Folha de S. Paulo


Proposta da COP 21 já admite limitar aquecimento global a 1,5°C

Após 11 dias de COP21 (Conferência do Clima da ONU), em Paris, os negociadores de 195 países chegam ao último dia do encontro com a expectativa, mas sem a certeza completa, de selar um acordo nesta sexta (11).

A proposta na mesa no momento prevê um teto de aquecimento de 2°C em direção a 1,5°C, diz que US$ 100 bilhões (R$ 378 bilhões) por ano é o piso da ajuda dos países dos ricos e sugere balanço das metas nacionais a cada cinco anos.

O texto retira a redução de emissão de gases de 40% a 70% ou 70% a 95% até 2050, com base em 2010, deixando só a sugestão de que o planeta deve atingir neutralidade de emissões na segunda metade do século.

As delegações passariam a última madrugada debatendo cada parágrafo do que pode ser o primeiro acordo climático desde o Protocolo de Kyoto (1997).

Uma segunda versão do acordo, pessoalmente formulada pelo presidente da COP, o chanceler Laurent Fabius, foi distribuída às 21h30 (18h30 em Brasília). Ele reservou duas horas e meia para as delegações lerem o texto e voltarem a se reunir às 23h30 (20h30 no Brasil).

Nesta nova proposta, o texto encolheu de 29 para 27 páginas e o número de colchetes (partes em desacordo) caiu de mais de 900, no começo da semana, para cerca de 50.

Num processo complicado como o do Acordo de Paris, isso é sinal de avanço. O comando da COP pretende apresentar um texto final para ser apreciado na tarde desta sexta (11), mas, se não houver acordo, a decisão pode ficar para o fim de semana.

A ministra Izabella Teixeira (Meio Ambiente) e outras lideranças declararam, ao longo do dia, que o acordo é politicamente viável, faltando apenas formular sua linguagem.

E justamente aí reside o problema. Como diz um negociador da comitiva brasileira, "o diabo mora nos detalhes". Ou seja, é a elaboração de um texto final com o qual todos possam concordar que emperra o diálogo.

Um dos pontos mais sensíveis tem sido o teto de 2°C até o fim do século. Países menores, sobretudo as pequenas ilhas, têm pressionado para reduzi-lo a 1,5°C.

O próprio Brasil se opunha à diminuição pura e simples da meta de temperatura. Aceita, o máximo, um indicativo nesse sentido, mas partindo de 2°C.

A nova versão do acordo segue nessa linha: estipula que o objetivo é ficar bem abaixo de 2°C e propõe priorizar esforços para ficar no limite de 1,5°C. Numa concessão aos países mais ameaçados, como as pequenas ilhas, reconhece que esse limiar reduziria significativamente os riscos e impactos da mudança climática.

Pelas metas apresentadas pelos países antes da COP, esse teto variava de 2,7ºC a 3,5ºC. Segundo a última proposta, as metas não são obrigatórias, mas os países deverão seguir um calendário de procedimentos sobre o tema.

CONTRIBUIÇÃO

Outro ponto modificado diz respeito ao período de avaliação e eventual revisão das metas de cada país para redução de poluentes, as chamadas de INDCs (Contribuições Nacionalmente Determinadas Pretendidas, na sigla em inglês).

Há uma convergência para que isso ocorra a cada cinco anos. No novo texto, propõe-se fazer uma primeira avaliação dos progressos com respeito às INDCs em 2019 e um balanço coletivo global em 2023.

A questão é qual o seu efeito prático. China e Índia, por exemplo, não queriam nada que as obrigue a alterar as ambições divulgadas.

É um discurso compartilhado até certo ponto pelo Brasil, que nas negociações defende que as revisões não apontem falhas nem determinem que as projeções climáticas de cada nação devem ser melhoradas.

O novo texto afirma que isso deverá acontecer de maneira soberana, "nacionalmente determinada".

A União Europeia defendia que uma mesma metodologia deveria ser aplicada para analisar o cumprimento de todas as INDCs, o que abriria, neste caso, um espaço para uma conclusão sobre quem na verdade está ou não as cumprindo.

"Precisamos de um sistema comum de verificação de todos países, uma métrica comum", defendeu o espanhol Miguel Cañete, líder do bloco europeu nas negociações.

Desde do começo da COP21, no dia 30 de novembro, há uma batalha aberta entre os países desenvolvidos e os emergentes sobre o financiamento dos países pobres em reagir à mudança climática.

Os ricos, liderados pelos EUA, chegam ao último dia de conferência mais comprometidos com o fundo de ao menos US$ 100 bilhões a partir de 2020.

Em troca, exigem que o acordo preveja a possibilidade de que nações em desenvolvimento também deem sua parcela financeira, mesmo que seja numa base voluntária. Em contrapartida, continua sendo obrigação dos desenvolvidos liderar esse esforço financeiro.

Pelo texto, o mecanismo para ressarcimento de perdas e danos, pelo qual fazem pressões mais afetados e várias ONGs, seguirá sendo debatido nos próximos, mas sem criar obrigações de compensações pelos países ricos.


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