Folha de S. Paulo


Justiça britânica decide que início do 'brexit' depende de aval do Parlamento

A Justiça britânica decidiu nesta quinta-feira (3) que cabe ao Parlamento britânico, e não ao governo, dar início ao "brexit".

A decisão não é definitiva. O governo já afirmou que vai apelar à Suprema Corte. Há audiências previstas para o início de dezembro.

Mas a sentença é uma séria derrota para Theresa May, premiê britânica, e pode atrasar seus planos de separar o Reino Unido da União Europeia. O divórcio foi votado em 23 de junho e é hoje conhecido como "brexit".

May havia anunciado que iria acionar o Artigo 50 do Tratado de Lisboa até o final de março de 2017, dando início formal à saída, um processo de dois anos de duração. Mas essa ação pode caber, agora ao Parlamento.

Mesmo após a sentença, o governo afirmou não ter alterado o seu cronograma. Mas o fato de que legisladores poderão decidir o "brexit" leva a uma situação imprevisível.

A maior parte deles apoiava a permanência do Reino Unido, mas não se sabe se eles de fato desafiariam o resultado do referendo.

Um efeito possível é que o Parlamento amenize os impactos da saída, flexibilizando as regras de imigração e mantendo o Reino Unido no mercado comum europeu.

No caso de haver atrasos no cronograma anunciado pelo governo, haverá descontentamento entre líderes europeus, a quem é mais favorável uma resolução breve.

Ademais, a derrota de May nesta semana poderia levar à antecipação das eleições, por ora previstas para 2020.

Jeremy Corbyn, líder trabalhista, afirmou que diante desse julgamento o governo deve sem demora informar o Parlamento sobre seus planos de negociação.

"O Partido Trabalhista respeita a decisão do povo britânico de deixar a União Europeia. Mas deve haver transparência", ele disse em uma nota.

Nigel Farage, ex-líder do Ukip (Partido da Independência do Reino Unido) e um dos principais entusiastas da saída britânica, afirmou por sua vez temer que os eleitores sejam "traídos".

Farage disse à uma rádio local que "nós podemos estar no início de um processo em que há uma tentativa deliberada por parte de nossa classe política de trair 17 milhões de eleitores."

DEBATE

A questão julgada nesta quinta-feira era legal, e não política. A pergunta feita aos juízes era a quem cabe, segundo a lei, a decisão de deixar a União Europeia.

O governo diz que essa é uma prerrogativa do Executivo e que May tem o direito de acionar o Artigo 50.

Diversos grupos de cidadãos, no entanto, foram à Justiça insistir em que esse é um dever do Parlamento. Um deles era o cabeleireiro brasileiro Deir dos Santos.

Outra iniciativa é o Desafio do Povo. A Folha conversou recentemente com Grahame Pigney, líder da associação.

Ele afirmou à reportagem que foi o Parlamento que promoveu a entrada do Reino Unido no bloco econômico e, portanto, apenas os legisladores podem reverter essa situação. A saída da União Europeia significaria, afinal, a perda dos direitos de milhões de cidadãos.

"É uma questão fundamental", Pigney disse então à reportagem. "Se o Parlamento é o poder soberano no Reino Unido, então o governo não pode anular ou modificar atos do Parlamento."


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