Folha de S. Paulo


Se Hillary vencer, Bill Clinton testará reações a um 'primeiro-cavalheiro'

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NEW YORK, NY - JUNE 7: (L to R) Husband and former president Bill Clinton and Democratic presidential candidate Hillary Clinton acknowledge the crowd during a primary night rally at the Duggal Greenhouse in the Brooklyn Navy Yard, June 7, 2016 in the Brooklyn borough of New York City. Clinton has secured enough delegates and commitments from superdelegates to become the Democratic Party's presumptive presidential nominee. She will become the first woman in U.S. history to secure the presidential nomination of one of the country's two major political parties. Drew Angerer/Getty Images/AFP == FOR NEWSPAPERS, INTERNET, TELCOS & TELEVISION USE ONLY ==
O ex-presidente Bill Clinton e a candidata democrata Hillary Clinton durante comício no Brooklyn

Na quarta-feira (27), para falar sobre a garota que conheceu na primavera de 1971 à plateia da Convenção Nacional Democrata, Bill Clinton usou um paletó azul-marinho de dois botões e uma gravata azul-cobalto que parecia estrategicamente combinar com o palco.

Como acessórios, apostou num relógio da grife Shinola (US$ 550), sapatos pretos brilhantes de marca não identificada e, na lapela, um broche com o nome da mulher. De joias, um clássico que nunca sai de moda: sua aliança de casamento.

"Pode lhe faltar o atual muque de Michelle Obama, mas ele compensa com uma boa cabeleira", descreve a repórter de comportamento da revista on-line "Quartz".

Com ironia, o artigo esquadrinha o visual do marido da presidenciável Hillary Clinton ("por acaso, o 42º presidente dos EUA") para explicitar como a mídia, em geral, reserva um tratamento diferente para o aspirante a "primeiro-cavalheiro" da nação.

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PHILADELPHIA, PA - JULY 26: Former US President Bill Clinton delivers remarks on the second day of the Democratic National Convention at the Wells Fargo Center, July 26, 2016 in Philadelphia, Pennsylvania. Democratic presidential candidate Hillary Clinton received the number of votes needed to secure the party's nomination. An estimated 50,000 people are expected in Philadelphia, including hundreds of protesters and members of the media. The four-day Democratic National Convention kicked off July 25. Drew Angerer/Getty Images/AFP == FOR NEWSPAPERS, INTERNET, TELCOS & TELEVISION USE ONLY ==
O ex-presidente Bill Clinton durante discurso no 2º dia da Convenção Nacional Democrata, na Filadélfia

A tese é simples: como homem, ele tem a prerrogativa de poder se vestir como quiser sem ser incomodado por isso. Em compensação, os vestidos escolhidos pela primeira-dama Michelle para a convenção democrata e pela mulher do presidenciável Donald Trump, Melania, na reunião republicana foram alvo de escrutínio midiático.

A obsessão pelo guarda-roupa das primeiras-damas persegue as ocupantes do cargo. Michelle Obama teve de aturar críticas por usar vestidos sem manga em sua primeira foto oficial, o que foi considerado uma ousadia desnecessária por alguns conservadores.

Com décadas de vida pública, Hillary foi fustigada diversas vezes pelo modo como se vestia. "Das campanhas [do marido] no começo dos anos 1990 até hoje, ela conseguiu achar um espaço na política para as bandanas", diz edição de 2014 da revista "Harper's Bazaar", antecipando uma galeria com 19 fotos sobre a afeição de Hillary pelo acessório de cabelo.

PRIMEIRO-CAVALHEIRO

Se Hillary fez história ao virar a primeira mulher indicada para concorrer à Presidência por um dos dois grandes partidos americanos, Bill por tabela também se vê no papel pioneiro de poder ser o primeiro homem numa vaga até aqui exclusivamente feminina.

Às primeiras-damas historicamente cabia supervisionar a equipe de serviçais da Casa Branca, selecionar a melhor porcelana para os jantares e sair bem na foto com o presidente.

Havia exceções, lembra à Folha Carl Anthony, historiador da Biblioteca Nacional das Primeiras-Damas. "Calvin Coolidge [30º presidente] cuidava da comida servida em eventos formais, por preocupações com orçamento, e Richard Nixon [37º] lidava com os vinhos oferecidos a chefes de Estado."

Para Anthony, a perspectiva de Bill como "dono de casa" é ainda mais única pelo fato de ele ser ex-presidente e, como tal, dificilmente se abster de palpitar num eventual governo da mulher.

Hillary já afirmou que daria ao marido a missão de "revitalizar" a economia e chegou a brincar que ele seria um ótimo vice (o que, na verdade, é inconstitucional para quem já ocupou dois mandatos presidenciais).

"De fato, alguns podem detectar um sexismo invertido aqui: a premissa de que, se o cônjuge fosse mulher, tanto poder seria provavelmente questionado", afirma Anthony.

Em editorial, o "New York Times" ratifica a ideia de que o retorno de Bill à Casa Branca, dessa vez como coadjuvante, seria "sui generis" tanto por seu gênero quanto por pertencer ao "clube de elite" dos quatro ex-presidentes vivos.

O jornal lembra de uma carta enviada à mulher do ex-mandatário Gerald Ford, Betty, por uma eleitora texana: "Você é constitucionalmente obrigada a ser perfeita".

Bill é tudo menos isso. Alguém liga? "Nenhuma mulher com o histórico de traições do sr. Clinton seria aceita como primeira-dama. Imagine o frenesi se Melania Trump tivesse uma infidelidade prévia documentada, ou se Michelle Obama e Laura Bush traíssem seus maridos enquanto morassem na Casa Branca."


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