Folha de S. Paulo


Líder filipino xinga líderes mundiais e insta população a caçar traficantes

Junto com o papa Francisco e a ONU, o presidente dos Estados Unidos, Barack Obama, passou a fazer parte da lista de dirigentes e órgãos mundiais insultados por Rodrigo Duterte, 71, o boquirroto presidente das Filipinas.

Depois de ter sido chamado de "filho da puta" na segunda-feira (5), o americano cancelou a reunião que teria nesta terça (6) com o filipino na cúpula da Associação de Nações do Sudeste Asiático, no Laos.

Erik de Castro - 24.ago.2016/Reuters
O presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, aponta o punho, sinal que marcou sua eleição presidencial
O presidente das Filipinas, Rodrigo Duterte, aponta o punho, sinal que marcou sua eleição presidencial

Em maio, já eleito presidente, Duterte "homenageou" outra progenitora ilustre: a de Francisco, devido aos engarrafamentos provocados pela visita do pontífice.

A boca suja é uma marca do filipino e faz parte de seu estilo linha-dura. Obama foi xingado por Duterte quando o filipino foi questionado sobre as críticas a sua guerra às drogas, iniciada após sua posse, em 30 de junho.

Ele também prometeu combater a corrupção e a falta de ordem pública. Para isso, sugeriu um método pouco convencional: pediu aos cidadãos que matassem traficantes e usuários. "Atirem neles e lhes dou uma medalha."

O chamado teve o efeito desejado por Duterte. Em dois meses, 1.067 suspeitos de tráfico ou uso de drogas foram mortos em brigas de quadrilhas e por justiceiros, segundo estimativas do governo.

Eles se juntam às 2.400 que a polícia reconhece ter matado no período. Diante do saldo, Duterte foi criticado por ONGs como a Human Rights Watch e pela ONU.

Duterte rebateu, ameaçando deixar as Nações Unidas. "Vocês são inúteis, porque, se levassem suas funções a sério, parariam as guerras."

A guerra às drogas foi a mesma em seus 22 anos (em períodos intercalados) como prefeito de Davao, no sul do país. Entre 1998 e 2008, esquadrões da morte mataram mais de mil pessoas.

Na campanha, ele prometeu matar mais de 100 mil traficantes em seis anos de governo —cifra similar aos mortos nas guerras dos cartéis na Colômbia, nas décadas de 1980 e 1990, e no México, nos últimos dez anos.

Duterte segue uma tendência regional no Sudeste Asiático. A Tailândia fez ofensiva contra as drogas em 2006, e o indonésio Joko Widodo assumiu em 2014 com a mesma promessa do filipino.

Uns dos primeiros alvos de Widodo foram os brasileiros Marco Archer e Rodrigo Gularte, executados após dez anos no corredor da morte sob a condenação de tráfico internacional de drogas.

POPULARIDADE

A licença para a guerra às drogas foi aprovada após Duterte receber 39% dos votos em maio. Sua vitória é atribuída à insatisfação popular com as famílias que se revezavam no poder nas Filipinas.

A vitória foi obtida em uma campanha fomentada pelo temperamento do líder e por seus milhares de seguidores nas redes sociais.

A linha-dura se repetiu no expurgo de juízes e policiais supostamente ligados ao tráfico e na promessa de prender jornalistas corruptos.

Ele também provocou indignação ao aprovar o envio dos restos mortais do ditador Ferdinando Marcos (1917-1989) ao mausoléu de heróis nacionais.

Com os dirigentes estrangeiros, porém, ele suavizou o tom, em recuos aparentemente calculados. Prometeu ir ao Vaticano para se desculpar com o papa, em aceno aos 80% de filipinos católicos.

No caso de Obama, disse se arrepender da frase. Os EUA são um dos principais mercados para a economia manter o crescimento superior a 3% desde 2010 e fundamentais para conter a pressão de Pequim no mar do Sul da China.

Os recuos também mostram um certo pragmatismo na política externa. Segundo diplomatas ouvidos pela Folha, as Filipinas negociam os acordos econômicos da mesma forma que com Benigno Aquino 3º (2010-2016).

Porém, tanto o governo quanto as delegações estrangeiras têm mantido cautela diante do estilo extravagante e as eventuais opiniões de impacto contraditórias do novo comandante do país.


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