Folha de S. Paulo


Trump altera lógica para virar candidato republicano

Assim que soube ter alcançado os 1.237 delegados necessários para ser, à revelia da cúpula do partido, o candidato republicano à Casa Branca, Donald Trump celebrou com foto no Instagram.

Degusta um lanche do McDonald's, a bordo do avião com seu nome na lateral, que lhe custou US$ 100 milhões ("um jato de 25 anos é como Cheetos: muita comida por um valor baixo", já disse sobre a transação). A imagem teve 126 mil curtidas e ataques como "por favor, engasgue com as fritas".

O episódio resume o paradoxo que paira sobre o magnata há 356 dias, desde que entrou na disputa: nunca um candidato foi tão amado e odiado ao mesmo tempo.

InstagramTrump

Ele teve mais votos do que qualquer republicano na história: 11,5 milhões, contra 10,8 milhões de George W. Bush, em 2000. A margem crescerá quando os últimos cinco Estados (o mais populoso, Califórnia, incluído) fizerem suas primárias, na terça (7).

Paralelamente, Trump ostenta índice de rejeição inédito para um presidenciável: 58,5%, segundo as pesquisas.

A de Hillary Clinton também foge à curva (55,5%), e o político neófito tem duas vantagens sobre a experiente rival democrata: o discurso antiestablishment, num momento de fadiga popular com Washington, e certa resistência a golpes que levariam a maioria dos políticos à lona.

O QUE NÃO MATA...

É a versão eleitoral da máxima "o que não mata, fortalece". Trump já foi acusado de misógino, xenófobo, inexperiente e de não ser conservador o bastante. Negou-se a divulgar seu Imposto de Renda, contrariando praxe eleitoral.

Já no primeiro discurso, lançou uma de suas propostas mais controversas: erguer um muro na fronteira com o México e fazer o vizinho "pagar por ele", mesmo sob risco de alienar latinos nos EUA, onde nascem mais membros de minorias do que brancos desde 2011, segundo o censo.

Trump apelida desafetos. O senador Marco Rubio, pela estatura, é o Pequeno Marco. A senadora democrata Elizabeth Warren, branca que diz ter raízes indígenas, virou Pocahontas. Hillary Trapaceira é a grande nêmesis.

DONALD TRUMP, 69 - REPUBLICANO - 42,3% nas pesquisas

A relação com a "desonesta imprensa política" piorou na terça (31), quando fustigou repórteres de "malandro" e "gracinha". Um jornalista perguntou se manterá o tom se virar presidente. "É, será assim. Você acha que mudarei?"

Michael D'Antonio, seu biógrafo, não. "Se criticado, ele faz de você seu inimigo. Sempre foi seu estilo."

Unificar a legenda é o desafio da vez, e Trump tem tido relativo sucesso. Em parte porque muitos líderes republicanos não veem saída -alienar o próprio presidenciável fraturaria o partido.

Quando competia nas prévias, Rubio disse que, "se não tivesse herdado milhões", o magnata "estaria vendendo relógios na Times Square".

No dia 27, o senador tuitou que votaria em quem "não é a Hillary". Apoio menos elíptico veio do presidente da Câmara, Paul Ryan, na quinta (2), após muita embromação.
Enquanto isso, Trump continua na ofensiva. Na semana passada, criticou dois proeminentes latinos. A governadora do Novo México, Susana Martínez, republicana reticente a ele, "faz um péssimo trabalho".

Também pôs sob suspeita o juiz responsável pela ação em que é acusado de fraude na Universidade Trump. "Ele é mexicano" e não seria justo, opinou sobre Gonzalo Curiel (nascido nos EUA).

Por que a mensagem dele ressoa tanto? Para o presidente da Ipsos Public Affairs, Cliff Young, a resposta está no slogan "América Primeiro".

Ele analisou pesquisas nas quais 55% dos americanos concordam em algum grau com políticas anti-imigração. "A base dele acredita que o futuro dos EUA será pior que o passado. Isso gera medo e vontade de mudar tudo."


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