Folha de S. Paulo


Na Argentina, Cristina se despede com comício e se nega a ir à posse de Macri

Uma multidão de militantes ocupou a praça de Maio, em frente à sede do governo argentino, para se despedir da presidente Cristina Kirchner, que deixa o cargo após oito anos de mandato e 12 de kirchnerismo.

Até o último dia, não faltaram reviravoltas na política do país, conturbado por uma transição nada amistosa entre a presidente e seu sucessor, Mauricio Macri.

O presidente do Banco Central, Alejandro Vanoli, anunciou no fim da tarde a sua renúncia. Cedeu à pressão de Macri, que já havia indicado o economista Federico Sturzenegger para a função.

Apesar de o mandato de Vanoli ter validade até 2019, Macri argumentava que precisava colocar uma pessoa de sua confiança para acabar com as restrições às importações e despesas em dólar, sua promessa de campanha.

As divergências entre Cristina e Macri já deixaram como efeito colateral um período de 12 horas sem que nenhum dos dois governe a Argentina.

Entre a 0h e o meio-dia desta quinta (10), o presidente interino do país será o presidente do Senado, Federico Pinedo, aliado de Macri.

As 12 horas de mandato tampão ocorrem após decisão da Justiça, respondendo a pedido de liminar feito por Macri para esclarecer o horário exato do fim do mandato de Cristina.

Nesta quarta (9), a juíza Maria Servini de Cubría informou que o governo de Cristina terminaria às 23h59. Como Macri só é oficializado presidente ao jurar diante do Congresso –o que está marcado para as 12h–, o senador será o responsável pelo país.

A briga começou com a divergência entre Cristina e Macri sobre a cerimônia de posse. Macri vai receber a faixa e o bastão presidenciais na Casa Rosada, contrariando Cristina, que queria a troca de mando no Congresso.

Cristina decidiu, então, que não participará da cerimônia e orientou aliados –a maioria no Congresso– a esvaziarem o plenário no juramento de Macri, nesta quinta (10). O eleito receberá a faixa presidencial de Pinedo.

Para os militantes da FEP (Frente Estudantil Peronista), reunidos na praça de Maio na tarde desta quarta, foi a Justiça que impediu a participação de Cristina no evento.

"Se a Justiça diz que ela não é mais presidenta, não pode ir", disse o estudante de direito e militante da FEP Facundo Romero, 23.

Cartazes pregados nas grades de segurança da Casa Rosada e camisetas exibiam o mesmo slogan: "Resistindo con aguante" (resistindo com perseverança).

Cristina inaugurou um busto de Néstor Kirchner, em sua despedida emocionada da Casa Rosada, ao lado do presidente boliviano, Evo Morales.

Juan Mabromata/AFP
Com Evo Morales, Cristina inaugura busto de Néstor Kirchner na Casa Rosada
Com Evo Morales, Cristina inaugura busto de Néstor Kirchner na Casa Rosada

Do lado de fora, além dos universitários da FEP, militantes do La Cámpora, Kolina, Tupac Amaru, Movimiento Evita e simpatizantes do kirchnerismo acompanharam o discurso por telões.

Cristina fez referência às derrotas da esquerda na Argentina e na Venezuela.

"Observa-se na região a chegada de uma agenda que não é nacional, argentina ou brasileira, mas uma agenda que vem de fora, que foi escrita para a região", disse a presidente.

Ela lembrou os governantes da esquerda da região, como Luiz Inácio Lula da Silva, classificado por ela como "o último dos três mosqueteiros", ao lado de Néstor e Hugo Chávez. "A tarefa segue. O trabalho natural de um governante é junto ao povo".


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