Folha de S. Paulo


Como Stephen Bannon ganhou milhões e ajudou Trump a vencer

Stephen Bannon estava implorando a seus ouvintes que assistissem ao filme recém-lançado "Clinton Cash" (Dinheiro dos Clinton). Ele mal conseguia concluir suas sentenças.

Era 20 de julho, na reta final da campanha presidencial de 2016, e Bannon estava descrevendo Bill e Hillary Clinton como "cafajestes" e "bandidos" que tinham faturado milhões de dólares graças a seus contatos políticos.

"Hillary e Bill Clinton são os dois maiores trapaceiros que já se candidataram à Presidência em toda a história dos Estados Unidos", disse Bannon a seu convidado Peter Schweizer, autor do livro no qual o
filme foi baseado.

Mike Theiler - 23.fev.2017/AFP
O estrategista-chefe da Casa Branca, Stephen Bannon, fala em conferência de conservadores em fevereiro
O estrategista-chefe da Casa Branca, Stephen Bannon, fala em conferência de conservadores em fevereiro

Bannon, que hoje é o estrategista chefe do presidente Donald Trump, apresentou seu programa de rádio nesse dia como um esforço urgente para divulgar informações importantes para os eleitores. Mas a verdade não se resumia a isso.

O programa de rádio e o filme "Clinton Cash" eram elementos em uma máquina multimídia complexa composta por organizações sem fins lucrativos e empresas privadas alavancadas por Bannon para beneficiar sua agenda populista conservadora e arrecadar milhões de dólares. Esse esforço acabou ajudando a conduzir Donald Trump à Casa Branca e levar Bannon a ganhar destaque nacional.

Um olhar mais atento sobre os bastidores da transmissão de rádio de Bannon naquele dia proporciona uma visão do funcionamento dessa máquina multimídia.

As pesquisas à base de "Clinton Cash" foram financiadas pelo Government Accountability Institute (GAI), organização pública sem fins lucrativos, isenta da obrigação de pagar impostos, criada por Bannon alguns anos antes e que, conforme mostram documentos, havia pago centenas de milhares de dólares a ele em sua condição de presidente executivo dela.

"Clinton Cash" foi produzido pela Glittering Steel e a Bannon Film Industries, duas empresas pertencentes a Bannon, também um dos roteiristas do filme.

Bannon era também proprietário da ARC Entertainment, a distribuidora do filme.

E ele estava recebendo um salário de seis algarismos como presidente executivo da emissora Breitbart News, que divulgou o filme intensivamente através de seu próprio site controverso e do programa de rádio de Bannon.

É impossível saber quantos membros do público do programa entenderam todas essas conexões. Muitas destas ligações estão espalhadas por documentos de empresas, judiciais e tributários, além de um relatório de informações financeiras de 2016 divulgado pela Casa Branca na semana passada.

Na transmissão de rádio em julho, Bannon apenas deu alguns indícios dessas ligações todas, dizendo: "Agora vamos exibir este filme para o mundo inteiro ver, a partir deste fim de semana".

Uma investigação do "Washington Post" revelou que Steve Bannon pôde produzir mais de uma dúzia de documentários conservadores nos últimos dez anos, lançando mão de uma rede de duas dúzias de organizações sem fins lucrativos e empresas particulares. Bannon ajudou a organizar doações de republicanos ricos às organizações sem fins lucrativos que lhe pagavam por filmes e outros trabalhos, mostram os documentos. Ao mesmo tempo, Bannon e suas firmas receberam pelo menos US$2 milhões das organizações sem fins lucrativos e outros US$5 milhões das empresas privadas.

Bannon, que já tinha ganhado milhões de dólares em Wall Street, muitas vezes recebia de múltiplas fontes por cada projeto -uma prática comum em Hollywood, onde trabalhara como financista de entretenimento. Pelo fato de ser pago por meio de empresas privadas e de entidades sem fins lucrativos, que têm obrigação apenas limitada de divulgar detalhes sobre suas atividades, os valores totais pagos a Bannon não são conhecidos.

Em um relatório financeiro pessoal divulgado pela Casa Branca na semana passada, Bannon divulgou sua fortuna líquida como sendo deUS$11,8 milhões a US$53,8 milhões.

Bannon, a Casa Branca e Peter Schweizer não responderam a reiterados pedidos de declarações.

