Folha de S. Paulo


Após vencer plebiscito na Colômbia, campanha do 'não' enfrenta racha

Três dias depois do plebiscito em que o "não" venceu o "sim", derrotando o acordo de paz assinado entre o governo colombiano e as Forças Armadas Revolucionárias da Colômbia (Farc), os principais líderes do Centro Democrático (partido uribista) passaram a enfrentar uma crise interna.

Liderados pelo senador e ex-presidente Álvaro Uribe, a agrupação defendeu que o acordo fazia demasiadas concessões às Farc (facilitando anistias e dando acesso direto ao Congresso entre outras coisas). Com isso, logrou vencer o "sim" com uma margem mínima –de 50,2% a 49,7%, ou seja, menos de 60 mil votos.

Guillermo Legaria/AFP
 Demonstrators hold candles during a march for peace in Bogota, Colombia, on October 5, 2016. Colombian President Juan Manuel Santos said peace with the FARC rebels is
Manifestantes participam de protesto em defesa do acordo de paz com as Farc na Colômbia

Enquanto os uribistas ganham força e exigem que o governo deve insistir em convencer as Farc a renegociar o acordo, corrigindo alguns artigos, dentro da própria força instaurou-se, nesta quinta (6), um racha.

Um dos porta-vozes do "não", o ex-senador Juan Carlos Vélez, em entrevista ao jornal "La Republica" disse que a estratégia uribista foi "deturpar mensagens" e "deixar de explicar os acordos para para centrar-se em gerar indignação nas pessoas".

Para isso, acrescentou Vélez, "ouvimos uns estrategistas do Panamá e do Brasil que nos disseram para basear nossa mensagem na ideia da impunidade generalizada, na elegibilidade de criminosos, enquanto que, para os estratos mais baixos, deveríamos insistir na ideia de que o governo daria subsídios aos ex-guerrilheiros (estava prevista uma "mesada" de 90% de um salário mínimo por dois anos). Em cada região usamos uma estratégia. E na costa difundimos a ideia de que o acordo nos levaria a virar um país parecido à Venezuela."

As declarações do uribista levantaram polêmica dentro e fora do Centro Democrático. Uribe foi o que em mais alto tom advertiu Vélez. "Nossa estratégia se fundamentou em argumentos, em dar a conhecer aos colombianos os conteúdos do que se assinou em Havana, e o que ocorreria se o plebiscito fosse aprovado. Insistimos na ideia de que era necessário reformar o acordo", disse Uribe. "Nossa campanha sempre foi pedagógica", disse o senador Iván Duque.

ARGUMENTOS

O Centro Democrático também afirmou que não foram contratados marqueteiros ou estrategistas estrangeiros. "Nós não apelamos a mentiras ou a manipulações, apenas em argumentos. Pedimos às pessoas que se convencessem de que se aprovassem o acordo, estariam apoiando sua incorporação à Constituição", disse Uribe.

A partir das 17h (19h), a oposição se reuniria para discutir os pontos do acordo que deseja mudar, antes de apresenta-los ao governo para que se envie às Farc. Especificamente, são cinco.

O primeiro, que haja prisão para os delitos de lesa humanidade –o acordo previa penas de reparação, com "liberdade restringida".

O segundo, seria impedir que os que tenham cometido tais crimes possam se candidatar, mesmo depois de cumprir pena –o acordo o permitia, mesmo durante o cumprimento das condenações. O terceiro será o de pedir que as Farc entreguem todos os seus bens, algo que não constava no documento originar.

O quarto, que o narcotráfico seja considerado delito não-anistiável em qualquer caso _o acordo previa que, se fossem comprovadas as ligações do narcotráfico com a necessidade de arrecadar fundos para a guerrilha (o que tecnicamente se enquadraria em "crime de conexão política), poderia ser anistiado.

E o último ponto de correção ao acordo que pedirão os uribistas refere-se às terras. Pedirão que não se criem novas zonas de reserva para os ex-guerrilheiros, algo previsto no item de "reforma agrária" do acordo.

As cinco correções são, por ora, totalmente rejeitadas pela guerrilha, que considera que jogam por terra o já pactado. Desde Havana, seus líderes têm mostrado rejeição ao encontro entre Uribe e Santos e a ideia de que o primeiro possa sugerir emendas ao já pactado.

"Se deixarmos a paz nas mãos de Uribe, o país será levado ao Diabo. É verdade que a Colômbia atravessa um limbo perigoso, uma zona nebulosa, mas estará pior se colocarmos a paz nas mãos de Uribe e do (ex-presidente Andrés) Pastrana (também contrário ao acordo)", disse à revista "Semana".

No final desta quinta (6), a chanceler María Ángela Holguín, uma das designadas por Santos para fazer uma ponte com os uribistas, deu uma declaração desalentadora: "Se as Farc não quiserem abrir os acordos para as possíveis correções, não há nada que se possa fazer."


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