Folha de S. Paulo


Países da Otan aumentam gastos em meio a críticas de Trump

Os aliados dos EUA na Otan (aliança militar ocidental) pretendem aumentar seus gastos em defesa até 4,3% neste ano, disse o secretário-geral da organização, Jens Stoltenberg, na quarta-feira (28), respondendo em parte à intensa pressão do presidente americano, Donald Trump, para que os países invistam mais em suas Forças Armadas.

Trump criticou de modo insistente os aliados da Otan por sua dependência dos militares americanos para sua defesa, e chegou a questionar as garantias básicas de segurança dos EUA que sustentaram a estabilidade europeia desde a Segunda Guerra Mundial.

O aumento de verbas é "uma clara demonstração de que nossa aliança continua unida diante de qualquer agressão possível", disse Stoltenberg a repórteres no quartel-general da Otan, um dia antes de uma reunião de ministros da Defesa dos países-membros. "Nós realmente trocamos de marcha. A tendência é ascendente, e pretendemos mantê-la."

John Thys/AFP
O secretário da Defesa dos EUA, James Mattis, discursa na sede da Otan, em Bruxelas, nesta quinta (29)
O secretário de Defesa dos EUA, James Mattis, discursa na sede da Otan, em Bruxelas, nesta quinta

O aumento —uma estimativa para 2017— expandirá os gastos militares dos 29 países-membros da Otan para US$ 277 bilhões, o que ainda é muito menos do que os EUA gastam sozinhos. Alguns aumentos de gastos foram decididos antes da eleição de Trump, em novembro.

A Otan divulgou na quarta-feira apenas uma parte de seus números atualizados, mas as estimativas anteriores para 2016 situavam em 70% a parcela dos EUA no orçamento de defesa da Otan.

O aumento de gastos ocorre anos depois de cortes nos orçamentos dos países europeus até 2014, pois acreditavam que com o colapso da União Soviética não precisariam mais estar prontos para travar uma guerra em seu próprio solo.

Depois da ocupação da península da Crimeia pela Rússia em 2014, entretanto, os líderes da Otan prometeram aumentar os gastos de defesa para 2% de seu PIB (Produto Interno Bruto) até 2024. Em uma reunião em maio, eles disseram que apresentariam planos concretos sobre como chegarão lá.

O aumento de gastos anunciado na quarta-feira é de US$ 12 bilhões a mais que os níveis de 2016, e os aumentos também estão ficando maiores —o gasto em 2016 foi 3,3% superior ao de 2015.

Mas só 5 dos 29 membros da Otan atualmente cumprem as diretrizes de gastos. A Romênia pretende chegar lá neste ano, enquanto a Lituânia e a Letônia esperam atingir a meta em 2018.

O ex-presidente Barack Obama também criticou os membros da Otan por serem abertamente dependentes do guarda-chuva de segurança dos EUA, mas Trump elevou a crítica a um novo nível durante a campanha eleitoral no ano passado.

Trump sugeriu que se um membro da Otan for atacado ele primeiro checará seu nível de gastos antes de decidir ajudá-lo.

Depois, em uma reunião de líderes da Otan no mês passado que foi organizada para que Trump tranquilizasse seus aliados sobre os compromissos de defesa dos EUA, ele acabou censurando seus gastos e se absteve de um compromisso explícito com o princípio básico da Otan de que um ataque a um dos países equivale a um ataque a todos, o Artigo 5º da Carta da aliança.

Mais tarde, Trump fez essa promessa juntamente com o presidente da Romênia no Rose Garden da Casa Branca, mas o dano estava feito.

O secretário de Defesa, James Mattis, repetiu na quarta-feira o compromisso americano, falando ao lado de sua contraparte alemã, a ministra da Defesa, Ursula von der Leyen.

"O compromisso dos EUA com nossa garantia de segurança na Otan, o Artigo 5º, é firme como ferro, como foi demonstrado durante décadas de nossa prontidão e manifestado recentemente pelo presidente Donald Trump diante do povo americano", disse Mattis em Garmisch, na Alemanha.

Mattis acrescentou que o compromisso dos EUA com as mobilizações da Otan nos países do Leste Europeu que se sentem ameaçados pela Rússia será mantido pelo menos até 2020. Ele também indicou um aumento de 42% em gastos militares para a Europa na proposta de Orçamento apresentada por Trump. "Além de qualquer palavra nos jornais, vocês podem julgar os EUA por esses atos", disse ele.

Ao aumentar suas verbas de defesa, os aliados da Otan tiveram de percorrer uma fina linha política, já que Trump é profundamente impopular entre seus eleitores, e qualquer sinal de capitulação às exigências dos EUA hoje pode ser prejudicial nas urnas.

Os aliados tentaram projetar suas decisões de gastos como uma reação a suas próprias necessidades de defesa. Muitas das decisões de gastos para 2017 que juntas formam o aumento anunciado na quarta-feira foram feitas antes da improvável vitória de Trump em novembro.

"Eu aprecio o forte enfoque do presidente Trump nos gastos de defesa e na divisão de encargos, porque é importante estarmos presentes", disse Stoltenberg. "Os aliados europeus devem investir mais em defesa não só para agradar aos EUA, mas por seus próprios interesses."

A Alemanha, país mais rico da Europa, é um dos que mais devem à aliança, e sua contenção de gastos foi um importante elemento na deterioração do relacionamento do governo Trump com o país.

Von der Leyen, a ministra da Defesa alemã, disse na quarta-feira que seu país está trabalhando para atingir a meta de gastos.

"Precisamos ter uma divisão de encargos justa na Europa", disse ela, ao lado de Mattis na Alemanha. "Se quisermos ter estabilidade nas regiões vizinhas, temos de assumir a responsabilidade por isso."

Tradução de LUIZ ROBERTO MENDES GONÇALVES


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