Folha de S. Paulo


Autoridades francesas deslocam centenas de imigrantes em Calais

Autoridades francesas deslocam centenas de imigrantes em Calais

Autoridades francesas começaram nesta segunda-feira (24) a deslocar centenas de migrantes em Calais, no norte do país, preparando-se para desmantelar o campo de refugiados que tornou-se um espinhoso tema eleitoral.

Cerca de 9.000 pessoas vivem ali, segundo organizações humanitárias. O governo francês fala em 7.000. As condições de vida, observadas pela Folha há um mês, são tão insalubres que o campo é apelidado "selva".

Parte dos refugiados estava baseada em Calais à espera de uma oportunidade de cruzar ilegalmente para o Reino Unido, do outro lado do canal. Revoltosos, alguns deles entraram em confronto com as forças de segurança, queimando banheiros químicos e arremessando pedras.

O processo começou às 8h do horário local (4h em Brasília) com mais de 1.200 policiais e outros funcionários.

O Ministério do Interior francês afirmou não ter planos de usar a força. Mas, "se houver migrantes que se recusem a partir, ou ONGs que causem problemas, a polícia pode ser obrigada a intervir."

Os migrantes serão realocados em 450 centros ao redor do país. Eles poderão pedir asilo. Caso não recebam a permissão para continuar no país, eles serão deportados.

Isso significa que terão de voltar para os lugares de onde fugiram. A maior parte deles vêm de nações em guerra ou extrema pobreza, como a Síria e o Afeganistão.

O Reino Unido aceitou parte das crianças desacompanhadas que viviam em Calais, estimadas em 1.300.

AUXÍLIO

Em Calais, refugiados foram amparados nos últimos meses por um emaranhado de organizações humanitárias. Havia escolas, restaurantes, barbeiros e cozinhas comunitárias. Esses grupos lhes explicavam, à véspera de sua expulsão, a burocracia que vão encontrar adiante quando pedirem asilo.

O primeiro ônibus que partiu levava 50 sudaneses para a região da Borgonha (centro).

Esperava-se que 60 ônibus deixassem o campo durante a segunda-feira. O processo deve durar dias, até que Calais tenha sido esvaziada, e o campo, enfim destruído.

Terá sido uma questão a menos para lidar nas campanhas eleitorais francesas. A "selva" é um dos temas recorrentes dos debates entre candidatos em suas primárias. Há a percepção de que o governo não soube lidar com a crise humanitária.

Candidatos de direita têm prometido, caso eleitos, rever o acordo de Le Touquet, que determina o controle migratório britânico feito em solo francês. Na prática, o texto, assinado em 2003, significa que a fronteira britânica está firmada no porto de Calais.

O futuro desse acordo será especialmente complicado durante os próximos anos, enquanto o Reino Unido estiver negociando sua saída da União Europeia, conhecida como "brexit". A França deve usar o acordo de Le Touquet para buscar um melhor resultado nesse processo.

O Reino Unido está construindo, no meio-tempo, um muro de quatro metros de altura para impedir que refugiados saltem de Calais ao porto, embarcando à ilha.

A constante tentativa de imigrar ilegalmente ao Reino Unido causou episódios de violência em torno do campo. Refugiados tentaram deter automóveis rumo ao porto jogando diante deles, por exemplo, troncos de árvores ou carrinhos de supermercado, levando a acidentes. Moradores protestaram.

A crise dos refugiados não afeta, porém, apenas a França e o Reino Unido. Esse é um drama compartilhado por todo o continente, que tem recebido centenas de milhares de migrantes vindos, em grande parte, da Síria. As estratégias para lidar com essa questão dividem os Estados-membros europeus.


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