Folha de S. Paulo


ANÁLISE

Voto na França pode dar fim a ciclo social-democrata europeu

O primeiro turno das eleições ficará na história como o atestado de óbito do Partido Socialista francês. A porcentagem de 6% de votos de seu candidato, Benoît Hamon, tem como efeito imediato uma implosão da social-democracia francesa.

O grupo se reorganizará em torno da extrema esquerda de Jean-Luc Mélenchon e do centrista Emmanuel Macron. Se o colapso do Partido Trabalhista britânico se confirmar nas eleições de junho, os próximos meses poderão encerrar o ciclo das sociais-democracias europeias iniciado na Segunda Guerra Mundial.

A vitória de Macron é resultado da sua ousadia em armar uma candidatura sem partido, mas também de um conjunto de circunstâncias totalmente imprevisível.

Primeiro o abandono de François Hollande, primeiro presidente a não tentar se reeleger. Depois o descalabro de François Fillon, candidato do Republicanos (centro-direita), atingido por escândalos.

Macron chegou ao segundo turno porque os outros fracassaram e agora tem pela frente a missão de salvar a República Francesa, o euro e a União Europeia de Le Pen.

Uma missão longe de ser impossível. Afinal, Le Pen teve um desempenho abaixo das expectativas e a sua reserva de votos para o segundo turno é bastante limitada.

Existe o risco de que parte do eleitorado de Fillon se disponha a votar nela. A declaração de apoio do conservador a Macron deve ajudar a atenuar a migração do seu eleitores para a candidata.

A principal ameaça à vitória de Macron é a abstenção. A exclusão dos dois principais partidos do segundo turno obrigará a classe política a se digladiar por um lugar ao lado do futuro presidente.

O espetáculo desmoralizante das divisões do Partido Socialista e da disputa interna do Republicanos agudizará o desgosto dos franceses pelos políticos e provocará, de quebra, o aumento da rejeição e do voto em Le Pen.

Nesse contexto, o principal desafio de Emmanuel Macron será mostrar aos seus eleitores que, depois de eleito, ele não verá seu governo ser canibalizado pelos que o atacaram até hoje.

MATHIAS DE ALENCASTRO é doutor em ciência política na Universidade Oxford

FRANÇA INDECISA - Quatro candidatos chegam ao dia do primeiro turno com chances de avançar ao segundo - EMMANUEL MACRON

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