Folha de S. Paulo


Polícia catalã se recusa a impedir plebiscito sobre independência

Enquanto se aproxima o domingo (1º), data do plebiscito pela independência catalã, disputas políticas têm emaranhado as instituições espanholas, afetando diferentes forças policiais e ministérios.

A desavença mais recente ocorreu nesta quarta-feira (27) com uma série de recusas da polícia autônoma catalã, chamada de Mossos d'Esquadra, em cumprir ordens do Ministério Público.

O Ministério Público havia ordenado que os Mossos cercassem colégios eleitorais e impedissem o voto deste domingo.

Mas Pere Soler, diretor da polícia catalã, escreveu em sua conta oficial na rede social Twitter: "Que ninguém se equivoque. A principal missão é garantir direitos, e não impedir o seu exercício".

Editoria de Arte/Folhapress

Mais tarde, Josep Lluís Trapero, major dessa mesma polícia, afirmou que as ordens do Ministério Público ameaçam a ordem pública. Serão cumpridas, disse, mas de maneira "proporcional", algo que ele não detalhou.

Os Mossos são subordinados ao governo catalão e têm jurisdição apenas nesse território –uma das liberdades dessa região, que já tem mais independência do que outras partes da Espanha.

Mas, em meio à investigação judicial sobre o plebiscito, o Ministério Público tem o poder de dar ordens diretas à polícia catalã, algo que tem sido criticado no país. Esse órgão estaria excedendo seus poderes, segundo oponentes.

O conselheiro catalão de Interior, Joaquim Forn, espécie de ministro regional, também desafiou as ordens do Ministério Público —conhecido na Espanha como Fiscalía— e afirmou que os Mossos vão permitir o plebiscito deste domingo.

POLÍCIAS

A Catalunha, uma região espanhola já parcialmente independente, quer separar-se de completo da Espanha.

O governo central em Madri, porém, diz que o plebiscito é ilegal e planeja impedi-lo.

Essas posições irreconciliáveis significam que diversos órgãos estão em embate.

A situação se complica porque Madri enviou centenas de membros da Polícia Nacional para a Catalunha para garantir a ordem durante o domingo, em que é previsto algum grau de confronto entre independentistas e as forças de segurança.

A Polícia Nacional é o corpo policial que atua em todo o território espanhol. Também foram deslocadas tropas da Guarda Civil, uma espécie de polícia com atribuições militares ligada aos ministérios de Interior e Defesa.

Diante desse cenário, o conselheiro Forn disse na quarta que "a Polícia Nacional e a Guarda Civil vêm à Catalunha alterar a ordem".

O governo catalão diz não poder estimar o número de policiais enviados por Madri, movimento que descreve como "em massa", por não ter sido informado oficialmente.

O envio de policiais à Catalunha causou bastante incômodo nesta semana, com celebrações organizadas em diferentes regiões da Espanha para celebrar seu deslocamento. Cidadãos aparecem, em vídeos, gritando "a por ellos!" aos policiais –algo como "peguem eles".

"As imagens são inacreditáveis", afirmou o conselheiro Forn. "É como se fossem a uma guerra ou colonizar, e ninguém lhes desautorizou."

Pau Barrena - 6.set.2017/AFP
A picture taken on September 6, 2017 shows a building with Esteladas (Pro-indepence Catalan flag) and banners reading in Catalan
Bandeiras da Catalunha e faixas pelo sim à independência tomam varandas de um prédio em Barcelona

HISTÓRICO

O movimento pela independência da Catalunha é antigo, com influência das ideologias nacionalistas do século 19. Mas esse projeto ganhou força nos últimos anos com a formação de um governo regional em 2015 de partidos pró-independência.

O argumento é tradicionalmente cultural. Catalães têm, afinal, sua própria história e língua, em paralelo à sua identidade espanhola.

Mas ativistas passaram a insistir, recentemente, em razões econômicas: a Catalunha contribui com 20% do PIB espanhol, mas se ressente de não receber um repasse proporcional. Há a sensação de que, independente, essa região poderá ter um melhor desempenho econômico.

O plebiscito deste domingo é ilegal, no sentido de que contraria a lei espanhola, inclusive uma decisão clara do Tribunal Constitucional.

Mas o Parlamento catalão planeja declarar depois de 48 horas do voto sua independência de maneira unilateral. Se o gesto for de fato feito, a situação pode escalar de maneira considerável, com o governo central em Madri revogando a autonomia catalã e tomando o controle.

Analistas preveem que nesse cenário o presidente catalão, Carles Puigdemont, será detido na semana que vem, agravando o cenário.


Endereço da página:

Links no texto: