Folha de S. Paulo


'Brexit' precisa ser votado pelo Parlamento, decide Justiça

A Suprema Corte do Reino Unido decidiu nesta terça-feira (24) que o governo precisa do aval do Parlamento antes de dar o início formal ao "brexit", a saída britânica da União Europeia (UE).

A decisão da Justiça, com oito magistrados contra três, é um sério revés para a primeira-ministra conservadora, Theresa May, que planeja acionar o processo até o fim de março. Ela depende, agora, do voto dos legisladores.

Parliamentary Recording Unit - 18.jan.2017/AFP
A video grab from footage broadcast by the UK Parliament's Parliamentary Recording Unit (PRU) shows British Chancellor of the Exchequer Philip Hammond (R) as he listens to British Prime Minister Theresa May speak during the weekly Prime Minister's Questions (PMQs) in the House of Commons in London on January 18, 2017. Prime Minister Theresa May unveiled her Brexit blueprint on January 17, 2017, announcing for the first time that Britain will leave Europe's single market in order to control EU immigration. / AFP PHOTO
A primeira-ministra britânica, Theresa May, que conduz o "brexit"

A maior parte deles havia preferido continuar na União Europeia, quando o "brexit" foi aprovado em plebiscito, em 23 de junho.

Não há, porém, expectativa de que o Parlamento vete o "brexit". Jeremy Corbyn, o líder do Partido Trabalhista, a principal força de oposição, orientou sua bancada a não impedir a desvinculação.

É provável, por outro lado, que legisladores peçam mudanças nos planos do governo e atrasem o cronograma.

Eles devem se opôr, por exemplo, a que o Reino Unido deixe o mercado único europeu, que reúne 500 milhões de consumidores.

Reagindo à decisão da corte, David Davis, secretário britânico para o "brexit", disse que o veredito "não muda o fato de que o Reino Unido deixará a UE".

May deve apresentar ao Parlamento nos próximos dias uma lei que entregue ao governo o poder de acionar o Artigo 50 do Tratado de Lisboa. É esse artigo que dá início formal ao processo de saída. As negociações devem durar cerca de dois anos.

A Suprema Corte também decidiu nesta terça-feira que as legislaturas regionais da Escócia e da Irlanda do Norte não têm poder de veto sobre o processo de saída da União Europeia, ao qual se opõem.

PARLAMENTARISMO

A questão em debate era jurídica. A Suprema Corte não julgou o mérito do "brexit" em si, mas a quem cabe a prerrogativa de iniciá-lo.

O governo de May dizia que a palavra final era sua. Insatisfeitos, cidadãos britânicos foram à Justiça para exigir que a tarefa fosse transferida ao Parlamento.

A base para o pedido, aceito pela corte, era de que foram os legisladores que incluíram o Reino Unido na União Europeia e, dessa maneira, apenas eles podem anular a própria decisão.

"Comemoramos o resultado, mas esse é apenas o começo do processo", diz à Folha Grahame Pigney, um dos líderes do movimento People's Challenge (o desafio do povo). Pigney foi um dos cidadãos que reivindicou a prerrogativa do Parlamento.

As discussões eram, para ele, também sobre quem tem a soberania no Reino Unido: governo ou legisladores.

Ele afirma esperar, agora, que o Parlamento possa analisar a questão com tempo e informações o suficiente, incluindo um debate social.

"Quero que o Parlamento decida se a saída do Reino Unido é realmente melhor do que permanecer na União Europeia", diz. Ciente de que May preferia acionar o processo em breve, ele afirma: "Mas o governo não é o poder soberano neste país."

Em dezembro, a Justiça britânica já havia dado razão à ação apresentada por cidadãos, afirmando que o governo deveria consultar o Parlamento antes de dar início ao "brexit". O governo questionou a decisão, mas teve seu recurso rejeitado pelo decisão da Suprema Corte desta terça-feira.

BRASILEIRO

Havia várias ações semelhantes na Justiça, uma delas com a participação do cabeleireiro brasileiro Deir dos Santos, com passaporte britânico e residente em Londres.

A reportagem da Folha entrou em contato com seus representantes legais, mas ele se recusou em comentar o caso, dizendo preferir não estar nos holofotes. Ele teria sido alvo de hostilidades desde o início do processo e recebido diversas ameaças.

Em uma nota, Santos afirmou que "esta é uma vitória para a nossa democracia parlamentar e para o Estado de direito". "Quaisquer que sejam as mudanças que estejamos prestes a enfrentar, tranquilizador é o fato de que esses dois princípios sagrados foram reafirmados."


Endereço da página:

Links no texto: