Folha de S. Paulo


Brasileiros que chegam aos EUA relatam até táticas para despistar guardas

Brasileiros de diferentes perfis tentam chegar aos EUA pela perigosa rota no mar do Caribe, via Bahamas. São desde pequenos agricultores em busca de dólares para ajudar suas famílias até empresários à procura de oportunidades de negócios.

Os primos mineiros Alberto e Lúcio (nomes fictícios) vivem em Pompano Beach, a 60 km de Miami, que tem uma comunidade de imigrantes brasileiros sem visto. Na casa simples que divide com a namorada, Alberto diz que a viagem em 2011 foi como os coiotes prometeram: rápida, sem risco e confortável.

Fabiano Silva/Folhapress
Lanchas passam perto da costa em Port Everglades, na Flórida, onde termina a rota das Bahamas
Lanchas passam perto da costa em Port Everglades, na Flórida, onde termina a rota das Bahamas

O mineiro de 35 anos, que mal terminou o ensino fundamental e sustenta uma filha de 13 anos no Brasil, fez contato com coiotes por meio do irmão, que havia entrado nos EUA pelo México.

O valor foi de US$ 17 mil, que seria pago quando ele chegasse em Miami. Alberto saiu de São Gotardo, interior de Minas, rumo a Guarulhos, onde um homem o aguardava com passagens aéreas que o levariam até Freeport.

Chegou sem problemas, foi pego em Freeport por um motorista, passou algumas horas em uma casa com 20 pessoas de diferentes nacionalidades e de manhã cedo embarcou em um iate "tinindo de novo" rumo à Flórida.

"Tinha o comandante e o assistente, e umas 'gringas' de biquíni, pegando sol e tomando cerveja, além do nosso grupo que ficou lá embaixo, dentro do barco. Chegando mais perto de Miami, dois caras fingiram estar pescando e a mulherada começou a dançar" para despistar um barco da guarda costeira que se aproximava, ele contou.

Um ano depois, Lúcio, 37, tentou a mesma sorte. Pagou US$ 17 mil para os mesmos agenciadores.

A viagem até Freeport foi tranquila, mas depois Lúcio teve de aguardar três dias em uma casa com outros seis brasileiros, sem informação. Depois foram levados de barco para outro local, com pouca comida e sem conforto.

O grupo foi transferido uma terceira vez, para um hotel, onde no dia seguinte foram presos pela imigração. Lúcio foi levado a um centro de detenção em Nassau e deportado alguns dias depois.

Há 4 meses, o pai de quatro filhos de idades entre 2 e 10 anos voltou aos EUA, desta vez pelo México. Foram 19 dias de Cancún até Houston, cruzando o Rio Grande e entrando por Laredo, no Texas.

CAVERNA

Há quatro anos, a travessia de Ailton Campos, empresário de São Paulo, de Bimini para Miami tinha tudo para ser tranquila, mas virou um pesadelo por conta das condições climáticas no Caribe em certas épocas do ano.

Campos já havia morado por sete anos nos EUA com um visto vencido de turista. Decidiu ir ao Brasil para passar algumas semanas e combinou com um amigo de Miami que viajaria de volta para a Flórida pelas Bahamas.

Arquivo Pessoal
O empresário Ailton Campos imigrou pela rota das Bahamas, mas depois se legalizou nos Estados Unidos
O empresário Ailton Campos imigrou pela rota das Bahamas, mas depois se legalizou nos EUA

Campos, 38, conta, sentado em uma poltrona de couro no luxuoso lobby do prédio onde mora em South Beach, que fez tudo por conta própria: comprou passagens, chegou até um resort de Bimini e aguardou contato do marinheiro contratado para ir pegá-lo na praia.

As condições do mar não permitiram a saída do barco de Miami e Campos esperou alguns dias, ansioso por que a imigração só permitiu uma estada de sete dias na ilha. No último dia, Campos perdeu contato com o barco, e teve que fugir do hotel. "A recepcionista me disse que a polícia estava me procurando. Saí para a praia, me escondi numa caverna que encontrei e fiquei esperando."

Na manhã seguinte, Campos conseguiu contato e embarcou na lancha alugada por US$ 4.000. A viagem durou oito horas em meio a uma tempestade tropical.

Na chegada a Miami, a Guarda Costeira deteve a embarcação. Campos foi detido, mas, falando inglês fluente, convenceu os agentes a ser liberado para aguardar em liberdade uma audiência. "Contratei o melhor advogado e depois de muito tempo consegui me legalizar,'' diz.


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