Folha de S. Paulo


Brasileiros na Flórida relatam agonia à espera da chegada do furacão Matthew

Após deixar um rastro de mais de 340 mortes no Caribe, a maioria delas no Haiti, o furacão Matthew ameaçava trazer à costa americana, nesta sexta-feira (7), "condições meteorológicas extremamente perigosas", segundo o Serviço Meteorológico Nacional.

Na véspera, o órgão previa um cenário apocalíptico para zonas na rota dos ventos de até 233 km/h. "Detritos lançados por rajadas extremas serão capazes de danificar estruturas, janelas desprotegidas e veículos" e causar "danos estruturais para prédios sólidos, com colapso de paredes e tetos", além da "destruição completa de trailers" (lar para 20 milhões de americanos).

Vídeo mostra aproximação do furacão Matthew aos EUA e a preparação de americanos

O clima de pânico foi resumido pelo governador da Flórida, Rick Scott, que pediu a 1,5 milhão de pessoas para deixarem suas residências, uma das maiores evacuações da história do Estado: "Isso é sério. Se você precisa sair de casa e ainda não o fez, faça. Essa tempestade vai te matar".

O presidente Barack Obama declarou estado de emergência no Estado, que abriu mais de 60 abrigos para moradores —como ginásios escolares cobertos por dezenas de colchões d'água—, e na Carolina do Sul.

Geórgia e Carolina do Norte também estavam na rota de Matthew, que atingiu o pico de intensidade numa escala que chega a cinco, baixou para o nível três e subiu de novo para quatro —o que ainda faz dele o pior furacão na região em quase uma década.

MÁQUINA DE LAVAR

Reportando da ilha das Bahamas, já atingida, uma jornalista da rede MSNBC comparava a ventania local com a "sensação de se estar numa máquina de lavar".

Para quem estava na Flórida em 1992, outro "enfant terrible" vem à mente: o furacão Andrew, que deixou cidades sob escombros. O governo local lida ainda com aqueles que resistem à evacuação, como o surfista Milton Vass, 58.

Em Juno Beach, uma vila praiana, ele disse que Matthew será "apenas outra grande aventura". "Meus amigos acham que vamos dar uma grande festa", afirmou ao Weather Channel, abraçado à mulher.

As autoridades não veem motivo para festejar. Companhias aéreas cancelaram mais de 1.500 voos no período, segundo o site Flight Aware. Todos os parques de Orlando fecharão nesta sexta. "A Festa Não-Tão-Apavorante de Halloween do Mickey está cancelada", avisa a Disney.

De férias na cidade, Arthur Mazur, 15, conta que sua mãe está "bastante assustada", mas diz que já se acha calejado em catástrofes: pegou uma das piores nevascas recentes, na Nova York de 2015, e estava na França quando o Exército tomou as ruas após um terrorista matar 86 pessoas com um caminhão, em Nice.

A família do curitibano se trancará por dois dias no quarto do hotel —que distribuiu uma folha com instruções aos hóspedes, como "estoquem mantimentos não perecíveis" e "fiquem longe de vidraças" (o wi-fi poderia cair também).

"Compramos água, pão, macarrão, queijo e refrigerante", diz o estudante por mensagens no celular. Do mercado onde tentavam adquirir mantimentos, Mazur enviava fotos das prateleiras de água engarrafada, todas vazias.

Reprodução/Reprodução
Mercado em Orlando, na Flórida, com prateleiras vazias nesta quinta-feira (6), às vésperas da chegada do furacão Matthew ao país
Mercado em Orlando (Flórida) com prateleiras vazias nesta quinta, às vésperas da chegada do Matthew

PRAIA DESERTA

Atleta que evita enlatados, a paulistana Elaine Cristina, 41, acumulou gelo para improvisar uma geladeira que conserve quentinhas naturebas, "caso falte energia". Ela mora desde 2001 em Boca Raton, cidade vizinha a Miami e em estado de alerta máximo.

Dona da Eunique Collections, butique com roupas, sapatos e acessórios, Cristina passou a madrugada desta quinta (6) removendo 4.000 peças da loja, que não tem seguro contra furacões.

"Como dizem aqui, 'better safe than sorry' [melhor segura do que arrependida]." A cidade praiana está desértica, relata. "Não existe vida lá fora. Está todo mundo em casa, com madeiras pregadas nas janelas, tentando evitar o pior".

No Twitter, #PrayforFlorida (reze pela Flórida) era uma das hashtags mais populares às vésperas da chegada do Matthew.

Mais tímido, o movimento #PrayforHaiti mobilizou internautas como Doug: "Apenas amando como orar pela Flórida virou tendência, mas não por um país do Terceiro Mundo que não pode se proteger tão facilmente".


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