Folha de S. Paulo


Campanha Internacional para Abolir Armas Nucleares vence Nobel da Paz

Britta Pedersen - 13.set.2017/AFP
Activists of the non-governmental organization
Ativistas da Ican protestam em frente à embaixada da Coreia do Sul em Berlim

A Campanha Internacional para Abolir Armas Nucleares recebeu nesta sexta-feira (6) o Nobel da Paz. Respondendo pela sigla Ican, essa coalizão da sociedade civil promove a implementação do tratado internacional que proíbe esses armamentos. Há 468 organizações envolvidas em 101 países diferentes.

O prêmio coincide com a crescente preocupação em relação ao programa nuclear da Coreia do Norte, ao qual o governo americano tem respondido com ameaças belicosas. O anúncio também se emaranha nas discussões sobre o acordo nuclear com o Irã, que os Estados Unidos têm criticado durante a Presidência de Donald Trump.

Berit Reiss-Andersen, que lidera o comitê do Nobel, afirmou durante o anúncio que o prêmio foi decidido como reconhecimento de "seu trabalho em atrair atenção às consequências humanitárias catastróficas do uso de qualquer arma nuclear".

O Nobel da Paz é acompanhado de uma recompensa equivalente a US$ 1,1 milhão (R$ 3,4 milhões).

Em 2016, o vencedor do prêmio foi o presidente da Colômbia, Juan Manuel Santos, pelas negociações de paz com as Farc (Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia), na tentativa de encerrar os 52 anos de um conflito que já deixou mais de 250 mil vítimas.

Houve para este ano 318 nomeações, entre elas 215 indivíduos e 103 organizações. O nome desses nomeados, no entanto, é mantido em segredo durante 50 anos.

Os favoritos deste ano incluíam os voluntários sírios da organização Defesa Civil, a ACNUR (Agência das Nações Unidas para os Refugiados), o papa Francisco e o jornalista turco Can Dündar.

IRÃ

Os esforços internacionais contra armamentos nucleares eram favoritos ao Nobel da Paz. Mas se esperava que o prêmio fosse entregue ao chanceler iraniano, Mohammad Javad Zarif, e à chefe de política externa europeia, Federica Mogherini. Eles estiveram por trás do acordo nuclear internacional com o Irã —hoje criticado por Trump.

Mas o comitê anunciou o prêmio, em um gesto inesperado, à campanha do Ican, que foi em parte responsável por criar o Tratado para a Proibição de Armas Nucleares.

O site do Ican estava aparentemente sobrecarregado nos minutos após o anúncio.

O Ican foi criado em 2007, na Austrália, e hoje tem sede na Suíça. Essa campanha é liderada por Beatrice Fihn. Uma de suas inspirações foi a campanha que levou à proibição do uso das minas terrestres em 1997.

Fihn afirmou ter recebido um telefonema minutos antes do anúncio do prêmio e pensou, que fosse um trote.

O troféu, disse, "envia uma mensagem a todos os Estados com armas nucleares de que é um comportamento inaceitável". "Nós não podemos ameaçar de maneira indiscriminada o assassinato de centenas de milhares de civis em nome da segurança. Não é assim que se constrói a segurança".

A agência de notícias Reuters lhe pediu que comentasse a premiação, no contexto das disputas nucleares entre EUA e Coreia do Norte.

"Armas nucleares são ilegais. Ameaçar usá-las é ilegal. Ter armas nucleares é ilegal, e precisam parar."

Uma semana antes, em um comentário publicado em uma rede social, Fihn havia chamado o presidente americano de "idiota".

O orçamento anual do Ican é de cerca de US$ 1 milhão, quase o equivalente ao próprio valor dado pelo Nobel da Paz.

O completo desarmamento nuclear do mundo, porém, é um objetivo distante. Há hoje cerca de 15 mil dessas armas, segundo estimativas.

ARMAS NUCLEARES

O Tratado para a Proibição de Armas Nucleares foi estabelecido em julho deste ano nas Nações Unidas, com o boicote das nove potências nucleares do mundo —incluindo a China, a França, os Estados Unidos e a Rússia.

O texto foi apoiado por 122 países após meses de negociações. O acordo foi assinado em 20 de setembro por líderes internacionais, incluindo o presidente do Brasil, Michel Temer. Ao menos 53 nações já assinaram o texto e três delas o ratificaram: Guiana, Tailândia e o Vaticano.

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Confira os ganhadores dos últimos anos

2016
Juan Manuel Santos
O presidente colombiano foi reconhecido por seu papel na negociação do acordo de paz com as Farc que pôs fim a um conflito de mais de 50 anos

2015
Quarteto para o Diálogo Nacional da Tunísia
Por sua contribuição decisiva na construção de uma sociedade plural no país

2014
Malala Yousafzai e Kailash Satyarthi
A jovem paquistanesa e o indiano foram premiados pela defesa dos direitos das crianças e à educação

2013
Organização para a Proibição de Armas Químicas
Sediada na Holanda, foi premiada por sua defesa da proibição de armas químicas

2012
União Europeia
Por mais de seis décadas contribuindo para a promoção da paz e reconciliação, democracia e direitos humanos na Europa

2011
Ellen Johnson Sirleaf, Leymah Gbowee e Tawakkol Karman
As três mulheres foram premiadas pela luta não violenta pela seguranças das mulheres e por seu direito de participação plena em processos de paz

2010
Liu Xiaobo
Ativista chinês foi premiado por sua luta longa e não violenta pelos direitos humanos em seu país

2009
Barack Obama
O então presidente dos EUA foi reconhecido por reforçar a diplomacia internacional e a cooperação entre as pessoas

2008
Martti Ahtisaari
O diplomata e ex-presidente da Finlândia foi premiado por sua atuação por mais de três décadas em resolver conflitos internacionais

2007
Al Gore e Painel Intergovernamental sobre Mudanças Climáticas dos Estados Unidos
Premiados pela disseminação de conhecimento sobre as mudanças climáticas

2006
Muhammad Yunus e Grameen Bank
Economista e diretor do Banco Grameen, especializado em micro crédito, pelo esforço de criar desenvolvimento econômico e social para os mais pobres

2005
Agência Internacional de Energia Atômica e Mohamed ElBaradei
O diplomata egípcio e a agência da qual foi diretor foram premiados pelo trabalho de prevenção do uso de energia nuclear para fins militares e de garantia que seu uso para fins pacíficos fosse feito da forma mais segura possível

2004
Wangari Muta Maathai
A ativista queniana foi premiada por suas contribuições ao desenvolvimento sustentável, à democracia e à paz

2003
Shirin Ebadi
Defensora dos direitos das mulheres e das crianças, a advogada e ex-juíza iraniana foi premiada por seu trabalho de promoção dos direitos humanos e da democracia

2002
Jimmy Carter
O presidente americano de 1977 a 1981 teve atuação decisiva no Acordo de Camp David e foi reconhecido pelo trabalho de solução pacífica de conflitos internacionais, promoção da democracia e dos direitos humanos


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