Folha de S. Paulo


Movimento que condena violência contra negros se fortalece nos EUA

Josh Edelson/AFP
Criança exibe cartaz com dizeres 'não atire' durante protesto do Black Lives Matter em San Francisco
Criança exibe cartaz com dizeres 'não atire' durante protesto do Black Lives Matter em San Francisco

Vidas negras importam. Sob esse lema, um movimento nascido há apenas três anos da indignação com a brutalidade policial contra negros nos EUA tornou-se protagonista do debate sobre divisão racial e Justiça criminal no país.

Com amplo uso das redes sociais, o grupo deu visibilidade a um dos principais focos de tensão nos EUA, mas seu ativismo é acusado de encorajar a hostilidade contra policiais, levando a episódios como o que resultou no assassinato de cinco deles por um atirador em Dallas, na quinta (7).

A frase Black Lives Matter (vidas negras importam) foi citada pela primeira vez em 2013, numa mensagem postada no Facebook pela ativista Alizia Garcia, revoltada com a absolvição de um segurança que, um ano antes, havia matado um jovem negro de 17 anos na Flórida.

Com a ajuda de amigos igualmente ativos nas redes sociais, ela disseminou a hashtag, que aos poucos se tornou o símbolo da versão século 21 do movimento de direitos civis que mudou os EUA nos anos 1960.

Acusado de ser radical e antibrancos por políticos conservadores, o Black Lives Matter (BLM) se manteve pacífico, apesar de alguns protestos terem terminado em confronto. Líderes e simpatizantes da causa condenaram o ataque em Dallas, alguns com uma ressalva que alimenta as acusações de apologia à violência.

"O Black Lives Matter não perdoa ataques a policiais", disse Sir Maejor, um dos organizadores do movimento. "Mas tenho que ser honesto: eu entendo por que foi feito".

Em comunicado oficial, o movimento foi mais sóbrio, classificando o ataque aos policiais de "uma tragédia". Mas expressou uma preocupação comum entre os ativistas negros, de que ele desvie o foco da discussão sobre a brutalidade policial e a injustiça racial no país.

Para críticos do grupo, sua retórica agressiva propaga o ódio racial, exatamente o oposto do que seus líderes pregam. Rudolph Giuliani, ex-prefeito de Nova York, foi um dos que partiram para o ataque contra o BLM após o ataque em Dallas, acusando o grupo de colocar "um alvo nas costas dos policiais".

"Grupos como o BLM dão a impressão de que todos os policiais são contra os negros", disse. "Não são. São eles que salvam vidas. O BLM não salva vidas negras".

O homem apontado como autor do ataque, o militar da reserva Micah Johnson, 25, se disse "aborrecido com o Black Lives Matter", segundo a polícia de Dallas. Como foi morto por uma bomba da polícia após ser encurralado, num desfecho ainda mal explicado, não será possível interrogá-lo para saber se tinha algum elo com o movimento.

COMPARAÇÃO

Embora seja comparado ao movimento de direitos civis dos anos 1950 e 1960, o Black Lives Matter é bem diferente, a começar pela falta de uma liderança forte. Não há um nome central como Martin Luther King Jr. (1929-1968) ou Malcolm-X (1925-1965), ícones daquela geração de luta pelos direitos dos negros.

O BLM é mais fluido e horizontal, no molde das redes sociais, onde nasceu.

"Descentralização, mas com coordenação", disse à revista "Wired" Maurice Mitchell, organizador de um grupo chamado Blackbird.

Muitos acham que o movimento criou a mais forte onda de ativismo pelos direitos civis desde os anos 1960, com claro impacto no diálogo sobre a divisão racial. A energia gerada contagiou algumas das principais celebridades negras, como a cantora Beyoncé e o ator Samuel Lee Jackson, que manifestaram apoio e ajudaram a disseminar a mensagem.

Mas o BLM também também provoca rejeição. Em mensagem numa rede social, que depois ele apagaria, o ex-deputado republicano Joe Walsh reagiu assim ao ataque em Dallas: "Agora é guerra".Em doses menos extremas, o desconforto com o BLM existe desde que surgiu. Em resposta a ele foram criadas outras hashtags, como o Blue Lives Matter (vidas azuis importam, em defesa dos policiais).


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