Folha de S. Paulo


Pesquisas apontam vitória do 'não' em referendo na Itália

Andreas Solaro/AFP
Virginia Raggi, prefeita de Roma, vota no referendo neste domingo (4)
Virginia Raggi, prefeita de Roma, vota no referendo neste domingo (4)

Pesquisas apontam que os eleitores italianos rejeitaram neste domingo (4) o referendo constitucional convocado pelo governo, segundo as primeiras estimativas após o fim do voto, encerrado às 23h locais (20h em Brasília).

Não há um resultado oficial, mas o canal italiano Rai estimou que entre 54% e 58% dos eleitores votaram pelo "não". Se confirmado, o resultado é uma derrota para o premiê Matteo Renzi, que havia defendido o referendo. Esse cenário favorece movimentos populistas.

O premiê havia proposto a reforma na Constituição, a maior mudança no texto desde o fim da Segunda Guerra Mundial (1939-1945). "Nós estamos jogando para decidir os próximos 20 anos", disse Renzi durante a campanha na sexta-feira (2).

O voto indica, dessa maneira, o grau de insatisfação popular com o governo de Renzi, outrora uma promessa política. Ele chegou a ameaçar com sua renúncia, caso a reforma constitucional não fosse aprovada. Não estava claro, porém, se ele cumpriria a sua ameaça.

Sua popularidade está em queda devido à persistência dos entraves econômicos, apesar das promessas de seu governo. O PIB (Produto Interno Bruto) deve crescer apenas 0,8% durante ano.

A crise italiana está ademais relacionada ao restante do continente europeu, onde movimentos contrários ao "establishment" político têm se fortalecido. Um candidato da extrema direita chegou próximo à Presidência da Áustria neste domingo (4).

O referendo italiano não estava diretamente vinculado à União Europeia. Mas analistas apontaram, nos últimos meses, que a vitória do "não" poderia desencadear uma crise política que culminaria em sua saída do bloco, como a votada em junho no Reino Unido.

A União Europeia e sua moeda comum, o euro, são considerados por parte da população italiana como a causa da estagnação econômica e da crise política.

ELEITORES
Brasileiros com cidadania italiana puderam votar por correio enviando suas cédulas até 1º de dezembro. Estima-se que 30% dos cerca de 400 mil eleitores no Brasil tenham participado do referendo. Havia no total 51 milhões de possíveis eleitores.

Houve campanha pelo voto, como a capitaneada pela ítalo-brasileira Renata Bueno, eleita em 2013 para a Câmara dos Deputados da Itália. Bueno defendia o "sim". Em entrevista à Folha nesta semana, ela disse que o texto proposto por Renzi era "o coração das reformas de que a Itália está precisando".

SENADO
O texto votado no referendo propunha alterações na Constituição tendo em vista simplificar a burocracia do país. Por exemplo, os prazos para a aprovação de leis. Hoje a Câmara e o Senado têm o mesmo poder na Itália. O governo afirma que a paridade emperra os processos.

Renzi propôs, portanto, que o Senado fosse esvaziado. O número de senadores diminuiria de 315 para 100 e a Casa não poderia, por exemplo, dissolver governos.

O Senado tampouco poderia aprovar leis, tornando-se assim uma espécie de órgão de consulta. Senadores só teriam poder de decisão em casos restritos, como as modificações na Constituição.

Outra mudança proposta pelo premiê era centralizar o poder em Roma, diminuindo a importância de entidades regionais. Esse ponto, em específico, foi bastante criticado como indício de demasiada concentração na capital.

DIVISOR
Estava claro, nas últimas semanas, que o cenário político italiano seria modificado por esse referendo, quer ganhasse o "sim" ou o "não". Movimentos populistas, como o Cinco Estrelas, podem beneficiar-se da insatisfação popular -mesmo que tampouco ofereçam as suas soluções à crise econômica.

Beppe Grillo, líder do Cinco Estrelas, chegou a sugerir que os eleitores votassem a partir do "instinto" e rejeitassem o referendo de Renzi. "Não adiante eu explicar o referendo para vocês. Vocês não vão entender. Nem eu entendo", afirmou Grillo.

A ideia de voto por "instinto" era estimulada pela sensação de que o referendo era técnico e complicado. Apenas 17% da população "conhecia bem" o que estava em discussão no referendo, segundo uma pesquisa divulgada pelo canal italiano Rai. A maior parte (46%) afirmava ter um conhecimento "superficial" do voto.


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