Folha de S. Paulo


Convertido ao centro, Humala deixa governo no Peru mal avaliado

No dia seguinte à vitória de Ollanta Humala, em 2011, a bolsa de Lima caiu 12%.

Assustados, empresariado, intelectuais e políticos de oposição peruanos pressionaram tanto o novo presidente que este pronunciou um juramento, em cerimônia solene na tradicional Universidade San Marcos, no qual se comprometia a não mudar as linhas gerais da economia peruana, a preservar a liberdade de expressão e a defender os direitos humanos.

O temor desses setores? Que por trás do candidato que jurava ter moderado seu comportamento ainda estivesse o militante que fora no passado, pronto a mostrar suas verdadeiras intenções.

Luis Camacho - 23.fev.2016/Xinhua
(160223) -- LIMA, febrero 23, 2016 (Xinhua) -- El presidente peruano, Ollanta Humala (d), participa durante la clausura del Foro Económico Franco-Peruano junto al presidente de Francia, Francois Hollande, en el Centro de Convenciones 27 de Enero, en el distrito de San Borja, provincia de Lima, Perú, el 23 de febrero de 2016. Perú y Francia suscribieron el martes en Lima una declaración conjunta en la que elevan su relación bilateral a Asociación Privilegiada, como parte de las actividades desarrolladas con motivo de la visita oficial del presidente Francois Hollande al país andino. (Xinhua/Luis Camacho) (lc) (jp) (sp)
O presidente do Peru, Ollanta Humala, discursa após encontro com o presidente da França

Humala, 53, vem de uma família de nacionalistas extremistas, com um irmão preso acusado de atos de terrorismo e um pai que lidera um grupo que propõe uma nova forma de política: o "etnocacerismo", ideologia que prega a supremacia indígena apoiada nas Forças Armadas.

Para alívio dos mercados, Humala manteve o juramento. Afastou-se do chavismo e da família, não mexeu na política econômica que vinha fazendo com que o país crescesse de forma constante desde os anos 90 e deu ainda mais impulso à mineração.

Mesmo com a desaceleração mundial e o fim do ciclo das commodities, o Peru viu seu PIB crescer 2,7% em 2015, com projeção de chegar a 3% em 2016, segundo o FMI.

IMPOPULARIDADE

Entre seus trunfos, está uma significativa queda nos níveis de pobreza, que eram de mais de 50% nos anos 90, para atuais 27%, com redução ainda mais acentuada do nível de pobreza extrema.

Ter mantido o Peru nos trilhos e aberto o país a investimentos estrangeiros, porém, não fez com que Humala se tornasse um líder popular. Em março, a aprovação do mandatário era de apenas 12%, segundo pesquisa.

"O peruano é sempre anti-governista, isso explica em parte porque, mesmo com o PIB alto, os presidentes são tão mal avaliados", diz o cientista político Alberto Vergara, da Universidade Harvard.

Outra razão, apontada por especialistas ouvidos pela Folha é que, embora tenha reduzido a pobreza, não houve políticas de inclusão social nem investimento em infra-estrutura que garantissem a defesa do país em um cenário de crise mundial, tampouco a consolidação de uma verdadeira classe média.

"Humala não conseguiu passar à população uma ideia de que ela estaria protegida, algo que Fujimori fez muito bem. E boa parte da sociedade peruana ainda depende muito da ideia de um político de tom paternalista", disse à Folha o escritor e jornalista Santiago Roncagliollo, articulista do "El País" e autor de uma biografia de Abimael Guzmán, líder da guerrilha Sendero Luminoso.

O resultado foram cinco anos de turbulência política, com várias trocas de ministros e dificuldades na relação com o Congresso. Nos últimos dois anos de mandato, surgiram casos de corrupção envolvendo a primeira-dama, Nadine Heredia, também líder do partido governista.

Na região andina, onde os níveis de aprovação de Humala são ainda mais baixos, ao redor de 8%, a reclamação é a de que o mandatário deixou de proteger as comunidades indígenas, liberando a mineração em áreas de patrimônio ambiental e histórico.

Seu mandato termina em 28 de julho, mas Humala não deixará a política: ele anunciou que pretende reorganizar sua legenda, o Partido Nacionalista Peruano.

"Vou consolidar o partido. Fizemos tanto esforço para ser governo que nos desestruturamos como grupo. O Peru precisa de partidos para que a política deixe de ser tão personalista."


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