Especialistas tributaristas disseram ao "Washington Post" que algumas das atividades de Bannon deixam dúvidas no ar em relação à sua obediência às restrições impostas pela Receita americana ao uso de entidades beneficentes, isentas de pagar impostos, para atacar um candidato político ou para auferir benefícios financeiros pessoais excessivos.

"A impressão que se tem é que um grupo coeso de amigos e aliados políticos colabou para prover benefícios, em especial a Stephen Bannon", disse David Nelson, especialista em organizações sem fins lucrativos e ex-sócio tributarista na firma de auditoria contábil Ersnt & Young, que estudou os registros dos vínculos complexos entre Bannon e as entidades sem fins lucrativos.

O emprego incorreto de entidades desse tipo para finalidades financeiras e políticas se generalizou, mas essas transgressões raramente resultam em sanções importantes, segundo especialistas consultados pelo "Post".

"O sistema dessas entidades está sendo manipulado para fins impróprios", comentou Paul Streckfus, ex-advogado tributarista da Receita americana e editor da "EO Tax Journal". "É uma farsa."

Em entrevista ao "Washington Post", David Bossie, que comanda duas organizações sem fins lucrativos que colaboraram com Bannon em alguns dos filmes deste, teceu elogios a Bannon.

"Damos apoio total a Steve Bannon e a nossos produtos. Temos grande orgulho de todos nossos filmes", falou Bossie, presidente da entidade sem fins lucrativos Citizens United e da fundação filiada a ela. "A Primeira Emenda constitucional é uma coisa maravilhosa."

Bannon, 63 anos, acumulou milhões de dólares entre a década de 1980 e os anos 2000 como financista em Wall Street e Hollywood, onde mergulhou fundo nas nuances da produção e distribuição de filmes.

Ele tinha talento para criar filmes e era capaz de isolar-se por dias ou semanas para redigir roteiros ou propostas de filmes, contaram antigos colegas seus. Aproveitando o que aprendera em Nova York e Hollywood, Bannon recebia honorários altos de consultoria de empresas ao mesmo tempo em que atuava como assessor em tempo parcial em trabalhos financeiros e criativos.

Em 2004 ele produziu um documentário de teor político, "In the Face of Evil: Reagan's War in Word and Deed" (Enfrentando o mal: a guerra de Reagan com palavras e atos), baseado em um livro de Peter Schweizer sobre o 40º presidente americano. Durante a divulgação do filme, Bannon conheceu um astro em ascensão da mídia conservadora chamado Andrew Breitbart.

Porém, mais importante para a carreira de Bannon como autor de documentários movidos por uma agenda política foi David Bossie, que se lançou como ativista e investigador político fazendo oposição a Bill Clinton e seus aliados democratas. Bossie passara um período polêmico como investigador chefe do Comitê da Câmara dos Deputados para a Reforma e Fiscalização do Governo, sob a direção do deputado republicano Dan Burton, do Indiana.

Em meados dos anos 2000, Bossie era presidente da entidade conservadora isenta de impostos Citizens United, cuja missão era informar ao público sobre a importância de "uma defesa nacional forte, um governo constitucionalmente limitado, a economia de mercado, a crença em Deus e nos valores judaico-cristãos, e o reconhecimento da família como a unidade social fundamental de nossa sociedade".

Na época, Bannon era presidente do conselho de uma distribuidora de mídia de Los Angeles chamada Genius Products, voltada à distribuição de filmes independentes.

"Steve gostava realmente da ideia de ajudar os pequenos cineastas independentes" que não ganhavam a atenção de distribuidoras maiores, disse ao "Post" em entrevista o executivo-chefe da Genius, Trevor Drinkwater.

Tanto Bossie quanto Bannon estavam interessados em usar o cinema para divulgar uma mensagem conservadora. Ambos queriam reproduzir o que o ativista liberal Michael Moore havia feito dois anos antes com "Fahrenheit 11 de setembro", em que arrasou o presidente George W. Bush.

"Queríamos transmitir uma mensagem", disse Bossie ao "Post".

Em 2006 Bossie idealizou um filme, a ser intitulado "Border War: The Battle Over Illegal Immigration" (Guerra na fronteira: a batalha em torno da imigração ilegal), que levaria o espectador dentro dos túneis sob a fronteira americana usados no tráfico de pessoas e drogas. Bossie concordou em usar a Genius, sua empresa então recém-fundada, para distribuir o filme em DVD.

