Folha de S. Paulo


Venezuela comunica a Brasil que não congelou relações diplomáticas

O vice-chanceler da Venezuela para a América Latina, Alexander Yanez, telefonou neste sábado (14) para a embaixada do Brasil em Caracas para informar oficialmente que o embaixador do país em Brasília não foi chamado para consultas.

Segundo a Folha apurou, o embaixador Alberto Castellar já estava na Venezuela para uma reunião previamente agendada com o presidente Nicolás Maduro para discutir o impeachment no Brasil.

Handout/Reuters
O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, discursa durante reunião de ministros na sede do governo
O presidente da Venezuela, Nicolás Maduro, discursa durante reunião de ministros na sede do governo

O telefonema à representação brasileira serviu para enviar a mensagem de que, embora Maduro tenha anunciado na TV o retorno de Castellar a Caracas, a viagem do embaixador não foi um gesto de desagravo ao novo governo brasileiro.

Com a ligação para o embaixador brasileiro na Venezuela, Ruy Pereira, o chavismo tenta interromper uma escalada diplomática que poderia resultar no congelamento das relações entre dois países vizinhos com interesses econômicos convergentes.

O princípio de crise deflagrou-se imediatamente após o afastamento da presidente Dilma Rousseff, importante parceira do chavismo, apesar do esfriamento bilateral nos últimos anos.

Comunicado da Chancelaria venezuelana chamou a decisão do Senado brasileiro de "golpe de Estado" e instou governos e populações do mundo inteiro a defender a petista.

Na quinta-feira, o partido chavista PSUV reuniu centenas de simpatizantes no centro de Caracas em solidariedade a Dilma.

Maduro fez dois discursos em cadeia de rádio e TV para atacar o governo de Michel Temer e ^acusá-lo de servir supostos planos norte-americanos de acabar com a esquerda na América Latina.

No segundo discurso, na sexta, Maduro anunciou o retorno a Caracas de Castellar.

"Pedi ao nosso embaixador no Brasil, Alberto Castellar, que voltasse. Me reuni com ele, estivemos avaliando esta dolorosa página da história do Brasil", disse Maduro, sem deixar claro quando o diplomata havia voltado.

TOM RÍSPIDO

O Itamaraty, agora sob comando do tucano José Serra, divulgou nesta sexta duas notas em tom particularmente ríspido para rebater as críticas externas.

Citando a Venezuela e outros países, como Cuba e Equador, o ministério denunciou os governos que "[propagam] falsidades sobre o processo político interno no Brasil".

Em entrevista à TV Globo neste sábado, Serra disse que "o tom das notas corresponde às falsidades que estão sendo debatidas". "Quanto maiores as falsidades, mais forte será o tom."

Foi depois da reação do Itamaraty que o governo venezuelano contatou a embaixada brasileira. O aceno ao Brasil parece indicar que o chavismo está dividido sobre como reagir à nova realidade no vizinho mais importante.

Radicais aparentam querer usar a situação brasileira para revigorar a retórica da conspiração e emplacar medidas polêmicas, como o estado de exceção anunciado na sexta, cujos detalhes não foram divulgados, mas que certamente restringirá liberdades.

Desde o afastamento de Dilma, Maduro voltou a falar em iminentes ataques externos e, neste sábado, anunciou exercícios militares para "defender a pátria" no próximo fim de semana.

A ligação para a representação brasileira também pode sinalizar que o chavismo quer minimizar o risco de o Brasil retirar seu embaixador em Caracas, medida que teria sido provavelmente adotada caso Maduro tivesse mesmo convocado para consultas seu representante em Brasília.

A retirada de Ruy Pereira, porém, continua sendo estudada por Serra.


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