Folha de S. Paulo


Fabricação de sacos plásticos passa a ser punida com prisão no Quênia

Simon Maina/AFP
Homens e mulheres coletam materiais recicláveis em meio a pilha de lixo e sacos plásticos em Nairobi, no Quênia
Homens coletam materiais recicláveis em meio a pilha de lixo e sacos plásticos em Nairóbi, no Quênia

A fabricação, venda ou importação de sacos plásticos começará a ser punida no Quênia com até quatro anos de prisão. É uma das medidas mais rígidas do mundo para proibir o uso de um item onipresente que é visto como responsável por encher os oceanos de plástico e matar a fauna marinha.

A nova medida foi anunciada em março e entrou em vigor na segunda-feira (28). Até os sacos plásticos de lixo vão desaparecer dos supermercados, e visitantes que chegam ao país serão obrigados a deixar suas sacolas de compras duty-free no aeroporto.

O Quênia se somou a mais de 40 outros países, incluindo China, Holanda e França, que introduziram impostos sobre o uso de sacos plásticos ou proibiram sua utilização.

Sacos plásticos são proibidos por lei em Ruanda, e passageiros são revistados no aeroporto. No Reino Unido, uma taxa de £0,05 foi instituída por saco plástico desde 2015, levando a uma queda de mais de 80% no uso dos saquinhos.

Não há restrições nacionais ao uso de sacos plásticos nos Estados Unidos, embora Estados americanos como a Califórnia e o Havaí proíbam os sacos não feitos de plástico biodegradável.

Os consumidores quenianos usam 100 milhões de sacos plásticos por ano, segundo as Nações Unidas, e o anúncio das novas normas foi recebido com preocupação na capital, Nairóbi.

Os vendedores de hortifrútis não sabem como vão vender seus produtos, e algumas pessoas confundiram os policiais de trânsito normais com fiscais que puniriam os consumidores que violam a nova lei.

Em loteamentos irregulares e favelas, onde vive a maioria da população da capital, saquinhos plásticos fazem as vezes de "privadas portáteis", sendo usados para receber dejetos humanos, na ausência de saneamento básico adequado.

Simon Maina/AFP
Homem carrega recipientes de plástico em local de despejo na cidade de Nairóbi, no Quênia
Homem carrega recipientes de plástico em local de despejo na cidade de Nairóbi, no Quênia

A ministra queniana do Meio Ambiente, Judy Wakhungu, procurou acalmar os temores da população, dizendo à agência de notícias Reuters que a proibição é voltada principalmente aos fabricantes e fornecedores de saquinhos plásticos. "As 'wananchi' não serão atingidas", ela disse, usando um termo em suaíli para designar pessoas comuns.

O país tentou proibir o uso de sacos plásticos em 2007 e novamente em 2011, mas não foram adotadas restrições na época.

Os novos regulamentos preveem multa de US$ 19 mil a US$ 38 mil ou pena de quatro anos de prisão para quem fabrica ou importa sacos plásticos no país. A medida não se aplica aos plásticos usados em embalagens industriais primárias, segundo a Agência Nacional de Gestão Ambiental, com a ressalva de que a nova lei vai proibir a venda de sacos de lixo por estabelecimentos varejistas.

A população teve vários meses para adaptar-se à ideia das novas regras, período durante o qual as grandes redes de supermercados, como Nakumatt e a multinacional francesa Carrefour, começaram a oferecer sacos de tecido, em lugar de plástico.

Na semana passada a Alta Corte queniana rejeitou uma ação movida contra a lei por duas importadoras de sacos plásticos, dizendo que a proteção ambiental é mais importante que os interesses comerciais das empresas.

Antes de a proibição entrar em efeito, Chege Kariuki, presidente da Associação de Gestão Ambiental e de Lixo do Quênia, disse que os lixeiros não vão poder operar sem sacos de lixo de plástico. "A coleta de lixo em Nairóbi ficará impossível", ele disse ao jornal queniano "The Star".

Samuel Matonda, porta-voz da Associação Queniana de Manufatores, disse que a nova lei levará à perda de até 60 mil empregos. "Os efeitos secundários serão muito graves", ele disse ao jornal "The Standard". "Até as vendedoras de legumes nas feiras serão afetadas –como as pessoas vão poder carregar suas compras para casa?"

Simon Maina/AFP
Vaca pasta próximo a sacos plásticos em local de despejo na cidade de Ngong, no Quênia
Vaca pasta próximo a sacos plásticos em local de despejo na cidade de Ngong, no Quênia

Em lugar de sacos plásticos, o governo queniano está incentivando as pessoas a usar sacos alternativos reutilizáveis feitos de papel, tecido ou sisal.

Segundo o Programa das Nações Unidas para o Meio Ambiente, o uso de sacos plásticos em todo o mundo contribui para os 8 milhões de toneladas de plástico que vazem para o oceano a cada ano.

"Se o ritmo atual for mantido, até 2050 haverá mais plástico do que peixes nos oceanos, provocando a destruição da fauna, dos estoques de peixes e do turismo", disse o Pnuma em comunicado quando foi feito o anúncio da nova lei queniana, em março.

Os sacos plásticos podem levar centenas de anos para se degradar. Sacos de polietileno estrangulam tartarugas marinhas e enchem os estômagos de baleias e golfinhos, levando à sua morte por inanição. O gado no Quênia frequentemente ingere plástico quando está pastando, e saquinhos plásticos são encontrados nos estômagos de vacas abatidas, segundo o Pnuma.

Njeri Kabeberi, diretora executiva do Greenpeace na África, disse que a população queniana precisa aderir ao uso de materiais de embalagem 100% reutilizáveis e ecológicos.

"Exortamos todos os quenianos a tomarem consciência da importância da preservação do meio ambiente", ela disse.

Tradução de CLARA ALLAIN


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