Folha de S. Paulo


Rebelde, procuradora da Venezuela diz acreditar que será destituída

Ariana Cubillos/Associated Press
A procuradora-geral da Venezuela, Luisa Ortega Díaz, fala a repórteres nesta terça (4), em Caracas
A procuradora-geral da Venezuela, Luisa Ortega Díaz, fala a repórteres nesta terça (4), em Caracas

A Procuradora-Geral da Venezuela, Luisa Ortega Díaz, negou-se nesta terça-feira (4) a comparecer ante o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ), que decidirá se ela será submetida ante um julgamento que levaria a sua destituição.

"Não compareci ao TSJ, não vou validar um circo que mancha nossa história com vergonha e dor, e cuja decisão já está cantada", declarou Ortega, em um pronunciamento a repórteres na sede do Ministério Público venezuelano.

O plenário do TSJ iniciou a audiência às 10h locais (11h em Brasília). Nela, a mais alta instância jurídica do país determinará se Ortega Díaz incorreu em "falta grave".

O deputado chavista Pedro Carreño faria suas argumentações pela consideração de mérito —por parte do Supremo— de seu pedido contra a procuradora. O político a acusa de "mentir" por ter afirmado que não aprovou a eleição de 33 magistrados feita em 2015 na legislatura anterior, de maioria chavista.

"Não os reconheço [aos magistrados], com este ato estará aberto o caminho para aniquilar com vias violentas o descontentamento popular. Já sabemos que a partir de hoje vão operar minha remoção", disse a procuradora-geral.

Ex-aliada do presidente Nicolás Maduro, a procuradora-geral rompeu com o chavismo no fim de março, após as sentenças do TSJ (Tribunal Supremo de Justiça) que tiravam os poderes do Legislativo, dominado pela oposição, e a imunidade parlamentar. As medidas foram revertidas após Ortega Díaz chamá-las de "ruptura na ordem constitucional".

"Não descansarei até que a Venezuela retome o caminho das liberdades", afirmou Ortega Díaz nesta segunda-feira (3).

VICE-PROCURADORA

Ortega Díaz também afirmou nesta terça desconhecer a nomeação pelo TSJ da chavista Katherine Harrington como vice-procuradora-geral. Ela assumiria o cargo de Ortega caso ela fosse destituída pelo processo no Supremo.

"Desconheço a vice-procuradora juramentada pelo Tribunal Supremo de Justiça. Está em perigo a liberdade, a democracia e os direitos humanos", declarou Ortega Díaz.

A pressão do governo Maduro contra a procuradora-geral rebelde acirrou ainda mais a crise política na Venezuela, mergulhada em um colapso econômico e, há três meses, em uma onda de protestos que já deixou mais de 80 mortos.

Para a procuradora-geral, Maduro busca anular o Ministério Público. "Está claro que o TSJ perpetrará uma nova violação à nossa Constituição para anular a última instituição capaz de defender as pessoas e os manifestantes."

O Executivo já havia iniciado na segunda-feira uma auditoria no órgão, por meio da instalação de comissões de fiscalização para "verificar a legalidade de a sinceridade de suas operações", alertando que uma eventual descoberta de irregularidades pode gerar "sanções previstas na lei".

O distanciamento de Ortega Díaz em relação ao chavismo aumentou em maio, após Maduro anunciar a convocação de uma Assembleia Constituinte para reescrever a Carta Magna de 1999, considerada pela procuradora-geral como o maior legado do ex-presidente Hugo Chávez. Ela apresentou ao TSJ, controlado por juízes aliados de Maduro, recursos contra a Constituinte, os quais foram rejeitados.

Ortega Díaz, que relatou perseguições contra seus familiares, disse nesta segunda-feira que seu papel de procuradora-geral "exige assumir a linha de frente na defesa do Estado republicano".

A Venezuela enfrenta uma grave crise política e econômica e há três meses registra protestos convocados quase diariamente pela oposição contra o governo Maduro. Os atos frequentemente terminam em saques e confrontos entre policiais e manifestantes, e já deixaram mais de 80 mortos desde abril.


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