Folha de S. Paulo


Garimpo de ouro improvisado deixa rastro de destruição no Zimbábue

Milhares de zimbabuanos desempregados voltaram-se à extração ilegal de ouro como saída para escapar da deterioração da economia nacional, deixando para trás um rastro de destruição que assusta agricultores, donos de plantações de árvores para extração de madeira e as autoridades ambientais do país.

Garimpeiros irregulares constroem minas improvisadas em terras agrícolas e plantações de árvores nas províncias do leste do Zimbábue, que fazem fronteira com o Moçambique, onde o ouro alcança um preço mais alto.

Zinyange Auntony - 3.mar.2017/AFP
Dois garimpeiros procuram ouro com um detector de metal no rio Ncema em Matabeland, no Zimbábue
Dois garimpeiros procuram ouro com um detector de metal no rio Ncema em Matabeland, no Zimbábue

Túneis profundos foram cavados sob estradas, ferrovias e construções na área de Kwekwe, na província de Midlands. Em algumas partes da província de Manicaland, rios e canais foram desviados e estradas foram destruídas.

Com a probabilidade de que o número de garimpeiros ilegais aumente, na medida em que a economia continua em baixa, e com o Estado deixando a reação aos garimpeiros a cargo dos proprietários das terras garimpadas, agricultores temem que suas terras sofram danos irreversíveis e que eles próprios corram o risco de perder seu meio de subsistência.

"Kwekwe está sendo assediada por garimpeiros ilegais, e alguns deles são muito violentos", disse à Thomson Reuters Foundation o morador local Jonas Dube. "Não sabemos o que fazer."

Simon Simango é garimpeiro ilegal em Chimanimani, província de Manicaland. Ele admitiu que as escavações estão tendo impacto negativo sobre o meio ambiente.

Mas, segundo ele, muitos trabalhadores não têm outra alternativa.

"O garimpo ilegal é nossa única fonte de subsistência. Não há empregos no país", ele disse à Thomson Reuters Foundation. "Vendemos a maior parte de nosso ouro aos compradores ilegais moçambicanos, que nos oferecem um preço muito bom."

Os garimpeiros informam que os compradores do Zimbábue pagam cerca de US$ 30 (R$ 93) por grama de ouro, enquanto os do Moçambique pagam o dobro, cerca de US$ 60 (R$ 186).

O Zimbábue nunca se recuperou plenamente da queda econômica que começou em 2000 com o confisco de milhares de fazendas de propriedade de brancos. O índice de desemprego chega a 80%, e mesmo as pessoas empregadas às vezes não recebem seus salários e sofrem falta aguda de dinheiro nos bolsos.

Não existem dados oficiais sobre o número de garimpeiros ilegais no Zimbábue.

Mas um relatório da Organização das Nações Unidas para o Desenvolvimento Industrial (Unido) estimou que entre 2007 e 2012, cerca de 500 mil garimpeiros ilegais e artesanais estavam operando no país.

Especialistas creem que esse número pode crescer à medida que a economia continua fraca.

"CHOCANTE"

Na Floresta de Tarka, uma fazenda de madeira no distrito de Chimanimani pertencente à Allied Timbers, mais de 600 hectares de madeira de alta qualidade foram danificados para dar lugar a garimpos ilegais, segundo executivos da empresa.

O ministro de assuntos provinciais de Manicaland, Mandi Chimene, disse em fevereiro que a extração ilegal de ouro na Floresta de Tarka alcançou níveis alarmantes, resultando na poluição de rios e destruição das árvores.

"O que está acontecendo na Floresta de Tarka é chocante", disse Chimene. "Nos perguntamos quem está se beneficiando do ouro ilegal, porque nosso país não está. Esse ouro não vai parar no mercado legal."

O governo diz que cabe aos proprietários de terras ou às empresas afetadas expulsar os garimpeiros ilegais de suas terras.

"Se é uma plantação de árvores, cabe às madeireiras despejar os garimpeiros ilegais", disse à Thomson Reuters Foundation o ministro das Minas e Desenvolvimento da Mineração, Walter Chidhakwa.

"Se uma área pertence a uma madeireira, o governo não pode legalizar a extração de ouro na região. As empresas precisam adotar medidas para acabar com o garimpo ilegal em suas plantações."

Ele disse que a mesma regra se aplica aos garimpeiros ilegais em terras agrícolas privadas.

Darlington Duwa, CEO da Federação de Produtores de Madeira, alertou sobre danos permanentes em consequência do desaparecimento de florestas e poluição de rios causados pelo garimpo ilegal.

"O garimpo ilegal reduz as fontes de madeira, com isso afetando o emprego direto e indireto, o desenvolvimento econômico e os ganhos em divisas, levando à degradação ambiental e resiliência menor aos efeitos das mudanças climáticas", disse Duwa à Thomson Reuters Foundation.

"Em algumas áreas, os garimpeiros ilegais arrancam árvores novas, plantadas há pouco tempo", disse Duwa. "Se continuarmos assim, o setor madeireiro vai sofrer prejuízos irreversíveis."

Tradução de CLARA ALLAIN


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