Folha de S. Paulo


Sou otimista na relação da Argentina com o governo de Trump, diz Macri

O presidente argentino Mauricio Macri recebeu na tarde desta segunda (6) um grupo de jornalistas brasileiros para tratar de seu encontro nesta terça-feira (7) em Brasília, com seu colega brasileiro, Michel Temer. "Espero ratificar a importância da relação com esse sócio tão importante."

Porém, manifestou preocupação com o deficit na relação comercial com o país vizinho, hoje de US$ 4,3 bilhões. "Hoje temos esse problema na relação comercial com o Brasil, que é o deficit, que precisamos melhorar, e mais de 80% dele está relacionado à indústria automotiva."

Eitan Abramovich - 17.jan.2017/AFP
O presidente da Argentina, Mauricio Macri, concede entrevista coletiva em janeiro na Casa Rosada
O presidente da Argentina, Mauricio Macri, concede entrevista coletiva em janeiro na Casa Rosada

Macri acredita que sejam necessários ajustes na integração da produção, além de parar de comprar autopeças de países europeus. E, principalmente, quer escutar o que o Brasil tem a propor sobre o assunto.

"Já fomos muito flexíveis. Para ajudar o Brasil nesse momento de recessão, continuamos comprando carros."

Sobre as reclamações que setores do empresariado brasileiro fazem sobre o fato de ainda enfrentarem travas para exportar para a Argentina, disse que "uns me dizem que vai bem, outros que tem dificuldade, então fico confundido", disse, rindo. "Mas estamos indo ao Brasil justamente para que essas coisas fiquem claras".

Questionado se havia considerado a hipótese de ter sido convidado por Temer para ajudar a melhorar sua imagem —Macri está com 45% de aprovação, enquanto a de Temer ronda os 9% o argentino respondeu que isso era "uma especulação". Depois, porém, afirmou que não via problema com a repercussão que a visita pudesse ter no Brasil, "são questões internas".

Pouco antes de receber os jornalistas, Macri havia falado ao telefone com seu colega mexicano, Enrique Peña Nieto. "Eu perguntei a ele como andavam as coisas, ofereci o afeto e o apoio dos argentinos. Ele me disse que estava trabalhando na renegociação dos acordos com os EUA."

Perguntado sobre a posição dos outros países latino-americanos, que não se pronunciaram ainda de forma mais contundente com relação às hostilidades do governo Donald Trump ao México, Macri disse que seu país ainda está ªobservando atentamenteº as ações do novo mandatário dos EUA.

"Sou otimista. Quando conversei com Trump, ele ratificou que quer trabalhar com a Argentina e que somos um sócio importante."

Porém, admitiu que, se Trump apostar numa política mais protecionista, isso pode causar problemas a toda a região.

"Eu acredito que o futuro passa por uma maior integração com o mundo. Brasil e Argentina vêm de experiências recentes de estarem fechados e isso nos levou a estancar o crescimento. Agora, se os EUA se fecham, isso terá um peso muito importante. Mas temos que esperar mais um pouco, para ver se a política que Trump adota é a mesma do discurso que vem tendo."

Macri disse que, mesmo com as preocupações geradas com Trump, a situação no mundo traz mais oportunidades à América Latina. "É positivo que estejamos afastados das regiões com problemas mais sérios no mundo."

ODEBRECHT

Sobre as delações da Odebrecht, o presidente disse esperar que o Brasil entregue a lista dos nomes dos envolvidos na Argentina —que, segundo o Departamento de Justiça dos EUA, teriam recebido US$ 35 milhões— para estudar providências.

E continuou a defender Gustavo Arribas, chefe do serviço de inteligência do governo, que teria sido mencionado na delação do operador Leonardo Meirelles. "Estou tranquilo, Arribas não tem relação com a Odebrecht e acredito no que ele disse."

Porém, o funcionário mencionado, que é amigo pessoal de Macri, tem oferecido versões contraditórias sobre o dinheiro que teria recebido por meio do operador brasileiro.

Primeiro, disse se relacionar com a venda de um apartamento em São Paulo; depois, mudou a versão para dizer que, na verdade, se tratava de "objetos que estavam dentro do apartamento", no valor de US$ 70 mil.

AUMENTOS

O presidente negou que os aumentos de tarifas que têm sido feitos na Argentina sejam muito duros para a população. "São graduais porque passamos mais de dez anos dando energia de graça [referindo-se aos subsídios do kirchnerismo] e, mesmo aumentando bastante agora, ainda pagamos a metade do que se paga no Brasil e no Chile."

Sobre a má repercussão internacional que teve a saída do governo de seu ex-ministro da Fazenda, Alfonso Prat-Gay, Macri disse ser uma pessoa que dá importância ao trabalho em equipe.

"E às vezes há gente que tem muitas qualidades, mas não funciona como uma equipe. A saída de Prat-Gay tem a ver com isso. Acontecia também na época [em que era presidente] do Boca Juniors. Sempre trabalhei assim."

Perguntado sobre o fato de a Argentina não ter podido recuperar o crescimento em 2016, como o prometido na campanha presidencial, Macri disse que precisa de mais tempo.

"Do momento em que um investidor decide investir até que se obtenha algo, demora um tempo, há uma fase de estudos, de avaliações. Tenho certeza de que neste ano vamos colher o que plantamos no ano passado."

TRÁFICO DE DROGAS

Questionado se suas medidas de linha-dura para o combate ao tráfico de drogas não iam contra a tendência de alguns países de debater a legalização, Macri disse que "a Argentina ainda está em um estágio primitivo" por ter deixado o problema crescer nos últimos anos.

"Precisamos fortalecer as fronteiras, saber melhor quem entra e quem sai, e trabalhar com a inteligência de outros países para depois pensar em avaliar a experiencia de quem já deu passos nesse sentido, como Uruguai, Portugal e Holanda."


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