Folha de S. Paulo


Sem alarde, casamento homoafetivo entra em vigor na Alemanha

"Senhores, podem trocar as alianças": a Alemanha se torna neste domingo (1º) o décimo quinto país europeu a permitir o casamento homoafetivo, lei aprovada pelo governo de Angela Merkel após anos de oposição.

O 1º de outubro marca a entrada em vigor da lei promulgada em julho passado. Neste dia, várias prefeituras do país celebrarão suas primeiras uniões de casais homossexuais.

Embora no domingo seja feriado na Alemanha, várias prefeituras como as de Berlim, Hamburgo e Frankfurt permanecerão abertas para a ocasião.

"É um dia que deve ser celebrado à altura de sua importância", afirmou o vice-prefeito de Friedrichshain-Kreuzberg, bairro da moda de Berlim, Knut Mildner-Spindler.

Tobias Schwarz - 30.jun.2017/AFP
Dois homens se beijam em Berlim no dia em que o Parlamento aprovou a legalização do casamento homoafetivo, em junho
Homens se beijam em Berlim no dia em que o Parlamento aprovou o casamento homoafetivo

Na capital alemã, Bodo Mende e Karl Kreile, casal gay que ficou famoso por ter sido o primeiro a fazer um contrato de união civil, também serão os primeiros a se casarem.

As primeiras bodas serão realizadas em um clima pacífico, apesar da oposição da sigla de direita populista AfD (Alternativa para a Alemanha), que obteve resultado histórico com mais de 13% dos votos nas eleições legislativas realizadas no domingo (24).

O AfD é atualmente codirigido por uma militante homossexual, Alice Weidel, mãe de dois filhos adotados.

ALEMANHA SE SOMA À EUROPA

"Finalmente, nosso país se soma ao resto da Europa", disse Joerg Steinert, da Associação de Gays e Lésbicas, que considera a medida "muito simbólica".

A lei sobre casamento homossexual votada em 30 de junho modificou o Código Civil ao definir o matrimônio como uma "união entre duas pessoas, de sexo diferente ou idênticos".

Concretamente, os casais homossexuais que desejam oficializar sua união se beneficiarão dos mesmos direitos que os casais heterossexuais: em termos de impostos, mas sobretudo com a possibilidade de adotar filhos.

A mudança legislativa é o resultado de longos anos de combate da comunidade LGTB. Respaldada principalmente pelos Verdes, a Associação alemã de gays militava desde 1990 em favor do casamento homossexual.

"Ganhamos uma batalha em 2001 com a aprovação da união civil contra a posição da Igreja protestante, abrindo uma primeira brecha na instituição matrimonial", disse Steinert.

Hannibal Hanschke 30.jun.2017/Reuters
Protesto pela aprovação do casamento entre pessoas do mesmo sexo em Berlim, na Alemanha
Protesto pela aprovação do casamento entre pessoas do mesmo sexo em Berlim, em junho

Nos anos seguintes, as diferenças tributárias entre casais com união civil e as casadas foram se atenuando.

Atualmente, mais de 75% dos alemães são favoráveis ao casamento homossexual, segundo as pesquisas.

Entretanto, as opiniões não são unânimes. Durante muito tempo, Angela Merkel adiou a decisão para não se opor à ala mais conservadora de sua formação política, o partido social-cristão bávaro CSU, muito apegado a valores familiares tradicionais.

MERKEL AMBÍGUA

"Paradoxalmente, foi a religião que abriu caminho para o avanço atual: sem o apoio da Igreja protestante, que há anos já havia decidido celebrar casamentos homossexuais religiosos em algumas regiões, [o processo] poderia ter sido mais longo", avalia Steinert.

Foi a proximidade das eleições legislativas de setembro o que precipitou a aprovação do casamento homossexual.

Inicialmente oposta a essa lei, Angela Merkel surpreendeu em junho passado ao autorizar a seus deputados a pronunciar-se em função de suas próprias convicções, tirando de seus rivais social-democratas a possibilidade de usar o tema como arma eleitoral.

Dias mais tarde, os representantes de esquerda social-democratas, ecologistas e a esquerda radical tomaram-lhe a palavra e submeteram à votação um projeto de lei sobre casamento homossexual que estava bloqueado no Parlamento havia anos.

O texto foi aprovado por ampla maioria, com o respaldo de uma parte dos representantes conservadores também partidários da medida.

Merkel votou contra, explicando que, para ela, "o matrimônio é, segundo a nossa Constituição, a união de um homem e uma mulher".


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