Folha de S. Paulo


Celso Amorim defende estratégia que governo Temer criticou

O ex-chanceler Celso Amorim rebateu com previsível veemência a crítica de que faltou à diplomacia brasileira nos três governos mais recentes "uma grande estratégia", crítica formulada pela Secretaria Especial de Planejamento Estratégico do governo Michel Temer.

"Você pode discordar da estratégia, mas dizer que não havia uma é totalmente falso e revela desconhecimento da realidade", disse à Folha o ex-chanceler, o mais duradouro de todos os ministros do Exterior na história –o que significa que as críticas à diplomacia batem diretamente nele.

Hector Retamal/AFP
Celso Amorim fala no Haiti durante missão de inspeção eleitoral
Celso Amorim fala no Haiti durante missão de inspeção eleitoral

Ainda mais que ocupou, depois, no governo Dilma Rousseff (PT), o Ministério da Defesa e, antes, havia sido embaixador em postos-chaves, como Genebra e Londres.

Ainda a propósito de estratégia, o ex-chanceler conta que acaba de lançar um livro com o título, precisamente, de "A Grande Estratégia do Brasil".

Conta também que está chegando de Xangai (China), cidade em que está instalado o banco dos Brics, grupo criticado no texto do governo Temer. Os Brics nasceram, segundo Amorim, do interesse de China e Rússia pelo Ibas (grupo formado por Índia, Brasil e África do Sul, as grandes democracias multiétnicas do mundo).

Seria uma evidência de que funcionou a estratégia diplomática brasileira, calcada no multilateralismo, "sem hostilizar outros parceiros".

Como é natural, pela proeminência que teve no governo Lula, Amorim centra a sua crítica ao documento do governo Temer na avaliação que este faz desse período. Acha que não é razoável falar em fracasso, como faz o texto palaciano, quando "é notório o respeito internacional que o governo Lula angariou".

Dá um exemplo pontual: "Nem sonhando se poderia pensar, antes, em que representantes brasileiros fossem eleitos, praticamente ao mesmo tempo, para a direção geral da OMC (Organização Mundial do Comércio) e para a FAO (braço da ONU para Agricultura e Alimentação)".

Hoje, o embaixador Roberto Azevêdo comanda a OMC e José Graziano é o chefe da FAO.

Amorim não quis rebater ponto a ponto as críticas contidas no documento da Assessoria de Planejamento Estratégico, alegando que o lera apressadamente. "Pensei a princípio que era um documento dos críticos habituais [da gestão Lula]. Depois é que minha mulher me avisou que se tratava de um trabalho do palácio de governo. É lamentável que se tenha essa visão do Brasil".

A estratégia brasileira, não apenas a de política externa, foi, segundo Amorim, acumular a eliminação de hipotecas. Primeiro, a superação do autoritarismo, que envolveu diferentes atores políticos e a sociedade civil; depois, a superação da instabilidade econômica (obras dos governos Itamar Franco e Fernando Henrique Cardoso) e, por fim, no governo Lula, a diminuição da desigualdade social.

Amorim admite, como é natural, que não conseguiu fazer tudo. Dá um exemplo concreto: "No Mercosul [também criticado no documento do governo Temer], fizemos o que era possível dentro da realidade".

O único ponto em que o ex-chanceler concorda com o texto da Assessoria de Planejamento Estratégico é na crítica ao governo do próprio Michel Temer, também feita pela Assessoria.

"O Brasil perdeu presença internacional", diz Amorim.


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