Folha de S. Paulo


Donald Trump e Bernie Sanders refletem polarização política nos EUA

Donald Trump, Ted Cruz e Bernie Sanders não são produtos do acaso. A radicalização dos pré-candidatos na campanha presidencial americana reflete uma crescente polarização política nos EUA que se acelerou sob o governo do democrata Barack Obama.

Entre republicanos e democratas, cresce a fatia de eleitores que se identificam com os extremos do espectro político, segundo estudo feito nos últimos 21 anos (1994-2015) pelo Centro Pew e cientistas políticos ouvidos pela Folha.

No levantamento do Pew, que questionou eleitores dos dois partidos a respeito de temas como regulação da economia, papel do Estado e direitos civis, cada vez mais gente migrou para as pontas à direita e à esquerda.

Em 1994, quase metade dos democratas e dos republicanos tinha posições de centro, e só 5% dos democratas e 13% dos republicanos assumiam os extremos. Em 2015, apenas um terço dos democratas e dos republicanos se posicionou ao centro, enquanto quase um quarto dos eleitores de cada partido tinha uma visão consistentemente liberal ou conservadora.

Editoria de Arte/Folhapress

Esse radicalismo afeta o funcionamento do sistema. "A polarização impede a negociação e a busca por consenso, base da democracia", explica Thomas Rudolph, professor de ciência política da Universidade de Illinois.

"A palavra negociar virou palavrão. Não há moderados. Ninguém vai até o meio do caminho estender a mão. Ninguém está disposto a ceder", avalia o diretor do centro de estudos do Congresso e da Presidência na American University, James Thurber.

Segundo a professora de liderança política e valores democráticos em Harvard Jane J. Mansbridge, a polarização se fortalece porque os partidos se tornaram mais homogêneos e passaram a ter menos abertura para o dissenso.

"A polarização impede a negociação. Assim, o governo não funciona", diz.

FENÔMENO GLOBAL

Especialistas explicam que o principal motivo para a radicalização política nos EUA –ou no Brasil– é a economia. Quando uma crise faz as pessoas se sentirem lesadas, é comum culparem a política por seus problemas e adotarem ideologias radicais.

Scott Olson/AFP
os republicanos Donald Trump e Ted Cruz, durante debate nas primárias dos EUA
os republicanos Donald Trump e Ted Cruz, durante debate nas primárias dos EUA

"A recessão causou a polarização no mundo todo. A crise econômica traz obstáculos à política ao dificultar o consenso", diz Mansbridge.

E a atitude tem se tornado questão pessoal. Um lado não só discorda do outro, mas "não gosta" do oponente e vê o que vem dele como negativo. "Cria-se um estereótipo do partido oposto e se assume a posição de confronto. Os eleitores estão mais hostis", avalia Masbridge.

Rudolph concorda: "Há mais sentimentos que racionalidade. O público ficou mais radical na forma como pensa sobre a oposição".

Mas nem todos acham que a causa da hostilidade é da economia. Segundo o consultor canadense James Hoggan, o radicalismo é resultado de um estilo de discurso preparado para dividir as pessoas em times. São de campanhas de propaganda voltadas a alimentar um sentimento tribal.

"Criou-se um modelo de política em que o único objetivo é vencer. As pessoas são manipuladas a assumir essa polarização porque os estrategistas políticos viram que isso funciona", afirma.

É o que ele chama de política "Darth Vader", uma ação de relações públicas para simplificar o debate, mudar a opinião das pessoas e evitar a discussão real de ideias.

Hoggan é autor de "I'm Right and You're an Idiot" (eu estou certo e você é um idiota). "Estamos tão polarizados que os fatos não importam mais. Quando você divide as pessoas em times opostos, você silencia o debate e torna todos cegos para a verdade."


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