Foi o início de um relacionamento lucrativo e cada vez mais influente que nos dez anos seguintes o ajudariam a ascender nas fileiras conservadoras -e a aumentar a fortuna acumulada por Stephen Bannon em Wall Street e Hollywood. Segundo documentos do divórcio apresentados em 2008 por sua terceira esposa, Bannon possuía bens no valor de US$41 milhões.

Documentos da empresa mostram que a Genius, empresa de capital aberto, começou pagando à consultoria de Bannon, a Bannon Strategic Advisors, US$250 mil por ano. Drinkwater disse que Bannon prestava assessoria a empresas e tinha vínculos com administradores de hedge funds e bancos de investimentos. "Ele tinha contatos fantásticos em toda parte. Acho que não havia ninguém com quem não conseguisse marcar uma reunião", disse Drinkwater.

Ao mesmo tempo em que a Genius passava por dificuldades financeiras, Bannon continuou a receber seus honorários -cerca de US$1,5 milhão ao longo de cinco anos, conforme revelam documentos oficiais. Em maio de 2008 a Genius, em documento enviado ao Comitê de Valores Mobiliários (SEC), disse: "Temos um histórico de prejuízos importante e é possível que nunca consigamos alcançar ou manter a rentabilidade". A empresa acabou indo à falência.

Em 2010, Bannon e Drinkwater lançaram uma distribuidora de cinema sediada em Santa Monica, Califórnia, e chamada ARC Entertainment. Ao mesmo tempo Bannon mergulhava de cabeça em sua carreira secundária de criador de documentários políticos.

Era uma época fértil para a criação de filmes conservadores. As eleições parlamentares se aproximavam, o movimento Tea Party estava se formando em oposição ao presidente Barack Obama, e os conservadores radicais se viam como estando em guerra com um governo federal que, para eles, queria impor ao país um socialismo destituído de Deus.

Em janeiro de 2010 a Suprema Corte votou por cinco a quatro votos em favor da Citizens United em um processo que durou dois anos e no qual a entidade beneficente contestava regras eleitorais que a proibiram de gastar dinheiro para promover um documentário contra os Clinton durante a temporada das eleições primárias de 2008. A decisão autorizou novas formas de gastos políticos ilimitados por parte de organizações como a Citizens United -uma brecha que foi aproveitada de imediato por megadoadores da direita que faziam oposição ao governo Obama.

Quando a Citizens United decidiu produzir mais filmes, Bossie procurou Stephen Bannon para escrever roteiros, dirigir e produzir para a Citizens United Productions, empresa com fins lucrativos lançada pela ONG e por um investidor anônimo cuja identidade Bossie se negou a revelar.

Documentos tributários aos quais o "Washington Post" teve acesso mostram que a Citizens United investiu centenas de milhares de dólares no primeiro filme, "Generation Zero", do qual Bossie foi co-produtor.

O filme se debruçou sobre a crise financeira global que começara em 2008. Tinha todas as características de uma produção de Bannon: edição com cortes ágeis. Música tenebrosa. Imagens de tornados e explosões nucleares para simbolizar a destruição provocada pelo derretimento de Wall Street. Imagens de hippies praticando amor livre, para sugerir que a culpa do que acontecera era da esquerda política.
Falando de Bannon, Bossie comentou: "Ele é um cineasta incrivelmente visionário, alguém que lê extensamente e mergulha fundo em seus temas. É um roteirista e diretor brilhante."

Os filmes tinham orçamentos restritos, e os custos eram mantidos baixos com a utilização de imagens de arquivo e comentários de figuras republicanas destacadas. Os documentos públicos não deixam claro que parcela dos honorários pagos a Stephen Bannon ou suas empresas foi gasta com custos de produção ou gerais.

Em 2010 Bannon fez os dois filmes seguintes, "Battle for America", uma crítica acirrada da administração Obama e do governo grande, e "Fire from the Heartland", sobre a ascensão das mulheres no movimento conservador. A Citizens United Foundation Productions gastou US$1,7 milhão nesse ano com a produção e distribuição do que descreveu como "documentários educativos", enquanto a Citizens United gastou US$1,9 milhão com a produção de filmes, segundo documentos financeiros.

No mesmo ano, a carreira de cineasta de Steve Bannon recebeu um impulso de outra organização beneficente isenta da obrigação de pagar impostos.

