Folha de S. Paulo


Primária legislativa é teste para Cristina e Macri na Argentina

Os argentinos voltam às urnas neste domingo (13) para as Paso (Primárias Abertas Simultâneas e Obrigatórias) —votação para definir as candidaturas das próximas eleições legislativas, que ocorrem em 22 de outubro e renovam um terço do Senado (24 cadeiras) e quase metade da Câmara de Deputados (127).

Além da redefinição do tamanho das bancadas governista, que hoje é minoria, e da oposição —de maioria peronista—, as legislativas terão ainda dois outros significados.

Marcos Brindicci - 20.jun.2017/Reuters
A ex-presidente da Argentina Cristina Kirchner lança sua candidatura ao Senado em comício em junho
A ex-presidente da Argentina Cristina Kirchner lança sua candidatura ao Senado em comício em junho

Será a primeira avaliação nas urnas da gestão de Mauricio Macri, que completa 19 meses no cargo. Se as pesquisas apontam que o presidente mantém uma imagem positiva de cerca de 50%, isso ainda não se traduziu numa harmonização da chamada "grieta" (fenda), a polarização política do país.

Há setores da população inquietos com a demora do governo no cumprimento de promessas, principalmente na área econômica. A inflação está em 35%, o crescimento do PIB previsto para 2017 é de apenas 1,1% e a moeda perdeu valor —o dólar disparou novamente nesta semana e ultrapassou a barreira dos 18 pesos.

Assim, a aliança governista Cambiemos (mudemos) lutará para ganhar mais cadeiras no Congresso e garantir a governabilidade na segunda parte do mandato de Macri.

VOLTA DE CRISTINA

A segunda definição importante é o fato de as primárias servirem de termômetro para medir o fôlego político da ex-presidente Cristina Kirchner, 64, que tem planos de voltar a concorrer à Presidência em 2019.

Agora, Cristina sairá como candidata ao Senado pela província de Buenos Aires, principal reduto eleitoral do país, com 38% dos votantes. Em sua campanha, com sua típica retórica feroz e hábil, Cristina vem se apresentando como a opção "antiajuste".

Aponta Macri como responsável pelo fim de vários subsídios e pelos aumentos nas tarifas. Reforça que os argentinos ainda serão prejudicados com uma proposta de flexibilização trabalhista e mais aumentos nos custos dos serviços, previstos pelo governo para o pós-eleição.

As pesquisas mais recentes dão uma vantagem pequena, de 4 a 8 pontos percentuais, de Cristina sobre seu rival direto, o candidato macrista Esteban Bullrich, ex-ministro da Educação.

Mas o alto número de indecisos (cerca de 30%) e os erros cometidos pelos principais institutos de pesquisa em 2015 —que previram que Macri seria derrotado no primeiro turno— fazem com que os analistas evitem previsões.

Na noite da última quinta-feira (10), uma pesquisa encomendada pela Casa Rosada e vazada para a imprensa dava um empate técnico entre Cristina e Bullrich.

Outra particularidade desta eleição é que o peronismo não conseguiu unificar-se ao redor de uma candidatura.

Cristina nem sequer quis disputar internamente com outro peronista dentro do Partido Justicialista. Por isso, saiu dele e criou um novo, o Unidad Ciudadana.

Já a aliança Cumplir, que inclui o Partido Justicialista, considerado o oficial do peronismo, terá uma disputa interna, liderada pelo ex-ministro de Transporte, Florencio Randazzo. Enquanto isso, outro peronista que correrá por fora, com seu próprio partido, é Sergio Massa, ex-chefe de gabinete durante o kirchnerismo e ex-candidato a presidente em 2015.

Tal fragmentação do peronismo joga a favor de uma ampliação da influência de Macri e da aliança Cambiemos pelo país.

ENCERRAMENTO

Nos encerramentos de campanha, Randazzo, Massa e Cristina disputaram o legado do peronismo.

"Nós somos os bons peronistas, os que militam no peronismo seja nos bons como nos maus tempos", disse Randazzo, diante de um palco com imagens de Perón (1895-1974) e Evita (1919-52).

Já Sergio Massa, sem citar Cristina, afirmou que o peronismo não deveria "voltar ao passado". E acrescentou: "Os que têm coração peronista e estão com asco com relação ao que ocorre com a economia, que votem na nossa chapa."

A ex-presidente, por sua vez, foi ao bairro mais populoso e de maior votação peronista, La Matanza, com mais de 1 milhão de eleitores, e prometeu que, caso vença, irá "colocar um freio no retrocesso em que o país entrou".

O governo preferiu encerrar a campanha com um discurso único de Macri em Córdoba, província em que teve uma de suas maiores votações na eleição presidencial de 2015. O mandatário pediu o voto nos candidatos da aliança Cambiemos "para não parar as mudanças que começamos em 2015, quando pusemos o país em marcha".

MENEM

Outro ex-presidente peronista que ganhou os holofotes nas últimas semanas foi Carlos Menem (1989-1999).

Aos 87 anos, o hoje senador está condenado a sete anos de prisão por tráfico de armas à Croácia e ao Equador durante sua gestão. Até hoje, porém, não havia sido levado à cadeia porque, como é congressista, tem imunidade parlamentar.

Temendo perdê-la ao final do atual mandato, Menem voltou a se inscrever como candidato a senador por La Rioja, sua província, e vinha fazendo campanha normalmente até que, no começo da semana passada, a Justiça Eleitoral impugnou sua candidatura.

Sua base de apoio, porém, saiu a defendê-lo com um ato em La Rioja, enquanto Menem apelou para a Corte Suprema, que determinou que tomará uma decisão apenas após as Paso.

Isso significa que sua candidatura ficou condicionada. Ele poderá disputar as primárias neste domingo (13), mas corre o risco de perder o direito de concorrer em outubro, dependendo da decisão dos juízes.


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