Folha de S. Paulo


Havana vive ausência de Fidel e se prepara para maratona do 'adeus'

No primeiro domingo sem Fidel Castro, Havana parecia respirar fundo para a intensa semana de homenagens ao dirigente que governou Cuba por 49 anos e implantou o regime comunista que continua vigente no país.

"Hoje, há uma terrível ausência de coisas", resumiu uma jornalista cubana residente na capital. Até mesmo as Damas de Blanco, o conhecido grupo dissidente formado por mulheres de presos políticos, cancelou sua marcha semanal pela primeira vez em 13 anos.

Mas a calma não era apenas espontânea. Durante o luto de nove dias, o governo proibiu a venda de bebida alcoólica e eventos públicos, como jogos de beisebol, o grande esporte nacional, e concertos musicais. Até os restaurantes passaram a fechar as portas mais cedo.

Na homenagem mais importante até o momento, centenas de estudantes da Universidade de Havana fizeram uma vigília ao longo do fim de semana. Na manhã deste domingo (27), ocuparam a escadaria principal em silêncio absoluto.

O local foi palco de um dos últimos discursos de Fidel às multidões, em 2010. Seu retrato rodeado por velas foi posto exatamente onde falou por horas, como de costume.

Por determinação do governo, os meios de comunicação estatais terão a programação tomada por homenagens póstumas durante os dias oficiais de luto.

O canal venezuelano-cubano Telesur fez uma longa reportagem sobre a relação de Fidel com o esporte e analisou "o tratamento midiático da direita" sobre sua morte.

Em alguns pontos de Havana, funcionários preparavam a cidade para o cortejo fúnebre, como pintura de meio-fio. No órgão estatal para a imprensa, uma grande fila de correspondentes internacionais se formou para buscar o credenciamento.

Mesmo com Fidel afastado formalmente do poder desde 2008 e aos 90 anos, muitos cubanos se surpreenderam com a anúncio da sua morte, na noite de sexta-feira (25) para sábado (26).

Para eles, era como se o líder da Revolução de 1959 estivesse congelado na sua aparência frágil, esporadicamente exposta em fotos ao lado de visitantes ilustres. A última, no último dia 15, foi com o líder máximo vietnamita, Tran Dai Quang.

O impacto da morte de Fidel é uma incógnita. Alguns analistas acreditam que se abre um caminho para acelerar as reformas econômicas capitaneadas pelo irmão Raúl Castro, embora sem alterar o monopólio do Partido Comunista no poder.

Por outro lado, a vitória de Donald Trump para a Presidência dos EUA, que chegou a comemorar a morte do líder cubano em sua conta no Twitter, ameaça reverter a aproximação feita por Barack Obama, com reflexos negativos na abertura da economia.

HOMENAGENS

A primeira cerimônia está marcada para a manhã desta segunda-feira (28), na icônica praça da Revolução, onde fica a conhecida imagem do revolucionário cubano-argentino Ernesto Che Guevara e palco de vários discursos de Fidel.

Durante dois dias, as cinzas ficarão expostas ali para o público em geral –seu corpo foi cremado neste sábado (26), em cerimônia privada.

Na quarta (30), começa uma grande caravana de Havana até Santiago de Cuba, segunda maior cidade do país.

O percurso de 900 km será na direção inversa à que os comandados por Fidel fizeram para tomar o poder.

O sepultamento ocorrerá no próximo domingo (4), às 7h locais (10h em Brasília), em Santiago de Cuba.

A expectativa é a de que as homenagens sejam multitudinárias, incluindo autoridades estrangeiras. As locadoras já não têm mais veículos, os voos para Havana estão cheios, assim como hotéis.


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