Folha de S. Paulo


Constituinte cria dualidade que levará Venezuela ao caos, diz Aloysio Nunes

O chanceler brasileiro, Aloysio Nunes, condenou nesta quarta (31), na reunião de chanceleres da OEA (Organização dos Estados Americanos) sobre Venezuela, a convocação de uma Assembleia Constituinte no país, que "poderá levar a Venezuela a um caos ainda maior" e pediu a suspensão do processo.

Nesta quarta, o Tribunal Supremo de Justiça (TSJ) do país decidiu que o presidente Nicolás Maduro tem o poder de convocar uma Assembleia Constituinte sem consulta prévia em referendo.

Nicholas Kamm/AFP
O ministro das Relações Exteriores brasileiro, Aloysio Nunes, fala em reunião de chanceleres da OEA
O ministro das Relações Exteriores brasileiro, Aloysio Nunes, fala em reunião de chanceleres da OEA

"Temos uma preocupação muito grande com o processo constituinte em curso proclamado e convocado pelo presidente Maduro, em contradição com a própria Constituição bolivariana", disse Nunes, na sede da OEA em Washington. "Acreditamos que este processo só fará acirrar os antagonismos políticos."

O chanceler condenou a "repressão impiedosa" do governo Maduro e exortou o governo a suspender o processo constituinte "para que haja espaço para um diálogo".

"Não estou falando de direitos abstratos, mas há pessoas morrendo, morrendo pela repressão impiedosa que vem do governo e que só faz acirrar o desespero da oposição, no ciclo vicioso de repressão e resistência que leva a cada vez mais mortos", afirmou.

Nunes disse que o objetivo da reunião de chanceleres não é "punir, intervir ou condenar ninguém". "O nosso objetivo é criar condições políticas favoráveis para que os venezuelanos possam, soberanamente, encontrar uma solução para a crise", afirmou, completando que a OEA "tem sim legitimidade e responsabilidade para essa atuação".

O ministro afirmou que os membros da OEA "precisam agir" e negou a acusação, por parte de Caracas e de seus aliados, de que o organismo esteja tentando intervir na Venezuela.

"Não podemos cruzar os braços. Nós que integramos a OEA, que tem entre os princípios fundadores, o respeito à democracia representativa. Inação e indiferença não podem ser opções para nós", disse.

Segundo ele, autodeterminação e soberania "resultam justamente da possibilidade do povo falar livremente".

Nunes defendeu um país com eleições livres, que tenham um calendário fixo e "não mudem segundo a conveniência dos governantes" e onde os líderes politicos "possam atuar e não tenham seus passaportes confiscados para impedi-los de sair do país".

O brasileiro propôs que continuem sendo feitas reuniões de chanceleres do organismo, para encontrar pontos de consenso entre a OEA e os atores principais na Venezuela, e defendeu a ideia da criação de um "grupo de contato" que se reporte à reunião de chanceleres.

BRASIL

Nunes destacou que milhares de cidadãos venezuelanos têm atravessado todos os dias a fronteira entre os dois países e afirmou ser necessário deixar que a ajuda humanitária chegue à Venezuela.

"Eles são todos bem-vindos, queremos recebê-los bem. O problema é que esses irmãos venezuelanos têm vindo ao Brasil não porque queiram, necessariamente, mas porque são forçados a ir para o Brasil para fugir do desabastecimento, da falta de alimentos, de medicamentos", disse.

"Queremos obter um espaço de entendimento para que o governo venezuelano possa receber a cooperação dos países irmãos para ajudar a enfrentar essa crise."

Dois textos estão sendo discutidos às margens da reunião de chanceleres, por membros dos países presentes na reunião: um redigido por Peru, Canadá, México, EUA e Panamá, que prevê a criação de um "grupo de contato" para ajudar no diálogo entre governo e oposição e tem linguagem mais contundente em relação a Caracas, e outro proposto pelos países do Caribe, de tom mais brando e sem a previsão de criação do grupo.

Os representantes permanentes tentam mesclar os dois documentos, chegando a um texto aceitável pela maioria. Para ser aprovado, ele precisaria ter dois terços dos votos dos países presentes à reunião.

Os países do Caribe, que reúnem quase a metade dos 34 Estados membros ativos, já se mostraram resistentes à criação do grupo de contato —que também teria que ser aceito por Caracas.

A Venezuela, que não tinha confirmado presença até minutos antes do início da reunião decidiu participar do encontro. Até o momento sua representante não havia falado.


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