Folha de S. Paulo


Coiote brasileiro cobra US$ 12 mil para levar imigrantes das Bahamas aos EUA

Em frente ao píer tomado por turistas desembarcados de enormes transatlânticos, um sedã velho e de vidros escuros com três homens para no meio da rua.

Um deles abre a janela e faz sinal para o repórter entrar e, num piscar de olhos, a atmosfera ensolarada de férias dá lugar a uma cena claustrofóbica de filme de gângster.

Sentado no banco de trás está Alexandre Soares de Oliveira, um dos pelo menos quatro coiotes brasileiros que atuam em aliança com organizações criminosas bahamenses e norte-americanas para transportar imigrantes até a costa da Flórida.

Nino Marcutti/Alamy Stock Photo
Docas de Potter's Cay, em Nassau, nas Bahamas, de onde partem os barcos de imigrantes aos EUA
Docas de Potter's Cay, em Nassau, nas Bahamas, de onde partem os barcos de imigrantes aos EUA

A rota, menos usada do que a da fronteira mexicana, entrou no noticiário no fim de 2016, com o desaparecimento de pelo menos 12 brasileiros que tentavam a travessia.

O último contato com familiares ocorreu há dois meses, em 6 de novembro, quando o grupo estava prestes a embarcar de Nassau, capital das Bahamas.

Vestido de bermudas e tênis, portando um relógio dourado e um grande anel de ouro, Alex, como se apresenta, começou a conversa perguntando como eu havia conseguido o seu celular.

Imigração ilegal aos EUA

Convenceu-se de que eu estava tentando emigrar para os EUA e que o contato havia sido repassado por pessoas que o conheciam na região de Boston (EUA), de grande concentração de brasileiros.

Vencida a desconfiança inicial, é a vez de Alex tentar provar que a travessia não traz riscos. "Essa história dos 22 [sic] brasileiros é tudo mentira. Eles estão todos presos aqui nas Bahamas. O que aconteceu é que o barco deles foi pego com cocaína, aí eles ficam incomunicáveis. Tem de se foder mesmo."

A hipótese é descartada pelo Itamaraty. Nos últimos dias, prevalece a tese de naufrágio.

VIAGEM

A conversa passa aos detalhes da travessia. Enquanto o carro dá voltas pelo pequeno centro de Nassau, Alex diz que tenho sorte: um barco com seis brasileiros sairia na manhã do dia seguinte, sexta (6). "Tem um ali esperando dois meses pra cruzar."

Por eu já estar nas Bahamas, a viagem sairia por US$ 12 mil —metade paga antes do embarque e a outra após a chegada à Flórida.

A viagem começaria às 8h, a bordo de barco pesqueiro. Mais perto da costa americana, o grupo faria baldeação para um iate e desembarcaria às 15h na casa do capitão, em território americano.

Como garantia, Alex apresenta os dois bahamenses nos assentos da frente.

"Esse aqui já foi o maior transportador de droga das Bahamas, mas agora parou", diz, pondo a mão no ombro do motorista. "E esse aqui comanda a polícia, sabe tudo o que acontece lá."

As instruções para a viagem são lacônicas: só é possível levar uma pequena mala. Pergunta qual é o modelo do meu celular. Mostro o iPhone 6S. "Esse não pode, tem GPS, dá pra rastrear. Mas eu te troco por um LG novinho que comprei pra minha mulher no Panamá. É do mesmo preço e do mesmo tamanho, fica tudo certo."

Alex revela pouco sobre si. Diz que mora em Marataízes, litoral do Espírito Santo, e que já viveu nos EUA. Conta, com aparente orgulho, ter ficado preso por dez meses lá. Na Justiça da Flórida, há o registro de sua prisão em 1991 por roubo, com pena prevista de até cinco anos.

Filiado ao PMDB, tem 49 anos e concorreu no ano passado a vereador na sua cidade, como Professor Alexandre. No TSE, está registrado como docente do ensino médio. Para a campanha, declarou ter gasto apenas R$ 1.594, do próprio bolso. Mas a candidatura não foi bem-sucedida: teve só sete votos.


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