Folha de S. Paulo


Série de atentados em Paris repete vácuo na inteligência da França

O fato de ao menos dois terroristas mortos na sexta-feira (13) terem entrado e saído do radar dos serviços de informação da França repete um vácuo de inteligência também vistos em outros ataques da história do país.

Identificado pelas impressões digitais na casa de shows Bataclan, Ismael Omar Mostefai teve oito condenações por pequenos delitos e chegou a receber a chamada "ficha S", reservada aos indivíduos considerados como possíveis ameaças.

No caso dele, a "ficha S" é de 2010: a investigação terminou sem elementos suficientes para indiciá-lo por associação com o terrorismo. Ele submergiu e reapareceu, cinco anos depois, na cena da matança de 89 das 129 vítimas confirmadas até agora.

Outro atacante do Bataclan, Samy Amimour, 28, já chegou a ser preso em outubro de 2012 por suspeita de ligação com terrorismo. Também alvo de monitoramento, ele teria conseguido deixar o país e chegar à Síria para se juntar às fileiras do Estado Islâmico. As autoridades só ouviram voltar a falar dele na segunda (16), quando o corpo do terrorista foi formalmente identificado.

Ao todo, há cerca de 5.000 pessoas catalogadas com "fichas S" por suspeita de ligação com movimentos salafistas radicais. São tanto cidadãos franceses que viajaram para áreas de forte ação de grupos terroristas quanto muçulmanos que se radicalizaram sem nunca terem deixado o território do país.

Monitorar este contingente é mais simples na teoria do que na prática, segundo especialistas ouvidos pela Folha. Uma vigilância de alto nível pode requerer ao menos 20 pessoas, entre agentes de campo e analistas para processar dados de quebras de sigilos das comunicações e das conexões destas pessoas.

O padrão dos últimos atentados mostra que os terroristas passam meses ou anos inativos, deixando de ser prioridade pelas agências de segurança doméstica.

Mohamed Merah, responsável pelo ataque a policiais e a uma escola judaica no sul da França em 2012, também foi submetido a breve período de vigilância após retornar ao país após viagens com visto de turista ao Afeganistão e ao Paquistão.

Como entrou legalmente nos dois países, o monitoramento foi logo encerrado. No ano seguinte, matou sete pessoas e feriu seis. Acabou morto pela polícia.

Os ataques de janeiro deste ano trazem histórias parecidas. Um dos atiradores que invadiram e mataram 12 pessoas no prédio do "Charlie Hebdo", Chérif Kouachi recebeu uma "ficha S" por indícios de que teria se radicalizado nos 18 meses em que esteve preso. Ao sair da cadeia, em 2010, ele foi monitorado e sua casa chegou a ser revistada pela polícia, mas nada de anormal foi encontrado.

Seu irmão e parceiro do massacre na Redação do jornal satírico, Said Kouachi viajou ao Iêmen em 2011 e jamais recebeu a "ficha S".

Mapa dos locais do atentados em Paris


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