Folha de S. Paulo


Para especialistas, queda de James Comey tornará o FBI mais forte

3.mai.2017/Xinhua
O ex-diretor do FBI, James Comey, testemunha no Senado no último dia 3
O ex-diretor do FBI James Comey testemunha no Senado no último dia 3

As suspeitas em relação às circunstâncias da demissão do diretor do FBI, James Comey, na última semana, poderão fazer com que a instituição saia fortalecida do episódio, ao contrário do que se esperava, afirmam especialistas e ex-agentes.

A ideia é que, diante das dúvidas sobre a real intenção do presidente em demitir Comey —que conduzia uma investigação sobre possíveis ligações de assessores de Donald Trump com a Rússia durante a campanha eleitoral—, o Congresso e a população permanecerão atentos a qualquer obstrução das investigações.

Os agentes também deverão estar mais dispostos a denunciar eventuais intervenções da Casa Branca, apostam os especialistas ouvidos pela Folha.

Um passo importante será a escolha do sucessor de Comey, processo iniciado no fim de semana, com a entrevista de pelo menos oito possíveis nomes para ocupar o posto. Segundo Trump, seu indicado para novo diretor do FBI pode ser anunciado ainda nesta semana.

A desconfiança gerada pela demissão, contudo, já pode ser vista em números. Uma pesquisa Wall Street Journal/NBC News divulgada neste domingo (14) mostra que 46% dos americanos acreditam que o real motivo de Trump ao demitir Comey foi frear a investigação sobre a Rússia, contra 36% que não acham que esse foi seu objetivo e 18% que preferiram não opinar.

Só 38% assume como verdade a justificativa oficial -de que Comey caiu pela forma com que conduziu a investigação sobre o uso indevido de e-mails pela ex-secretária de Estado Hillary Clinton. Além disso, mais americanos (38%) desaprovaram a decisão de Trump de demitir Comey do que apoiaram (29%).

"Acredito que muitos funcionários do FBI perceberam com uma forma de insultar não só Comey como o bureau, Mas ninguém ficará com medo de ser punido por fazer seu trabalho", afirma o ex-agente Ron Hosko, hoje presidente da organização Law Enforcement Legal Defense Fund.

Para o historiador Douglas Charles, especialista em FBI da Universidade Estadual da Pensilvânia, apesar de a demissão de Comey ser "uma clara mensagem para que a investigação da Rússia seja freada", os agentes devem reagir de forma contrária, evitando que essa apuração seja afetada.

"O FBI pode começar a vazar informações pertinentes à imprensa e a membros do congresso [como resposta]", diz Charles. "E também me parece que a reação política negativa à decisão de Trump vai dificultar qualquer possível tentativa de parar a investigação."

Rhodri Jeffreys-Jones, autor de "A História do FBI" (2007), vai além, sugerindo que as contradições sobre o processo que levou à queda de Comey podem se tornar um obstáculo ainda maior para Trump do que era o diretor.

"Se, agora, o FBI identificar que não há ligação entre a equipe de Trump e a Rússia, é possível que ninguém acredite, uma vez que há tanta suspeita no ar", diz o especialista, autor também de "We Know All About You: The Story of Surveillance in Britain and America" ("Sabemos tudo sobre você: a história da vigilância no Reino Unido e nos EUA", 2017).

Spencer Platt/Getty Images/AFP
NEW YORK, NY - MAY 10: Protesters gather outside of Trump Tower a day after FBI Director James Comey was fired by President Donald Trump on May 10, 2017 in New York City. Comey was fired Trump only days after he requested more resources from the Justice Department for his bureau's investigation into collusion between the Trump campaign and the Russian government, Spencer Platt/Getty Images/AFP == FOR NEWSPAPERS, INTERNET, TELCOS & TELEVISION USE ONLY ==
Manifestantes se reúnem fora da Trump Tower um dia depois que o diretor do FBI, James Comey, foi demitido pelo presidente Donald Trump em 10 de maio de 2017, em Nova York

SUCESSÃO
Há um consenso de que o nome indicado por Trump para suceder Comey será o mais importante sinal de como o presidente está disposto a resolver a crise criada com a demissão do diretor.

No sábado, o secretário de Justiça, Jeff Sessions, e seu vice, Rod Rosenstein, entrevistaram oito possíveis sucessores, entre eles o atual diretor interino, Andrew McCabe, o juiz de apelação do Estado de Nova York Michael Garcia, o senador John Cornyn e o ex-deputado Mike Rogers.

O indicado terá que ser confirmado pelo Senado e deve enfrentar resistência da minoria democrata, segundo o líder Chuck Schumer.

Para Charles, a principal preocupação em relação ao próximo diretor é que ele seja independente e alheio à pressão da Casa Branca.

"Uma das razões pelas quais se instituiu o mandato de dez anos para os diretores do FBI é justamente para que eles não estivessem suscetíveis à pressão política de um presidente", diz. O novo diretor não terá, com isso, que se preocupar em "agradar" o presidente. A não ser que Trump sugira que pode demitir dois diretores do FBI em quatro anos.

Possíveis sucessores


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