Folha de S. Paulo


E-mails vazados de chefe de campanha de Hillary constrangem candidata

Em fevereiro, o chefe de campanha de Hillary Clinton, John Podesta, 67, preparou um brunch para arrecadar fundos. "Estou atrás do balcão porque não quero virar a refeição", brincou com os convidados do banquete que cozinhou com a chef-celebridade Carla Hall.

Sete meses depois, Podesta é o prato principal dos republicanos, após o site WikiLeaks vazar o conteúdo de seu e-mail. As mensagens escancaram como a "salsicha é feita" numa corrida eleitoral, para usar a expressão que a presidenciável democrata adotou ao falar do jogo político numa palestra privada em 2013 -agora tornada pública, já que trechos dela estavam no servidor do coordenador.

Quem escreveu a Podesta acabou exposto, como um assessor dos Clinton que chamou a filha de Bill e Hillary de "criança mimada". O dono da conta não negou a autenticidade dos e-mails.

Quando a primeira leva emergiu, há 11 dias, ele tuitou não ter tempo "para descobrir quais são reais ou falsos" e afirmou não estar "feliz em ser hackeado pelos russos", que teriam interesse em ajudar o republicano Donald Trump. No mesmo dia, a Casa Branca atribuiu os ciberataques a Moscou, que nega.

Foi do e-mail de Podesta que veio à tona conteúdo de palestras de Hillary, com opiniões favoráveis ao mercado financeiro e ao livre comércio, em contraste com o discurso dela na campanha.

Antes de virar foco de um incêndio, Podesta especializou-se em apagá-los. Trabalhou nos dois mandatos de Bill Clinton, primeiro como assistente e a partir de 1998 como seu chefe de gabinete, em meio à escalada de escândalos sexuais envolvendo o patrão.

Em 1993, liderou investigação interna crítica à então primeira-dama —Hillary teria um dedo na demissão de sete funcionários de carreira da Casa Branca, trocados por aliados dos Clinton.

Nem sempre foi complacente com a candidata que hoje defende. Em 2006, discordou da estratégia de Hillary, que se preparava para as prévias democratas depois vencidas por Obama. Ela queria se vender como alguém experiente. Podesta acreditava que o eleitorado queria novidade. Comparou: Hillary era Microsoft, não Apple.

Após a era Clinton, ele abriu uma firma de lobby em Washington com o irmão Tony, acusado de defender interesses de farmacêuticas que tentavam bloquear a venda de genéricos contra Aids na África dos anos 1990.

Conselheiro da gestão Obama, Podesta se despediu do atual governo em 2014. Tuitou seu "maior fracasso": "Não garantir a #transparência" dos documentos sobre UFOs".

Seu fascínio com a ufologia transparece em mensagens expostas pelo WikiLeaks. Edgar Mitchell, o sexto astronauta a pisar na lua, sugere que o Vaticano está a par da vida fora da Terra.

Já o guitarrista Tom DeLonge, da banda Blink 182, escreve pedindo "uma conversa privada" sobre aliens, interesse que tem em comum com Podesta, que em 1999 fez seus 50 anos na Casa Branca, com festa temática da série "Arquivo X".

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HILLARYLEAKS
O que foi divulgado

Palestras
E-mails do chefe de campanha de Hillary revelam trechos de palestras que ela deu para bancos, do Goldman Sachs ao Itaú. Ela defende o livre comércio, o que contrasta com seu discurso eleitoral, e diz que, "obviamente", hoje está "bem distante" da realidade da classe média

Criança mimada
Em novembro de 2011, Doug Band, um dos aliados mais próximos dos Clinton, enviou e-mail chamando a filha de Hillary e Bill, Chelsea, de "criança mimada". Ela criaria problemas desnecessários na fundação da família, para compensar a falta de "foco na vida"

Kevin Lamarque - 19.nov.2000/Reuters
Chelsea Clinton (à dir.) olha bolsa em loja de Ho Chi Minh (Vietnã), em foto de novembro de 2000
Chelsea Clinton (à dir.) olha bolsa em loja de Ho Chi Minh (Vietnã), em foto de novembro de 2000

Religião
A atual diretora de comunicação de Hillary, Jennifer Palmieri, parece caçoar de religiosos ao comentar reportagem sobre executivos da mídia, como Rupert Murdoch, criarem seus filhos como católicos, que seria uma "religião conservadora aceitável" nos círculos de poder. "Seus amigos ricos não entenderiam se virassem evangélicos"

Mídia
Há traços de uma proximidade da campanha com órgãos de imprensa, crítica constante de Trump. Um repórter do "New York Times" manda pedaços de uma entrevista que fez com Hillary, e a diretora de comunicação recomenda trechos a suprimir, como uma referência à ex-candidata a vice republicana Sarah Palin

Salsicha
Em outro discurso transcrito, este de 2013, para um conselho de habitação, ela compara política a "uma salsicha sendo feita", o que é "desagradável", e diz que é preciso ter "uma posição pública e outra privada"


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