Folha de S. Paulo


Acadêmicos chineses criticam redução do marxismo em aulas de economia

Kevin Frayer/Getty Images
BEIJING, CHINA - DECEMBER 02: In this composite of two separate images, Tiananmen Square is seen in heavy pollution, top, on December 1 and 24 hours later under a clear sky on December 2, 2015 in Beijing, China. Until a strong north wind arrived late Tuesday, China's capital and many cities in the northern part of the country recorded the worst smog of the year on November 30 and December 1, 2015 with air quality devices in some areas unable to read such high levels of pollutants. Levels of PM 2.5, considered the most hazardous, crossed 600 units in Beijing, nearly 25 times the acceptable standard set by the World Health Organization. The governments of more than 190 countries are meeting in Paris this week to set targets on reducing carbon emissions in an attempt to forge a new global agreement on climate change.(Photo by Kevin Frayer/Getty Images) ORG XMIT: 592748053 ***DIREITOS RESERVADOS. NÃO PUBLICAR SEM AUTORIZAÇÃO DO DETENTOR DOS DIREITOS AUTORAIS E DE IMAGEM***
Praça da Paz Celestial, no coração da capital chinesa

Acadêmicos chineses apelaram a Pequim pela inclusão de mais conteúdo marxista nos cursos de economia das universidades do país, a fim de impedir que os estudantes sofram "lavagem cerebral por meio de teorias ocidentais" e, por sua vez, as inflijam ao país.

Em carta ao Ministério da Educação, os professores de economia dizem que a decadência do marxismo e a ascensão do pensamento ocidental nos cursos de graduação "desviaram seriamente a educação econômica universitária da direção do socialismo".

"A ocidentalização do pensamento econômico foi uma das razões para o colapso da União Soviética, e é por isso que escrevemos esta carta", disse He Ganqiang, professor de finanças e economia aposentado da Universidade de Nanjing e um dos autores da carta, ao jornal "Global Times".

O professor He disse que algumas dezenas de acadêmicos haviam assinado a carta, que cobrava um reforço do conteúdo marxista do currículo quando começar o novo ano letivo.

A China começou a abandonar o marxismo no final dos anos 70 e, de lá para cá, adotou reformas voltadas ao mercado que estimularam quase quatro décadas de crescimento econômico vertiginoso. A carta não faz menção às origens alemães de Karl Marx ou ao fato de que ele tenha vivido grande parte de sua vida no Reino Unido.

Pequim agora está enfrentando crescentes dívidas e uma desaceleração econômica, e vem promovendo reformas que seguem a teoria do "supply-side", e muitos analistas comparam a situação às políticas adotadas por Margaret Thatcher e Ronald Reagan nos anos 80.

No mês passado, o presidente Xi Jinping fez um discurso no qual apelava aos acadêmicos que modernizassem o marxismo a fim de levar adiante o desenvolvimento da China.

Ha-Joon Chang, professor de economia da Universidade de Cambridge, disse que "a economia marxista deu forma à economia mundial. Os arquitetos dos milagres econômicos do leste asiático em Taiwan, na Coreia do Sul e no Japão conheciam a economia marxista, que vê a industrialização como maneira de gerar superávit".

A intervenção dos acadêmicos surge em meio a um reação negativa mais ampla à influência ocidental nas salas de aula chinesas.

Em sua carta, os professores lamentam a redução do pensamento marxista nos cursos de economia nos últimos anos e apelam para que as universidades restaurem a divisão igualitária entre a economia política marxista e a economia ocidental em seus currículos.

A atenuação da influência marxista não é única das universidades chinesas. Até os anos 80, era norma nos departamentos de economia de universidades de elite como Harvard e Stanford ter um ou dois estudiosos do marxismo em seus corpos docentes. Mas esses professores estão se aposentando e não estão sendo substituídos.

Os principais departamentos acadêmicos de economia na China, como o Centro Chinês de Pesquisa Econômica, na Universidade de Pequim, adotaram currículos ocidentais e treinam seus alunos para que se qualifiquem para vagas nos corpos docentes de economia nas maiores universidades norte-americanas e britânicas.

A Universidade Renmin, famosa pelos políticos e funcionários públicos importantes que formou, tem um departamento editorial com uma equipe dedicada a traduzir manuais de economia norte-americanos para o chinês.

As medidas para limitar a influência ocidental na educação chinesa vêm se provando inúteis. Estudantes chineses optam, em grande número, por estudar no exterior. No ano letivo iniciado em 2014, havia mais de 300 mil deles nos Estados Unidos, alta de 10% ante o ano letivo anterior, de acordo com o Instituto de Educação Internacional.

Nas universidades chinesas, aulas de marxismo são compulsórias nos cursos de graduação.

Tradução de PAULO MIGLIACCI


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