A Young America's Foundation, no norte da Virgínia, contratou a Bannon Film Industries para começar a trabalhar sobre pelo menos três filmes, pagando à empresa quase US$578 mil entre 2010 e 2012, segundo documentos do fisco. Entre eles estavam dois documentários feitos para o Reagan Ranch, em Santa Barbara, Califórnia, administrado pela fundação, e o curta-metragem de 29 minutos "The Conservatives", cuja finalidade era inspirar lideranças estudantis conservadoras em universidades.

Em seu site na internet, a fundação se descreve como "a principal organização do movimento conservador para entrar em contato com a comunidade mais ampla". Ela era liderada por um ativista conservador, Ronald Robinson, que também integra os conselhos de direção da Citizens United e da Citizens United Foundation.

Movido por um manancial de ideias e energia transbordante, Bannon estava se tornando um dos líderes da vanguarda conservadora insurgente. "Acho que ele trabalhou sobre muitas coisas simultaneamente", disse Drinkwater. "Essa é sua personalidade. Ele não deve dormir mais que três horas por noite e deve ser capaz de fazer várias coisas bem ao mesmo tempo."

Além dos honorários que recebia por escrever, dirigir e produzir filmes, Bannon estava ganhando US$22.500 mensais, ou US$270 mil ao ano, em honorários de consultoria da ARC Entertainment, sua empresa de distribuição de filmes. A informação está contida em um pedido de aluguel residencial assinado em 2013 por Bannon e ao qual o "Washington Post" teve acesso.

Kirk Wickstrom, executivo financeiro chefe da ARC Entertainment entre 2010 e 2013, disse que Bannon era o único membro do conselho da empresa e exercia um papel de assessoria. "Ele não era muito presente na prática", disse Wickstrom. "Não o usávamos muito; geralmente, quando os detalhes chegavam, ele dava uma olhada."

Em 2011 Bannon decidiu fazer um filme sobre Sarah Palin, a queridinha do Tea Party e suposta candidata presidencial, a ser intitulado "The Undefeated" (A invicta).

Segundo um colega que exigiu anonimato para falar porque não queria ganhar exposição nacional, Bannon tinha formulado um conjunto de princípios para os filmes que criava. Os filmes seriam movidos por "conteúdos de orientação masculina, movidos a testosterona e de orientação espiritual". E Bannon "jamais investiria seu próprio dinheiro em qualquer projeto".

A produtora do filme sobre Palin era uma empresa de Tallahassee, na Flórida, formada por Bannon com alguns outros investidores em 2010. Bannon disse a alguns dos investidores que estava tratando "The Undefeated" como empreendimento com fins lucrativos e que esperava retornos sólidos. O filme seria distribuído pela empresa de Bannon ARC Entertainment.

Apesar do otimismo de Bannon, o filme fracassou nas bilheterias depois de Sarah Palin ter desistido de ser candidata à Casa Branca.

Em 2011 Bannon fechou uma aliança com a rica família Mercer, em Nova York.

Robert Mercer era um bilionário investidor em fundos hedge que estava a caminho de tornar-se um dos doadores políticos conservadorees mais generosos do país.

Ele e sua filha Rebekah Mercer comandavam a Mercer Family Foundation, fonte crescente de recursos para causas conservadoras, com ativos de quase US$38 milhões em 2012. A fundação começou a procurar a assessoria política de Bannon.

Este redigiu para a família um plano financeiro que previa que ela investisse US$10 milhões na então nascente Breitbart News, comandada por Andrew Breitbart, amigo de Bannon, segundo a revista "New Yorker". Bannon entrou para o conselho de direção do site de jornalismo. Documentos indicam que dinheiro da fundação da família Mercer começou a chegar a algumas das mesmas ONGs que haviam financiado os filmes e outros trabalhos de Bannon.

Em 2012 a fundação Mercer doou US$2 milhões à Citizens United Foundation, sem fins lucrativos, que então deu US$300 mil a uma das firmas de consultoria de Bannon, a título de "honorário por levantamento de fundos", segundo documentos da Receita.

Os Estados de Nova York e outros exigem que pessoas físicas ou jurídicas que levantem fundos para organizações sem fins lucrativos se cadastrem junto ao Estado. Autoridades estaduais disseram ao "Post" que a firma de Bannon não estava cadastrada em Nova York na época.

