Folha de S. Paulo


Partido Republicano critica Trump sobre militar muçulmano morto

A frase "desta vez ele foi longe demais" é uma reação frequente de caciques republicanos ao presidenciável do partido, Donald Trump.

O senador John McCain, veterano do conflito do Vietnã que chegou a ser capturado e torturado e que disputou a eleição de 2008 contra Barack Obama, reforçou a ideia de "caminho sem volta" depois de Trump comprar briga com a família de um capitão muçulmano morto no Iraque.

Eric Thayer/Reuters
O candidato republicano à Presidência dos EUA, Donald Trump, discursa em comício na Pensilvânia
O candidato republicano à Presidência dos EUA, Donald Trump, discursa em comício na Pensilvânia

"Ele não tem licença irrestrita para difamar os melhores entre nós", disse McCain, em alusão aos militares.

Foi um entre vários republicanos, do presidente da Câmara ao líder da maioria do Senado, a lamentar a polêmica que fez a campanha de Trump entrar em seu quarto dia na defensiva.

A contenda começou depois de Khizr Khan afirmar que o empresário "nunca sacrificou nada nem ninguém" e errava em querer vetar a entrada de muçulmanos como forma de combater o terror.

A Convenção Nacional Democrata, de 25 a 28 de julho, teve cerca de 200 discursos, entre eles os de Barack Obama e Hillary Clinton, aspirante a sucedê-lo. Nenhum, contudo, ecoou tanto quanto o de Khan, na quinta (28).

Desde então, Trump reclamou de ter sido "violentamente atacado"; listou como sacrifícios que fez a criação de "enormes construções"; e sugeriu que o muçulmano não autorizou a mulher a abrir a boca no palco.

O episódio dominou o noticiário e fez disparar as vendas da versão de bolso da Constituição —Khan, advogado paquistanês que estudou em Harvard, sacudiu uma cópia no ar e disse que a emprestaria "com gosto" para Trump ("procure pelas palavras 'liberdade' e 'igualdade perante a lei'").

Também despertou reações do Estado Islâmico, que publicou em sua revista, "Dabiq", uma foto do capitão e a legenda: "Cuidado para não morrer como apóstata".

À noite, o bilionário sofreu um novo golpe. O jornal "The New York Times" informou que ele conseguiu ser dispensado cinco vezes do alistamento obrigatório do Vietnã.

IMPACTO

Há dúvidas, contudo, se o episódio deixará dano permanente na campanha de Trump. Num país onde veteranos de guerra são venerados, ele já colidiu com as Forças Armadas antes: disse que McCain fez mal em "ser capturado" e acusou soldados de desviar dinheiro do Iraque.

Autor de "Islã Político na Era da Democratização", Farid Senzai disse à Folha que, mesmo se o caso não tiver grande impacto nas eleições, pode "forçar uma revisão das noções pré-estabelecidas sobre muçulmanos nos EUA", onde 50% apoiam o veto a adeptos dessa fé, segundo pesquisa de junho da NBC.

"Os Khan passaram pelo sacrifício maior em prol do país, uma narrativa poderosa que pode mudar mentes."

Humayun Khan foi enterrado na sepultura 7.986 do Cemitério de Arlington, na Virgínia, como herói de guerra.

Nascido nos Emirados Árabes e fã de Thomas Jefferson, um dos responsáveis pela independência dos EUA, morreu em 2004 aos 27 anos. Um mês antes, na última ligação para a mãe, pedira: "Não se preocupe, estou seguro".


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