Folha de S. Paulo


Cristina Kirchner decide não ir à posse de Mauricio Macri

Após frequentar a Casa Rosada pelos últimos 12 anos, a presidente Cristina Kirchner decidiu não entregar ao sucessor, o opositor Mauricio Macri, a faixa e o bastão presidenciais, símbolos do mais alto cargo político da Argentina.

Emissários de Cristina informaram que a presidente não estará na cerimônia de posse de Macri, nesta quinta (10).

O chefe do serviço secreto de Cristina e ex-secretário da Presidência, Oscar Parrilli, disse que "não estão dadas as condições" para que a presidente participe do evento.

Enrique Marcarian - 25.nov.15/Reuters
A presidente argentina, Cristina Kirchner, participa de evento em hospital de Buenos Aires em novembro
A presidente argentina, Cristina Kirchner, participa de evento em hospital de Buenos Aires em novembro

O que enfureceu os kirchneristas foi a decisão de Macri de pedir que a Justiça esclareça a que horas termina o mandato de Cristina. Para os aliados do presidente eleito, isso ocorrerá às 23h59 do dia 9 e, a partir da 0h, ele começará a governar. Para Cristina, o novo mandato começa no instante do juramento.

O promotor Jorge Di Lello sinalizou que aprova o pleito de Macri, e a decisão será da juíza María Servini de Cubría, crítica ao governo Cristina.

Segundo aliados de Macri, a iniciativa foi tomada porque a presidente queria controlar a cerimônia de troca de mandato e estava condicionando o novo governante.

O impasse atrasou os preparativos da cerimônia, da qual participarão presidentes de países da América do Sul, como a brasileira Dilma Rousseff, o rei Juan Carlos, da Espanha, embaixadores e ministros estrangeiros.

Para Parrilli, que assumiu o papel de porta-voz de Cristina, o país terá um vácuo de poder da 0h ao meio-dia do dia 10, quando Macri fará o juramento, o que se assemelharia a um "golpe de Estado".

"Meter a Justiça no meio é criar uma cortina de fumaça para ocultar os verdadeiros problemas que virão para os argentinos, como a desvalorização [do peso]".

DIVERGÊNCIA

Macri e Cristina divergem desde a semana passada sobre o local da posse. No domingo (6), a presidente disse que ela e o sucessor discutiram ao telefone sobre a cerimônia e, segundo sua versão, o eleito teria gritado com ela ao telefone. Os macristas negam e dizem que Cristina está mentindo.

O eleito quer recuperar a tradição de ex-presidentes, que receberam a faixa e o bastão presidenciais na Casa Rosada. Cristina argumenta que o presidente é oficialmente empossado quando faz o juramento no Congresso.

Os emissários de Cristina disseram que a presidente ofereceu "deixar os atributos no Congresso para que alguém os entregue ao entrante", mas as conversas foram interrompidas após a liminar.

Macri já indicava ter desistido da ideia de receber a faixa de Cristina e convocara o presidente da Suprema Corte, Ricardo Lorenzetti, para as honras da cerimônia.

Para o analista Jorge Castro, com o pedido de liminar, Macri emite sinais à política interna de que quer assumir o poder e não aceitará ser controlado pela ex-mandatária.

"Na Argentina, o poder político que emerge das urnas é breve e se esvanece rapidamente. As instituições são frágeis, e o presidente precisa consolidar seu poder para governar", afirma.

PACOTE DE BONDADES

Para espantar as primeiras críticas ao seu governo, Macri anunciou seu primeiro "pacote de bondades" antes de chegar à Casa Rosada.

Apesar do elevado déficit fiscal que herdará de Cristina, ele informou pelas redes sociais que o governo abrirá mão do imposto que incide sobre as remunerações de fim de ano dos trabalhadores –uma espécie de 13º.

Macri prometeu na campanha atualizar as faixas do imposto, mas recuou no último fim de semana, alegando que não tinha verba. Dois dias depois, mudou de ideia e anunciou a benesse, que em seus cálculos beneficiará cerca de 1 milhão de argentinos.

DILMA

Apesar da turbulência da política doméstica, a presidente Dilma Rousseff confirmou que irá à posse de Macri. Mas não deverá ficar mais do que seis horas na Argentina.

Segundo apurou a Folha, a avaliação em Brasília é que os dois presidentes já conversaram, na semana passada, e que não haveria necessidade, por parte de Dilma, de fazer uma nova reunião bilateral neste momento.


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