Folha de S. Paulo


Adversário conservador do papa se envolveu em polêmicas

Estrela do tradicionalismo católico, o cardeal Raymond Burke firmou-se como o mais visível adversário de Francisco na estrutura da Igreja Católica a partir de 2014.

Burke destacou-se em debates como voz contrária a mudanças na doutrina estabelecida durante o primeiro de dois sínodos (encontros dos bispos católicos) para discutir a família. O cardeal afirmou ainda que alguns fiéis percebiam a igreja como uma "nau sem leme".

Americano, Burke ascendeu sob o papado conservador de Bento 16 (2005-2013), que em 2008 o colocou na poderosa chefia do Tribunal Supremo da igreja e, em 2010, o tornou cardeal. Francisco retaliou e, em 2014, ele foi removido do tribunal, virando então patrono da Ordem de Malta, um cargo cerimonial.

Quando os sínodos geraram ao fim a exortação apostólica "Amoris Laetitia" ("A Alegria do Amor"), em abril de 2016, o cardeal ressurgiu.

Com três cardeais aposentados, enviou documento a Francisco com cinco questionamentos. A principal pergunta era se divorciados poderiam comungar se morassem com outra pessoa.

Texto de João Paulo 2º, de 1981, estabelecia que sim, mas com condições como a exigência da castidade do casal. A "Amoris Laetitia" sugere relaxamento caso a caso. As outras questões giravam sobre a possibilidade de relativizar o mal e sobre situações de pecado mortal.

De todo modo, a "Amoris" avançou menos do que alguns progressistas gostariam, vetando métodos contraceptivos, por exemplo.

Sem resposta, as perguntas foram tornadas públicas em novembro. Burke sugeriu que o papa deveria ser "corrigido formalmente", sendo criticado por aliados de Francisco. Até aqui, o papa só disse que há pessoas que só veem em "preto ou branco".

No mês seguinte, Burke voltou ao olho do furacão. Um figurão da Ordem de Malta, Albrecht von Boeselager, havia liberado a distribuição de camisinhas por uma ação social da entidade por um tempo, para não interromper o assistencialismo em países pobres.

O grão-mestre da ordem, Matthew Festing, o convocou para uma reunião com Burke em 6 de dezembro. Como contou à Folha, o patrono defendeu a demissão.

O papa determinou então algo inédito, uma intervenção na ordem, que existe desde o século 11. Abriu uma investigação sobre as condições da demissão e pediu para que Festing deixasse o cargo no começo deste ano. Seu sucessor já discutiu com Burke.

Quando cartazes criticando Francisco pela ação na ordem surgiram em Roma, em fevereiro, ficou evidente que o pontífice pode até ganhar a guerra com os conservadores, mas ainda há muitas batalhas pela frente.


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