Folha de S. Paulo


Trump demite secretária de Justiça por desafiar decreto contra imigrantes

O presidente dos EUA, Donald Trump, demitiu na noite desta segunda (30) a secretária interina de Justiça, Sally Yates, depois de ela declarar que o Departamento de Justiça não defenderia a decisão de proibir a entrada nos EUA de refugiados e de cidadãos de sete países de maioria muçulmana.

O cargo de secretário de Justiça nos EUA reúne funções que, no Brasil, são divididas entre o ministro da Justiça e o procurador-geral da República.

Yates provocou uma crise institucional ao enviar uma carta aos advogados do Departamento de Justiça com sérias dúvidas sobre a legalidade e a moralidade do decreto assinado por Trump na sexta-feira (27).

"No momento, não estou convencida de que a defesa do decreto seja consistente com essas responsabilidades, nem de que o decreto seja legal", escreveu Yates aos subordinados.

O episódio ecoa a crise conhecida como "Massacre da Noite de Sábado" do governo Richard Nixon. Em 20 de outubro de 1973, em meio às investigações do escândalo de Watergate, o presidente republicano pediu ao então secretário de Justiça Elliot Richardson que demitisse o promotor especial apontado para o caso, Archibald Cox, para tentar frear as investigações. Richardson se recusou e entregou sua renúncia ao cargo —o mesmo ocorreu com seu vice. Pressionado pelo escândalo dos grampos na sede do Partido Democrata, Nixon renunciou à Presidência em 1974.

Yates estava à frente do Departamento de Justiça desde a renúncia de Loretta Lynch, ao fim do governo Obama, no dia 20, e permaneceria no cargo até a confirmação pelo Senado de Jeff Sessions, indicado por Trump para chefiar a pasta.

'TRAIÇÃO'

Em uma nota oficial de tom agressivo, a Casa Branca afirma que "a secretária interina de Justiça, Sally Yates, traiu o Departamento de Justiça ao se recusar a garantir a aplicação da ordem legal designada para proteger cidadãos dos Estados Unidos."

"O presidente Trump substituiu Yates de suas funções e designou Dana Boente, procurador da Virgínia, para servir como procuradora-geral interina até que o senador Jeff Sessions seja confirmado [no cargo pelo Senado."

A nomeação de Sessions, que defende uma política linha-dura contra os imigrantes ilegais, será abordada nesta terça-feira (31) na Comissão de Justiça do Senado, antes de seguir para o plenário.

Boente prometeu defender o decreto de Trump, que considera "legal tanto na forma como no conteúdo".

Ele rescindiu as diretrizes de Yates e instruiu os subordinados "a cumprir com nossa obrigação e defender o decreto legal de nosso presidente".

O governo também anunciou a designação de Thomas Homan para a Agência de Migração e Aduanas no lugar de Ragsdale. Os motivos da substituição de Ragsdale, também herdado do governo de Barack Obama, não foram revelados.

CRISE

As demissões representam o capítulo mais recente da polêmica de alcance global provocada pelo decreto assinado por Trump na sexta-feira (27).

A medida suspendeu a entrada de refugiados nos EUA por um mínimo de 120 dias e de cidadãos de Irã, Iraque, Líbia, Somália, Sudão, Síria e Iêmen por 90 dias.

Importantes congressistas republicanos, como o senador John McCain, já se pronunciaram contra o decreto e a forma como a Casa Branca tratou a questão.

Em meio ao caos, o governo foi alvo de várias ações na Justiça para anular os efeitos do polêmico decreto. Até agora, procuradores de 16 Estados (todos governados por democratas), incluindo Califórnia e Nova York, classificaram a ordem executiva de Trump como "inconstitucional".

Trump barra imigrantes

SUPREMA CORTE

No ambiente de tensão, Trump decidiu antecipar para esta terça-feira (31) o anúncio de seu indicado para ocupar uma vaga na Suprema Corte.

O principal tribunal do país está bloqueado desde a morte do juiz conservador Antonin Scalia em fevereiro do ano passado. Desde então funciona com oito magistrados: quatro conservadores e quatro progressistas.

A Suprema Corte deve adotar decisões sobre temas muito sensíveis, como a legalização do aborto, casamento entre pessoas do mesmo sexo e posse de armas.

Trump já antecipou que trabalhava com uma lista de 20 possíveis candidatos e que os evangélicos americanos ficarão "felizes" com a pessoa escolhida.


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