Indagado sobre o honorário, Bossie, presidente tanto da Citizens United quanto da fundação desta, descreveu o rótulo de "levantamento de fundos" como erro administrativo. Ele disse que, na realidade, o pagamento dizia respeito à consultoria de cinema dada por Bannon. Em comunicado, Bossie disse que o honorário "não guarda relação material com os assuntos financeiros da organização e, em vista do tempo transcorrido desde então, não justifica que seja pedida uma correção" na declaração de renda do grupo.

Uma auditoria da Citizens United Foundation realizada nesse ano parece contradizer Bossie. São listados gastos de US$301.200 com levantamento de fundos, segundo cópia do documento examinada pelo "Post".

Quando o "Post" indagou sobre a discrepância, a Procuradoria do Estado de Nova York, na semana passada, enviou cartas à Citizens United e à empresa de consultoria de Bannon, pedindo esclarecimentos.
Bannon receberia mais US$150 mil em honorários depois de a fundação Mercer ter doado US$1 milhão à fundação Citizens United, em 2013. Em sua declaração anual de renda relativa a esse ano, a Citizens United descreveu os US$150 mil como pagamento por consultoria cinematográfica e levantamento de fundos, e os auditores identificaram US$150 mil como o valor que o grupo gastou com levantamento de fundos.

Bannon recebeu mais dinheiro por novos documentários políticos. Trabalhando com a Citizens United, ele escreveu, dirigiu e produziu "The Hope & The Change", uma análise dos democratas insatisfeitos com Obama, e "Occupy Unmasked", um ataque à esquerda política e aos manifestantes contra Wall Street.

No mesmo ano, Bannon colaborou com uma entidade beneficente conservadora, a Judicial Watch, na criação de um filme intitulado "District of Corruption", uma crítica à administração Obama e ao dinheiro recebido em Washington. A Judicial Watch, que se descreve como organização de responsabilização e fiscalização, pagou US$382.143 ao Victory Film Project, de Bannon, conforme revelam documentos.

Em março de 2012 Bannon formou sua própria organização sem fins lucrativos, o GAI. Em documentos enviados à Receita para pedir status de isenção de impostos para a entidade, ele disse que o GAI atuaria como "entidade beneficente educativa" para promover a "liberdade econômica" e expor a corrupção.

Esses grupos são conhecidos como entidades beneficentes 501 (C), uma referência à seção do código tributário em que se enquadram.

O GAI tinha sede em Tallahassee. Bannon era seu chairman e diretor executivo, recebendo estimados US$100 mil ao ano, revelam documentos. Seu colega Peter Schweizer era presidente e ganhava estimados US$200 mil. Robinson, citado como diretor do GAI, não era pago, revela o documento.

Bannon, Schweizer e Robinson estão ligados por meio de organizações sem fins lucrativos e trabalho na criação de filmes. Bannon e Schweizer tinham feito juntos o filme sobre o presidente Ronald Reagan, em 2004; mais recentemente, tinham sido colegas no Breitbart News. Schweizer integrava o conselho da Young America's Foundation, de Robinson, que em 2010 pagou US$404.904 a Bannon para produzir filmes e em 2012 lhe pagaria quase US$173 mil.

No documento em que pedia isenção de impostos para o GAI, Bannon assinou declarações, sob pena de cometer o delito de prestar depoimento falso em juízo, atestando repetidas vezes que nenhum deles "tem relações familiares ou comerciais com outras pessoas envolvidas no GAI".

Uma porta-voz do GAI disse ao "Washington Post" que as relações entre Bannon, Schweizer e Robinson foram divulgadas mais tarde no relatório anual do grupo à Receita -enviado em novembro de 2013, nove meses depois de aprovado o status de isento de impostos da entidade.

Organizações beneficentes também têm a obrigação de revelar relacionamentos comerciais entre seus diretores em seus pedidos iniciais de isenção de impostos, para que a Receita possa avaliar se a organização está sendo formada para finalidades públicas de fato.

Robinson disse ao "Post" que não viu o documento enviado à Receita.

"Desconheço a definição de 'relacionamento comercial'", ele disse. "É uma questão a ser discutida com quem redigiu o documento."

O GAI teria apenas um punhado de doadores nos anos seguintes. Sua primeira injeção de dinheiro, US$2 milhões, veio de outra entidade conservadora beneficente.

A fundação da Família Mercer e o Donor's Trust, grupo conservador sem fins lucrativos ligado aos ricos irmãos Koch, doariam mais de US$7 milhões ao GAI nos três anos seguintes, revelam documentos.
Uma porta-voz do GAI disse ao "Post" anteriormente que a organização "sempre obedeceu totalmente todas as regras que regem as entidades 501".

