Folha de S. Paulo


Em idas e vindas, avô de Trump esteve sob ameaça de expulsão da Alemanha

Há um século, na Alemanha, alguém disse a um antepassado de Donald Trump o mesmo que o presidente eleito tem dito a migrantes em seu país: que vá embora.

Um historiador alemão afirma ter descoberto recentemente documentos que registram as agruras de Friedrich Trump, avô do magnata, em sua tentativa de voltar ao país natal após ter se mudado para os Estados Unidos.

A Alemanha recusou devolver-lhe a cidadania e, em uma carta, exigiu que partisse em até oito semanas. Caso contrário, seria expulso dali.

Os contornos da história já eram conhecidos, mas os detalhes foram incrementados pelos papéis encontrados por Roland Paul nos arquivos de Renânia-Palatinado (oeste).

A notícia foi publicada na semana passada pelo tabloide alemão "Bild".

Ralph Orlowski/Reuters
A document signed by Friedrich Trump, grandfather of U.S. President-elect Donald Trump, is pictured at the state archive of Rhineland-Palatinate in Speyer, Germany November 22, 2016. REUTERS/Ralph Orlowski FOR EDITORIAL USE ONLY. NO RESALES. NO ARCHIVES ORG XMIT: ROR18
Documento assinado pelo avô de Donald Trump, guardado em arquivo recém descoberto

A trajetória de Friedrich é marcada pelas idas e vindas. Depois de ter deixado a Alemanha em 1885, aos 16 anos, ele retornou ao país e casou-se. Mais tarde, ele mudou-se outra vez para os EUA.

Sua mulher não se acostumou à vida em Nova York e quis voltar à Alemanha. As autoridades da Baviera, região que à época era um reinado, não permitiram, no entanto, o regresso da família.

A negativa estava relacionada ao fato de que Friedrich migrou sem notificar as autoridades locais e, somado a isso, não cumpriu o serviço militar obrigatório. Ele não pôde, portanto, recuperar a cidadania deixada para trás.

A papelada do arquivo alemão mostra que Friedrich insistiu em seu retorno, escrevendo uma carta ao príncipe regente Leopoldo (chamando-lhe "muito querido, nobre, sábio e justo"). A sua súplica não teve sucesso e ele precisou partir em 1905.

Fred, pai de Donald, nasceu nos EUA meses depois da expulsão da família da Alemanha —uma série de acontecimentos domésticos que culminaram, neste mês, na eleição do republicano.

Após sua vitória, Trump afirmou ter planos de expulsar 3 milhões de imigrantes dos EUA. Ele também é conhecido por seu infame plano de um muro separando os EUA do México, a ser pago pelo governo mexicano.

DINASTIA

A saga da família é tema do livro "The Trumps: Three Generations of Builders and a President" (Os Trump: Três Gerações de Construtores e um Presidente), publicado em 2001 por Gwenda Blair.

O tomo, de quase 600 páginas, já incluía a história da "expulsão" de Friedrich.

Friedrich, Fred e Donald exemplificam, ela diz em entrevista à Folha, um século de história americana.

"É a história de como três gerações se adaptaram e tiveram sucesso", afirma. As sucessivas vitórias são explicadas, em parte, por uma "cultura" compartilhada.

"Donald, assim como o avô e o pai, se apresenta como bem-sucedido e como o vencedor de todas as disputas em que entra", diz Blair.

"Os três foram muito espertos em descobrir como aproveitar-se do sistema para o seu próprio benefício."

KETCHUP

A família Trump vem da cidade alemã de Kallstadt, hoje um povoado de 1.200 habitantes conhecido devido a outra família: os Heinz, da marca de ketchup, que doaram 40 mil euros para restaurar o órgão da paróquia.

Friedrich nasceu em 1869 e recebeu a cidadania americana em 1892, após ter migrado e mudado seu nome para Frederick. Nos EUA, ele estabeleceu-se nos setores de restaurantes e de hotéis.

Seu ramo de atividade já foi descrito como o de bordéis, devido à recorrência da prostituição nos estabelecimentos. Na falta de evidências da participação de Friedrich, a biógrafa Blair pede cautela com esse termo.

O patriarca da família Trump mudou-se para a cidadezinha de Bennett, onde abriu o New Arctic Restaurant, antes de voltar à Alemanha em 1901. Em 1902, casou-se com Elisabeth Christ, filha de um vizinho.

Fredrich voltou aos EUA no mesmo ano com a mulher e passou a viver em Nova York.

Elisabeth, porém, sentia falta do país natal. O casal voltou em 1904 à Alemanha, de onde foi obrigado a mais uma vez partir.

"Se eles tivessem aceito ele em 1905, Donald Trump não estaria nos EUA", afirmou Paul à rede americana de televisão CNN. "Na verdade, [Trump] não existiria."


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