Folha de S. Paulo


Contra túneis do Hamas, Israel cria muro enterrado na fronteira com Gaza

Mohammed Abed - 23.ago.2017/AFP
Palestinos andam por praia em Gaza enquanto máquinas trabalham na construção do muro de Israel
Palestinos andam por praia em Gaza enquanto máquinas trabalham na construção do muro de Israel

De longe, parece uma obra como qualquer outra. Máquinas de perfuração, guindastes e betoneiras fazem barulho e algo em torno de 1.500 operários trabalham dia e noite perto da cidade de Netivot, no sul de Israel.

Mas o canteiro de obras, a 13 km da Faixa de Gaza, é, na verdade, uma área militar.

Lá estão sendo montados os primeiros trechos da barreira subterrânea "inteligente" com a qual Israel espera acabar com a infiltração de militantes do grupo islâmico palestino Hamas por túneis que começam em Gaza.

Por esses túneis, que atravessam a fronteira, o Hamas já conseguiu realizar ataques terroristas dentro de Israel.

O investimento é estimado em US$ 1,1 bilhão (R$ 3,5 bilhões). As autoridades fazem segredo quanto à profundidade e tecnologia utilizada. Também não se sabe se a barreira será construída ao longo de todos os 65 km da fronteira. Sabe-se apenas que estará pronta em dois anos, segundo o general Eyal Zamir, líder do Comando Sul do Exército israelense.

Jack Guez - 25.jul.2014/AFP
Soldado de Israel faz guarda de túnel do Hamas para a faixa de Gaza durante o conflito armado de 2014
Soldado de Israel faz guarda de túnel do Hamas para a faixa de Gaza durante o conflito armado de 2014

Zamir também sugeriu que pode haver tensão por causa da obra: "Se o Hamas decidir ir à guerra com Israel por causa da barreira, será uma guerra justificada para Israel. Mas a barreira será construída".

A imprensa local especula que o projeto prevê a perfuração de dezenas de metros abaixo do solo. A barreira de concreto contará com tecnologia de ponta para detectar atividade subterrânea.

O projeto pressupõe também um muro de seis metros de altura acima da terra ao longo da fronteira com Gaza, onde já há, desde 1996, uma cerca. Entre esta cerca e o novo muro, uma estrada militar será construída como uma espécie de buffer zone.

A barreira começou a ser idealizada há três anos, depois do mais recente conflito entre Israel e o Hamas (em julho e agosto de 2014), quando cerca de 4.500 foguetes e morteiros foram lançados por palestinos de Gaza contra Israel. Setenta e três israelenses morreram. Em contrapartida, Israel atacou 5.200 alvos em Gaza. Cerca de 2.100 palestinos morreram.

Um dos momentos mais traumáticos aconteceu quando militantes do Hamas emergiram de um túnel no território israelense e mataram cinco soldados. Houve outros três ataques, com mais quatro militares mortos.

Ao fim do conflito, Israel conseguiu detectar e destruir 32 túneis. Mas é considerado certo que o Hamas, que controla Gaza há 10 anos, voltou a investir neles.

Os túneis estão na pauta dos israelenses desde 2004, quando duas bases do Exército na fronteira entre Gaza e Egito foram atacadas por explosivos postos debaixo da terra. Em 2006, militantes usaram túneis para sequestrar o soldado Guilad Shalit.

Editoria de Arte/Folhapress

ALTO CUSTO

O projeto é imenso. O Ministério da Defesa está emitindo editais aos poucos para distribuir o custo e tentar diminuir o preço. Mas muitas empresas do exterior não querem se envolver por causa da sensibilidade do projeto e a proximidade com Gaza.

Nem todos consideram o muro subterrâneo uma solução. O coronel da reserva Yossi Langotsky, ex-conselheiro do Exército, afirmou ao jornal "The Marker" que uma barreira como essa será efetiva apenas por tempo limitado. "Mesmo que a penetração em Israel não se torne simples, um inimigo sofisticado e determinado como o Hamas encontrará uma maneira."

Já o coronel da reserva Shaul Shay, do Centro Interdisciplinar de Herzelyia, acha que não há opção melhor no momento. "Vai evitar todas as infiltrações do Hamas em Israel? Não. É muito caro? Sim. Mas, se salvar a vida de apenas uma pessoa, já valeu."

Shay diz esperar que a barreira tenha o mesmo sucesso do Domo de Ferro —sistema de interceptação aérea desenvolvido por Israel e pelos EUA que destruiu 735 foguetes do Hamas no conflito de 2014.

Para quem mora perto da fronteira, a barreira tem grande significado psicológico diante do medo de atentados.

O Hamas critica a medida. "A ocupação não terá sucesso em levar segurança a seus residentes com a construção de um muro na fronteira de Gaza e em nenhum outro lugar em nossa terra", disse à CNN um dos líderes do grupo, Ismail Radwan.


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