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Em cinquentenário da Guerra dos Seis Dias, paz ainda está distante

Daniela Kresch/Folhapress
Katja and Alon Epelbaum, imigrantes franceses na colônia israelense de Eli, na Cisjordânia Foto: Daniela Kresch/Folhapress ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Katja and Alon Epelbaum, imigrantes franceses na colônia israelense de Eli, na Cisjordânia

Se Deus criou o mundo em sete dias, uma guerra moldou o atual Oriente Médio em seis.

Em 5 de junho de 1967, começou um conflito cujas consequências ecoam meio século depois.

A Guerra dos Seis Dias, vitória contundente de Israel, um país com então 19 anos de idade, cativou o mundo.

Mas o infortúnio dos derrotados, principalmente os palestinos, logo passou a ofuscar os louros dos vencedores, tornando-se um "sétimo dia" que nunca termina.

Desde 1967, houve cápsulas de esperança. Mas o clima hoje é de incredulidade quanto a uma solução para a questão palestina. Segundo pesquisa divulgada pelo jornal "Yedioth Aharonoth" (Últimas Notícias), 63% dos israelenses —incluindo a minoria árabe do país, 20% da população— não acreditam numa "paz verdadeira" entre Israel e os palestinos.

Da noção quase consensual de "dois Estados para dois povos", cada vez mais pessoas —por ideologia, desespero ou falta de opção— defendem um novo tipo de solução compartilhada. Para uns, isso significaria duas entidades convivendo na mesma terra. Para outros, a manutenção da situação atual. As nuances são inúmeras.

Duas narrativas —a israelense e a palestina— se desenvolveram depois da "ocupação" ou "liberação" dos territórios que Israel passou a controlar, o que deixou cerca de 1 milhão de árabes sob o controle do país.

Cerca de 380 mil pessoas que viviam na Cisjordânia, em Gaza e no Golã fugiram ou foram expulsas, conforme a narrativa, engrossando o total de refugiados da guerra de 1948, pós-criação de Israel.
euforia

Entre os israelenses, houve uma onda de euforia e autoconfiança abalada só com a Guerra do Yom Kippur, em 1973. Para muitos, tratou-se de uma vitória quase "divina", principalmente pela conquista da Cidade Velha de Jerusalém, onde fica o Muro das Lamentações, local mais sagrado para o judaísmo, nas mãos da Jordânia desde 1948.

"O que aconteceu há 50 anos foi um milagre. Depois de 2.000 anos sem uma nação, finalmente voltamos ao nosso lar. É na Judeia e a Samária [nomes hebraicos da Cisjordânia] e em Jerusalém que a maior parte dos relatos bíblicos aconteceu", diz a franco-israelense Katja Epelbaum, 44, moradora da colônia de Eli, um dos 131 assentamentos legais criados na região após 1967 —há outros 97 ilegais, segundo a ONG Paz Agora.
Katja e o marido, Alon, são religiosos, mas o perfil dos mais de 500 mil colonos israelenses não é uniforme.

Noam e Tehila Cohen, por exemplo, são agricultores seculares que fundaram o assentamento ilegal de Neve Erez há 18 anos, onde realizam festivais de música alternativa e cultivam frutas e legumes orgânicos.
"Vim para cá por amor à terra, não por ideologia. Mas minha opinião mudou. Acho que aqui é o lar nacional do povo judeu", diz Noam.

"Com os palestinos, nosso relacionamento é de respeito e suspeição. Temos que conviver, colaborar. Podemos viver juntos, mas nunca será uma relação de amor."

Para o jornalista e pesquisador Shmuel Rosner, do Instituto de Política do Povo Judeu (JPPI), a guerra marcou a transição de Israel de uma situação de existência incerta para a de potência regional. "Israel se transformou, de um pequeno país, humilde e frágil, em um país muito mais forte, muito mais dominante, na região e no mundo", avalia ele.

O professor Efraim Inbar, do Centro de Estudos Estratéticos Begin-Saadat, afirma que a conquista militar de Israel teve enorme efeito regional, o que levou aos acordos de paz com o Egito (1978) e a Jordânia (1994), além de um relacionamento de fato com os países do Golfo. "Foi um longo caminho para convencer o mundo árabe de que Israel não pode ser facilmente destruído pela força."

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Os agricultores Tehilla e Noam Cohen, do assentamento de Neve Erez, na Cisjordania Foto: Daniela Kresch/Folhapress ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Os agricultores Tehilla e Noam Cohen, do assentamento de Neve Erez, na Cisjordânia

DIVERGÊNCIAS

Historiadores discordam sobre as intenções do governo israelense antes e logo após a captura de tantos territórios na Guerra dos Seis Dias, travada há 50 anos.

Segundo o general israelense Uzi Narkiss, nome proeminente no conflito, não havia um objetivo claro.

"O governo israelense não tinha intenção de capturar a Cisjordânia. Havia oposição a isso. O resultado final foi algo que ninguém havia planejado", disse Narkiss algum tempo depois. No caso da Cidade Velha de Jerusalém, a hesitação é documentada.

O ministro da Defesa à época, Moshe Dayan, preocupado com a reação do mundo árabe, fez questão de, para acalmar os ânimos, colocar a Esplanada das Mesquitas sob administração jordaniana (status que dura até hoje).

Logo depois da guerra, Israel fez diversas ofertas de trocar terras por paz. Mas não no caso de Jerusalém Oriental, que anexou, aumentando as fronteiras da cidade.

Em setembro de 1967, uma resolução da Liga Árabe declarou os "três nãos": Não à paz com Israel, não ao reconhecimento do país e não a quaisquer negociações.

Com o passar do tempo, líderes da direita israelense começaram a pregar a construção de assentamentos para tornar mais difícil abrir mão das terras conquistadas.

"A situação atual é temporária há 50 anos e pode continuar a ser temporária por mais 50. Não é uma solução ideal, mas a 'menos ruim'", afirma Shmuel Rosner, pesquisador do Instituto de Política do Povo Judeu.
Para Esther Sternburg, 67, judia ortodoxa que mora na Cidade Velha de Jerusalém, abrir mão do Muro das Lamentações é impensável. A solução seria a convivência.

"Acho que temos que viver juntos, nesta Terra Santa. Sou a favor da liberdade de morar onde quiser."


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