Folha de S. Paulo


Sistema eleitoral francês esvazia força de partido de Marine Le Pen

Reuters
De extrema direita, Le Pen defende o 'Frexit
Marine Le Pen, líder da Frente Nacional, legenda da direita ultranacionalista

Há dois meses, na campanha presidencial francesa, Marine Le Pen parecia próxima do palácio do Eliseu. Com sua Frente Nacional, da direita ultranacionalista, ela chegou ao segundo turno em 7 de maio e recebeu 34% dos votos. Emmanuel Macron foi eleito presidente com 66%.

Já nas eleições legislativas, com segundo turno neste domingo (18), seu partido deve obter no máximo 5 cadeiras na Assembleia Nacional, contra até 455 do República em Frente!, de Macron.

Os conservadores Republicanos devem ter no máximo 110 assentos, e o Partido Socialista não passará dos 30.

As projeções foram feitas pela empresa Ipsos com base no primeiro turno, realizado em 11 de junho, em que Le Pen teve 13,2% dos votos, e Macron, 32,32%. A Assembleia tem 577 deputados.

A discrepância entre porcentagem de votos e número de assentos é explicada pelo sistema distrital francês, em que os deputados são eleitos por distrito eleitoral, e não proporcionalmente ao total.

Eleições Legislativas na França

Isso significa que um partido pode ter um bom desempenho no voto popular, mas ser derrotado caso a caso nos distritos –é o caso da FN.

Não à toa a sigla de direita radical reclama há anos desse sistema. David Rachline, prefeito de Fréjus (sudeste), exigiu na segunda (12) que a Assembleia passe a ser eleita com voto proporcional.

O jornal "Le Monde" calculou qual seria o desempenho dos partidos nesta eleição se Rachline fosse ouvido: a FN teria 85 cadeiras, e a República em Frente!, 186.

DEMOCRACIA

Há mérito na exigência de Rachline, afirma à Folha Jean-Yves Camus, um dos principais especialistas sobre a Frente Nacional. "Assim como a esquerda radical, eles estão em desvantagem."

Esses partidos nos extremos do espectro político não têm tantos aliados quanto os centristas e, portanto, têm mais dificuldades para eleger deputados, explica Camus.

"Todos tememos que o sistema seja injusto", diz. "Mas, todas as vezes em que isso foi debatido nas últimas décadas, os políticos consideraram um risco a FN ter muitos assentos. O problema deles com a direita ultranacionalista era mais importante do que a questão democrática, que é o que está em jogo: é justo impedir milhões de pessoas de terem representatividade?"

Camus sugere que a França adote um sistema distrital misto, que inclua uma lista de candidatos eleitos a partir dos votos recebidos pelo partido no país, em vez de apenas distrito a distrito. "Não podemos continuar com esse modelo antigo."

A mudança poderia, a seu ver, resolver um dos problemas expostos pelo primeiro turno das eleições legislativas: a abstenção de 51,29%.

"Se houvesse um sistema proporcional, os eleitores se sentiriam parte da sociedade. Muitos estão convencidos de que seu voto não muda nada, e essa é uma razão pela qual muitos que foram às urnas nas eleições presidenciais não foram nas legislativas."

A diferença de participação nas duas eleições é especialmente impactante entre os eleitores da FN. Foram 7,6 milhões de votos no partido no primeiro turno presidencial, em 23 de abril, e 2,9 milhões no primeiro turno legislativo, em 11 de junho.

Mas o abismo de 4,7 milhões de eleitores não é explicado apenas pelo desânimo.

O discurso da FN encontra forte rejeição, apesar do esforço de Le Pen para limpar o passado de antissemitismo e racismo explícitos da sigla.

O ranço não se dissipou: segundo mensagens em redes sociais compiladas pelo site Buzzfeed, ao menos 100 dos 573 candidatos da FN às legislativas fizeram declarações ofensivas ou criminosas.

Entre elas, há sugestões de que existe um lobby judaico, caricaturas ofensivas de negros e uma imagem da chanceler alemã, Angela Merkel, amamentando migrantes.

ELEIÇÕES LEGISLATIVAS NA FRANÇA - Contagem oficial de votos, em %

ELEIÇÕES LEGISLATIVAS NA FRANÇA - Presidente Emmanuel Macron deve garantir maioria folgada no Parlamento


Endereço da página:

Links no texto: