Folha de S. Paulo


Conheça Mauricio Macri, que assume Presidência da Argentina

A sobrancelha sempre alçada enquanto fala é uma marca registrada de Mauricio Macri, assim como o modo como parece se assustar quando é surpreendido por uma intervenção repentina que venha do outro lado da sala. Pessoas próximas afirmam que, por muito tempo, Macri manteve o costume de colar-se à parede, de costas, sempre que entrava num ambiente desconhecido.

O jeito de quem está sempre alerta não é algo que Macri carregue desde a infância. Surgiu após o dramático episódio em que foi sequestrado, em 1991, aos 32 anos, e mantido 12 dias em cativeiro, até que fossem pagos os US$ 6 milhões pedidos pelo resgate.

O episódio não alterou apenas o modo de se comportar em público do engenheiro, mas também deu projeção nacional a alguém que era apenas conhecido pelos círculos da elite de Buenos Aires como o filho de um empresário milionário que curtia festas e a companhia de belas mulheres.

Maximiliano Luna/Xinhua
Mauricio Macri, que sucederá Cristina Kirchner, acena para partidários após eleições na Argentina
Mauricio Macri, que sucederá Cristina Kirchner, acena para partidários após eleições na Argentina

Mauricio é o mais velho dos seis filhos de Franco Macri, imigrante italiano que chegou à Argentina nos anos 1940 e transformou-se num dos mais importantes empresários do país. Está à frente da Sociedade Macri (SOCMA), que contém empresas de construção, automóveis, correio e coletora de lixo.

Quando Macri tinha 23 anos, Franco o lançou na empresa, em um cargo diretivo. Os que conviveram com ele nessa época dizem que era tímido e quase não falava. Deixou, então, o bigode crescer, como uma forma de ganhar autoridade sobre seus funcionários diretos, a maioria mais velhos que ele.

As relações com o pai sempre foram difíceis e Macri acabou se afastando da empresa. Quando lançou-se candidato nessa eleição, Franco permaneceu ao lado do kirchnerismo, com quem tinha forte vínculo. Apenas nas últimas semanas, quando o filho começou a despontar como possível ganhador, houve sinais de uma reaproximação.

POLÍTICA E CHUTEIRAS

A vida pública de Macri deslanchou mesmo quando foi eleito, em 1995, presidente do Boca Juniors, o time de futebol mais popular da Argentina. Embalado pelo espírito otimista da década Menem, a quem admirava, Macri deu início a um período de grandes investimentos no clube. Criou um fundo para compra de jogadores estrelados e reformou o estádio da Bombonera. Logo vieram os títulos: foram 17 até o fim de sua gestão, em 2007.

A crise de 2001, que causou a queda do governo De La Rúa, a desmoralização do sistema bancário e a desvalorização do peso, abriu os olhos de Macri para a política.

Começou a articular com aliados que ainda hoje estão em seu círculo de decisões a ideia de formar um partido, e daí surgiu o Proposta Republicana (PRO), pelo qual foi eleito e reeleito como chefe de governo da cidade de Buenos Aires, em 2007 e 2011. As propostas do partido giravam em torno da ideia da "não política", a de que eram um grupo de gestores, que se diferenciavam dos partidos tradicionais, a quem os manifestantes nas ruas diziam "que se vayan todos" (que todos vão embora).

Em seus oito anos à frente de Buenos Aires acumulou êxitos em melhorias no trânsito —criou corredores e ciclovias— e estimulando a recuperação de áreas degradadas, como o bairro de Barracas, hoje transformado em pólo de desenho e arquitetura, além de revigorar praças antes abandonadas à criminalidade.

Editoria de Arte/Folhapress

Por outro lado, por meio de alterações em regras de zoneamento, permitiu a derrubada de casarões históricos em favor da construção de torres e edifícios comerciais, tirou de circulação vagões históricos do metrô de Buenos Aires e processou uma associação de cidadãos que havia conseguido impedir que a prefeitura construísse uma estação de metrô que destruía uma praça verde da Recoleta. A Justiça determinou, na época, que Macri deveria desistir da obra e replantar as árvores arrancadas. Inconformado, o prefeito acionou a Justiça contra a associação de moradores, pedindo ressarcimento pela obra interrompida.

CORRIDA PRESIDENCIAL

Em 2011, acenou com a ideia de concorrer à sucessão de Cristina Kirchner. Como a presidente vinha com muita força nas pesquisas, Macri desistiu do pleito e preferiu concorrer à reeleição na cidade. A presidente, então, se reelegeu também, com facilidade, no primeiro turno. De sua cadeira de prefeito, Macri fez críticas à condução da economia por parte de Cristina Kirchner, desde o "cerco" ao dólar até as estatizações de empresas como YPF e Aerolíneas Argentinas. Quanto a esse segundo ponto, porém, Macri mudou de opinião. Na campanha eleitoral deste ano, passou a dizer que não privatizaria de novo as empresas, algo que é considerado impopular para o eleitorado argentino.

Assim como o candidato governista Daniel Scioli, é um admirador do papa Francisco, pediu ajuda de Deus para governar a Argentina e se diz "a favor da vida".

Macri casou-se três vezes. A primeira mulher, Ivonne Bordeu, é mãe de seus três filhos mais velhos. Com a segunda mulher, a modelo Isabel de Menditeguy, ficou casado por mais de dez anos, mas não teve filhos. Desde 2009, está com a empresária têxtil Juliana Awada, sua atual mulher.

O casal, com a filha Antonia, divide os dias entre o apartamento em Buenos Aires e a residência de fim de semana de Los Abrojos, onde o presidente eleito reúne amigos para jogar futebol aos domingos.

Continua fanático pelo Boca Juniors e dificilmente deixa de assistir a uma partida. Há poucas semanas, vibrou com o título da Copa Argentina. Agora que o arqui-rival River Plate irá disputar o Mundial no Japão, Macri diz que receberá o time "como corresponde", caso voltem condecorados. "Mas torcer por eles, não, aí seria demais".


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