Ela disse também que a organização "tem um histórico bipartidário de trabalhar com importantes unidades investigativas na mídia sobre reportagens premiadas".

Na manhã de 19 de maio de 2012, no mesmo dia em que a Receita americana deferiu o pedido da GAI, Stephen Bannon assumiu mais um papel de liderança: foi nomeado presidente executivo do Breibart News, preenchendo o vácuo deixado pela morte inesperada de Andrew Breitbart no mesmo mês.

Wickstrom, o executivo financeiro chefe da ARC Entertainment, contou que estava com Bannon em viagem de negócios a Nova York quando Bannon recebeu um telefonema informando-o da morte de Breitbart. Ele contou que Bannon passou o resto do dia ao telefone. "Ele se sentia muito responsável pelo Breitbart News."

Bannon imediatamente começou a ampliar o alcance do Breitbart News, ao mesmo tempo em que trabalhava com Schweizer e outros para inserir o GAI no mapa político e jornalístico.

Em fevereiro de 2013, Bannon disse em um pedido de aluguel de imóvel que o site Breitbart News, financiado pela fundação Mercer, lhe pagava US$62.500 ao mês, o equivalente a US$750 mil ao ano. Ele informou também que recebeu US$377 mil do GAI entre 2012 e 2015 para trabalhar em média 30 horas por semana.

Em 2014 e 2015, Bannon assumiu cargos pagos adicionais em duas empresas financiadas pela fundação Mercer que estavam se posicionando para desempenhar um papel na eleição presidencial de 2016.
Bannon tornou-se vice-presidente da Cambridge Analytica, uma empresa de ciência de dados, em junho de 2014. Com Rebekah Mercer, ele co-fundou outra produtora de filmes chamada Glittering Steel LLC e tornou-se seu presidente.

Ao mesmo tempo, ele comandava a operação noticiosa 24 horas por dia do Breitbart News e apresentava um programa de rádio. Bannon frequentemente divulgava o trabalho do GAI e convidava funcionários da entidade para participar de seu programa. Como presidente do GAI, ele aprovou gastos de mais de US$200 mil em anúncios no site do Breitbart News, segundo informes enviados à Receita pela entidade beneficente.

Bannon também mantinha ligações com Bossie a partir da Citizens United e frequentemente convidava Bossie para falar em seu programa de rádio do Breitbart News. Em 2015 o GAI doou US$125 mil à Citizens United Foundation, rotulando a doação como "assistência pública geral".

A Citizens United e a Glittering Steel, de Bannon, produziram o filme de 2016 de Bannon "Torchbearer", com Phil Robertson, da série de TV-realidade "Duck Dynasty". O Breitbart News descreveu o filme como "um chamado inequívoco aos cristãos e pessoas de fé na América a se engajarem com sua cultura antes que seja tarde demais".

Os esforços da rede de Bannon culminaram com o lançamento de "Clinton Cash", o livro escrito por Schweizer com informações colhidas pelos pesquisadores do GAI. Bannon, Schweizer e outros converteram o livro em filme com a ajuda da Glittering Steel, que em 2016 pagou US$167.500 a Bannon, como mostram documentos.

Bannon divulgou o filme no período que antecedeu a eleição presidencial. Ele convidou Schweizer a seu programa de rádio no dia 29 de abril de 2016 para falar dos Clinton.

"Qual é o segredo da classe política permanente e como ela rouba do público que ouve este programa e lê o Breitbart todos os dias?", perguntou Bannon.

Schweizer respondeu: "Este filme e 'Clinton Cash'... não é um livro sobre coisas que estão acontecendo no âmbito abstrato. É sobre como uma classe de líderes políticos, encarnados pelos Clinton, está sistematicamente traindo os interesses do país para seu lucro pessoal."

No dia 20 de julho de 2016, quando a campanha eleitoral estava se intensificando, Bannon chamou Schweizer novamente para o programa de rádio do Breitbart News na rádio SiriusXM, transmitido da Convenção Nacional Republicana em Cleveland.

"Esse pessoal é corrupto", disse Bannon. "É corrupto de ponta a ponta."

Menos de um mês mais tarde, Stephen Bannon se tornou o executivo-chefe da campanha de Donald Trump. David Bossie, da Citizens United, entrou como seu vice.

Tradução CLARA ALLAIN


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