Folha de S. Paulo


Brasileira teme futuro após Trump revogar proteção a jovens imigrantes

No dia 15 de agosto de 2012, quando entrou em vigor o Daca, programa que regularizava a situação de imigrantes que chegaram aos EUA quando crianças e que o presidente Donald Trump revogou nesta terça (5), a brasileira Bruna Bouhid, 26, já estava na fila para se inscrever.

Bruna chegou com sete anos ao país com sua família, em 1999, e passou mais de dois terços de sua vida nos EUA. A irmã, Paloma, tinha apenas três. As duas hoje fazem parte do grupo de 7.361 brasileiros que conseguiram o benefício desde 2012 —o sétimo maior contingente, atrás de cidadãos de México, El Salvador, Guatemala, Honduras, Peru e Coreia do Sul.

Stephen Yang/Reuters
Manifestantes protestam em Nova York após Trump revogar proteção a jovens imigrantes
Manifestantes protestam em Nova York após Trump revogar proteção a jovens imigrantes

No total, 8.447 jovens brasileiros tentaram regularizar sua situação pelo Daca, mas 1.086 não conseguiram. A taxa de recusa, de 12,8%, é um pouco maior que a do total de solicitantes (11%).

"É muito duro estar aqui agora como imigrante. Você sente que as pessoas que votaram no Trump não querem você aqui", disse Bruna, que vive em Washington. "Mas moro aqui há 18 anos, não vou embora agora. Tenho minha família, meus amigos."

Em Framingham, no Estado de Massachusetts, onde há uma grande comunidade de brasileiros, o padre Volmar Scaravelli, da Igreja São Tarcísio, já organiza para o próximo sábado (9) um mutirão, com um advogado, para ajudar brasileiros que precisam preencher os papéis de renovação do Daca até março de 2018 —prazo dado por Trump para encerrar o programa.

Bruna já renovou duas vezes o seu benefício, que é válido por dois anos. O último venceria em 2018. "Senti raiva e muita tristeza com a decisão [de Trump]. É um aperto no coração, porque você não sabe o que pode acontecer daqui a seis meses [prazo dado pelo governo para começar a ser extinto]."

'Dreamers' beneficiados - Desde sua criação, em 2012, o programa Daca já regularizou quase 800 mil jovens imigrantes nos EUA

De onde vêm os 'Dreamers' - Principais países de origem dos beneficiados

Para Bruna, o Daca veio num momento decisivo. Ela estava no terceiro ano da faculdade, onde cursava Estudos Internacionais e Ciência Política, e não poderia trabalhar legalmente quando se formasse. Ainda na Universidade da Flórida, ela conseguiu, graças ao programa, receber alguma remuneração por estágios e tirar sua carteira de motorista.

A brasileira hoje trabalha na organização "United We Dream" (unidos nós sonhamos), que dá apoio a beneficiários do Daca —chamados de "dreamers"— como ela.

O nome vem do "Dream Act", um projeto de lei que garante benefícios semelhantes ao Daca, mas tramita no Congresso sem sucesso desde 2001. É pelo Dream Act que Bruna e sua organização pretendem lutar agora.

Ela, contudo, diz que os "dreamers" não vão aceitar fazer concessões, como permitir o endurecimento das regras a outros imigrantes irregulares para que o Dream Act passe. "Não vamos trocar nossas vidas pelas de outros imigrantes ilegais."

Bruna não gosta nem de pensar na possibilidade de ser deportada para o Brasil, país que não visita desde os 11 anos. "Para mim é a última alternativa. Não porque não goste do Brasil, mas viemos para os EUA por uma vida melhor. Eu tenho que continuar pensando que as oportunidades estão aqui."


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