Felipe González ameaçou o governo da Canária para que cumprisse suas obrigações fiscais. O resultado foram negociações entre as autoridades


Endereço da página:

Links no texto: