Folha de S. Paulo


Ação militar provoca fuga em massa de minoria perseguida em Mianmar

Cerca de 20 mil pessoas da minoria muçulmana rohingya chegaram a Bangladesh entre as tardes desta sexta-feira (1º) e deste sábado (2) fugindo de uma ofensiva militar contra a etnia perseguida no vizinho Mianmar.

A ação é a mais intensa desde 25 de agosto, quando as tropas chegaram ao Estado de Rakhine para enfrentar os membros da Frente de Salvação Arakam Rohingya, grupo armado composto pela minoria muçulmana.

AFP
Muçulmanos da minoria rohingya colocam seus pertences em caminhões ao chegarem a Bangladesh
Muçulmanos da minoria rohingya colocam seus pertences em caminhões ao chegarem a Bangladesh

Segundo o Alto Comissariado da ONU, o fluxo representa um terço de todos os refugiados que fugiram de Mianmar em uma semana. A maioria pagou a traficantes de pessoas para chegar à cidade bengali de Shah Porir Dwip.

Os refugiados dizem que eram atacados pelos dois grupos, que destruíam casas, atiravam bombas e queimavam rohingyas vivos. "Nós viemos a Bangladesh para salvar nossas vidas", disse um homem que se identificou como Karim à agência de notícias Associated Press.

Ele afirmou ter vindo de Kunnapara, vilarejo que foi alvo na quinta (31) de militares que mataram 110 moradores. "Eles destruíram tudo. Depois de matar alguns rohingyas, eles queimaram nossas casas e lojas", disse.

"Os militares vieram com 200 pessoas ao vilarejo e começaram os incêndios. Todas as casas do meu vilarejo foram destruídas. Se nós voltarmos para lá e o Exército nos ver, vão nos fuzilar", disse o rohingya Jalal Ahmed.

Imagens de satélite divulgadas pela ONG Human Rights Watch mostram que 700 construções foram queimadas em 17 vilarejos no Estado de Rakhine, que abriga a minoria, na primeira semana do conflito com o Exército.

Para a organização, os militares foram os responsáveis pelo ataque. O comando militar birmanês culpa os rebeldes por terem incendiado as casas, nega haver opressão contra a minoria e diz que age conforme a lei.

Os rohingyas são muçulmanos sunitas que falam um dialeto bengali e reivindicam o Estado de Rakhine como seu lar originário. Eles não são considerados cidadãos e não têm direitos em Mianmar, país de maioria budista.

CONFRONTOS

Nas contas do governo de Mianmar, quase 400 pessoas morreram e mais de 11,7 mil "residentes étnicos" (forma como se referem aos rohingya) foram retirados da região do confronto com os rebeldes, no noroeste do país.

Devido ao conflito, o Programa Mundial de Alimentos suspendeu a entrega de comida para os refugiados que estão em Mianmar —as organizações humanitárias têm sido acusadas pelo governo de alimentar os rebeldes.

A entidade agia no campo de refugiados de Sittwe, capital do Estado de Rakhine, onde estão 120 mil rohingyas. Por serem membros da etnia, eles não tem acesso ao mercado de trabalho e tem seu direito de ir e vir limitado.

Sem poder se locomover por Mianmar e com os confrontos, a maioria tenta entrar ilegalmente em Bangladesh, que fechou sua fronteira com o vizinho após mais de 400 mil rohingyas chegarem tendo fugido da repressão.

O secretário-geral da ONU, António Guterres, pediu na sexta-feira (1º) "moderação" às forças de segurança diante do risco de uma "catástrofe humanitária".

O Reino Unido pediu que a atual mandatária birmanesa, Aung San Suu Kyi, ganhadora do Prêmio Nobel da Paz, contenha a ação das forças de segurança e impeça a perseguição à minoria muçulmana.


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