Folha de S. Paulo


Trump se distancia de seu partido e cobra avanço de seu programa

O presidente Donald Trump mais uma vez usou o palanque em um discurso no Missouri para pressionar, nesta quarta-feira (30) os congressistas de seu partido a ficarem ao seu lado —desta vez para aprovar a reforma tributária que ele prometeu em sua campanha.

"Não quero ser decepcionado pelo Congresso, entenderam?", disse o presidente, sob aplausos da plateia.

Michael B. Thomas/Getty Images/AFP
O presidente dos EUA, Donald Trump, discursa sobre reforma tributária em Springfield, no Missouri
O presidente dos EUA, Donald Trump, discursa sobre reforma tributária em Springfield, no Missouri

O recado foi menos agressivo que os das últimas semanas, quando Trump criticou abertamente senadores republicanos, em especial o líder da maioria do partido na Casa, Mitch McConnell, por "fracassar" em aprovar um projeto para substituir a reforma da saúde implementada por Barack Obama.

A tensão entre presidente e correligionários precede a retomada das atividades no Congresso na próxima semana, com debates complicados à frente: além da reforma tributária, a elevação do teto da dívida pública e a liberação da verba para construir o muro na fronteira com o México.

Para muitos, o resultado da investida de Trump contra membros e líderes do próprio partido pode ser desastroso.

"Gritar contra o líder do Senado não vai ajudá-lo", disse um estrategista republicano próximo à Casa Branca ao jornal "The Washington Post".

Segundo reportagem recente do "New York Times", McConnell estaria "há semanas" sem falar com o presidente e teria afirmado em conversas privadas não saber se Trump conseguiria sair das crises políticas em que se pôs.

Após a publicação, o presidente voltou à carga: "O único problema que tenho com Mitch McConnell é que, após sete anos ouvindo 'rejeite e substitua' [a reforma de Obama], ele fracassou! Isso NUNCA deveria ter ocorrido".

"Ele quer pressionar os republicanos a fazerem mais, mas, ao mesmo tempo, Trump faz isso para não ser associado aos republicanos se eles continuarem falhando", diz Patrick Basham, diretor do think tank Democracy Institute, de Washington.

Para o especialista, as críticas do presidente a outros republicanos são calculadas e integram uma estratégia de longo prazo –que não necessariamente terá sucesso.

"Acho que seu cálculo é: como ele concorreu contra o establishment —e inclusive contra o Partido Republicano— e venceu, esses eleitores ainda estão e ficarão com ele se ele continuar criticando o status quo em Washington", disse Basham à Folha.

"No longo prazo, [na eleição] em 2020, ele poderia se beneficiar do discurso de que tentou de tudo em relação ao Congresso, mesmo que não tenha conseguido avançar em muita coisa", completou.

impacto eleitoral

O cálculo de Trump seria beneficiado por recentes pesquisas que já mostram impacto ruim para os republicanos de uma relação conflituosa com o presidente. O cenário preocupa sobretudo quem busca a reeleição em 2018.

Sondagem da Universidade George Washington divulgada na semana passada mostra que 53% dos republicanos que vivem em distritos com representante republicano no Congresso consideram que seu parlamentar "não apoia Trump o bastante".

Segundo uma pesquisa da Public Policy Polling (PPP), ligada aos democratas, 66% dos eleitores de Trump dizem desaprovar o trabalho do líder do Senado, McConnell.

Outro senado, Jeff Flake, do Arizona, bastante crítico a Trump e que disputará a reeleição no próximo ano, tem hoje 62% de rejeição.

Na última semana, durante um comício em Phoenix, no Arizona, o presidente chamou Flake de "fraco", e criticou o também senador local John McCain, que deu o voto decisivo para rejeitar o projeto para substituir o sistema de saúde de Obama.

Apesar de Trump ter perdido um pouco do apoio entre seus eleitores, sua popularidade ainda é alta na sua base, na qual tem aprovação entre 75% e 80% segundo diferentes pesquisas (para o eleitorado em geral, o número flutua abaixo de 40%).

"Numa situação normal, seria desastroso ter uma relação tão ruim entre a Casa Branca e o partido do presidente no Congresso. Mas o 'novo normal' é que temos agora três partidos: os democratas, os republicanos e o partido de Trump, na Casa Branca", afirma Basham.

"Isso fez com que, até agora, Trump se importasse menos com a relação entre Executivo e Legislativo."


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